Jornal Estado de Minas

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O que não se diz nas "Conversas entre amigos" que querem ser mais que isso

Mariana Peixoto


“Normal people” foi uma sensação em 2020 porque trazia a dose certa de tudo que o telespectador queria como escapismo em meio à pandemia. Melancolia, paixão e muito sexo, muito bem embalados em grandes interpretações de atores jovens (Daisy Edgar-Jones e Paul Mescal) que falavam de um mundo que estava por vir – e que, naquele momento, ninguém poderia ter. O acabamento naturalista, que foge à assepsia das produções do streaming, caiu como uma luva para a adaptação do romance da irlandesa Sally Rooney, autora aclamada da geração millenial.





“Conversas entre amigos”, lançada neste ano e há pouco chegada à plataforma Star+, tem a mesma verve. Aqui, a adaptação é do romance de estreia de Rooney, homônimo, lançado em 2017. E em vez de dois protagonistas, temos quatro, com uma personagem que desponta no quarteto, Frances (no livro, é ela quem narra a história).

Estudante de literatura em Dublin, Frances (a estreante Alison Oliver), de 21 anos, tem um projeto de poesia falada com sua melhor amiga e ex-namorada Bobbi (Sasha Lane), que é tudo o que ela não é. Frances é introspectiva, de poucas palavras (que ela guarda para os textos que escreve), se sente deslocada no mundo. Bobbi é extrovertida, fala o que quer e tem opiniões fortes. 

Pois as duas se deparam com um casal magnético. Melissa (Jemima Kirke) é uma ensaísta sofisticada casada com o ator Nick (Joe Alwyn), um colírio para qualquer olho que sofre da mesma melancolia e deslocamento que Frances. Tal como uma quadrilha de Drummond, no início da narrativa, a situação se torna a seguinte: Bobbi quer Jemima, que é casada com Nick, que está de olho em Frances, que quer ficar com ele e mais ninguém.




 

 

Equipe afinada

A minissérie utilizou não só o material de Rooney como também boa parte da equipe de “Normal people”. A produtora é a irlandesa Element Pictures, o diretor (pelo menos de metade dos 12 episódios) é Lenny Abrahamson e a roteirista, Alice Birch – todos trabalharam na série anterior. 

O ponto de vista que acompanhamos aqui é o de Frances, que está em todas as cenas da série. “Eu penso demais nas coisas”, diz a personagem em certo momento. E o espectador não demora a perceber isso. Ainda que o romance e sua adaptação televisiva se chamem “Conversas entre amigos”, ao que mais assistimos são encontros em que os personagens falam, mas não dizem o que gostariam. 

Frances, em especial, só consegue se expressar mais livremente por e-mail. Os não ditos permeiam toda a narrativa – o que, a certo momento, pode enervar um espectador mais afoito, pois sempre esperamos por uma explosão que nunca chega.





Mas é uma história de amores (sim, no plural), linda de se ver. Alison Oliver é impecável, e quando você embarca na história da personagem consegue entender os olhares perdidos que ela lança a cada sequência – seja de sua relação com Nick, com a dificuldade de comunicação com o pai alcoólatra, com seus próprios problemas de saúde ou com os desafios impostos pela convivência com Bobbi. A infelicidade de Nick é tratada com discrição por Joe Alwyn e nunca com pieguice. Sobram Bobbi e Melissa que, no decorrer da narrativa, podem causar alguma antipatia.  

Os 12 episódios, cada um com pouco menos de meia hora de duração, vão se seguindo na mesma toada. São muitas cenas de sexo realmente críveis e normais – há muita respiração audível. E nos aproximamos dos personagens mais por suas expressões do que pelo que dizem um ao outro.
 
Mas que fique claro para o fã de “Normal people”: “Conversas entre amigos” não causa o mesmo impacto da série anterior, ainda que os ingredientes sejam os mesmos. 

“CONVERSAS ENTRE AMIGOS”

Minissérie em 12 episódios. Disponível no Star