Lucas Lanna Resende
Por aproximadamente cinco meses, uma equipe de 12 profissionais da Fundação Clóvis Salgado (FCS) se dedicou a assistir a 2.690 curtas-metragens, que, de alguma forma, abordam o ato de sonhar.
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Como de costume, o evento contará com mostras competitivas, paralelas e especiais. Cada uma delas se segmenta em outras categorias. No caso das competitivas, a divisão ocorre em “Minas”, “Brasil” e “Mundo”, nas quais as produções inscritas são exibidas para o público e avaliadas pelo júri oficial, que escolhe os vencedores do Troféu Capivara de Melhor Filme.
A premiação é realizada desde 2013, quando o festival decidiu laurear os cineastas mineiros, brasileiros e estrangeiros.
“Existe um processo de transformação que vem ocorrendo no FestCurtasBH desde 2001. No entanto, foi em 2013 que houve a mudança mais significativa”, aponta Matheus Antunes, coordenador de produção do festival.
“Ela veio com a criação das premiações e com o próprio nome do troféu. A capivara é um animal típico da nossa região. Logo, dar o nome dela ao troféu é uma forma de criar uma identificação com as pessoas daqui”, diz.
Categorias e mostras paralelas
Também se ramificam em diferentes categorias as mostras paralelas e especiais. Nas paralelas deste ano há “Gatas reflexivas”, que traz filmes cuja temática questiona as invenções e questionamentos dos diferentes corpos; “Filmes decoloniais”, que, conforme o próprio nome diz, têm como objetivo romper com a visão colonial; e “Mundos em colapso”, cujas produções distópicas abordam um fim iminente da vida humana.
Já as mostras especiais foram divididas em duas: “De olhos abertos tem alguém que sonha”, com curadoria de Kênia Freitas e Ingá Patriota; e “Soft dreams”, com curadoria do francês Emmanuel Lefrant, diretor da distribuidora Light Cone.
“São mostras muito distintas entre si”, observa Ana. “O Emmanuel, por exemplo, é muito voltado para o cinema experimental e, em função disso, trouxe muitos filmes que seguem esse caminho. Já a Kênia e a Ingá resolveram propor três eixos, a fim de desafiar os espectadores a sonharem coletivamente.”
Os três eixos que a coordenadora de produção e curadoria do FestCurtasBH menciona são Encontro com antepassadas, Transmutar a luta e Onírico delírio. No primeiro, as curadoras selecionaram filmes que abordam a memória como forma de sonhar, enquanto o segundo eixo tem como mote central o sonho no sentido de formar pensamentos e ideias a fim de incentivar as lutas por mudança na sociedade. Por fim, o terceiro eixo se atém à forma múltipla que os sonhos podem ser pensados.
Além das exibições dos filmes, o FestCurtasBH contará com palestras, show da banda Absinta Efe e a Piscina – formada especialmente para tocar na abertura do evento –, exposição da artista Efe Godoy e oficina de crítica cinematográfica.
Ecologia do cinema
Nas mesas-redondas, destaque para o bate-papo entre a poeta, ensaísta e professora aposentada da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) Leda Maria Martins com o fotógrafo Edgar Kanaykõ Xakriabá, marcado para sexta-feira, 21/10.
Haverá também sessão especial constituída de filmes do acervo da Light Cone, seguida por conversa com Emmanuel Lefrant, que explicará o que ele chama de “ecologia do cinema experimental”. Para o francês, o termo designa a maneira como os cineastas de diferentes partes do mundo se conectam com seres não viventes por meio do cinema.
“O Emannuel tem um livro ainda não traduzido para o português chamado ‘Expanded nature – Écologies du cinéma expérimental’ (“Natureza expandida – Ecologias do cinema experimental”, em tradução livre), que trata justamente dessa linha de pensamento que ele apresentará no FestCurtasBH e que caminha muito ao encontro do que nós propusemos com a temática desta edição”, comenta Ana.
O FestCurtasBH deste ano conta ainda com as mostras “Juventude”, “Infantil”, “Animação” e “Maldita”, que retorna abordando o terror e o suspense.
24º FESTCURTASBH
Desta sexta (14/10) a 23/10, no Palácio das Artes (Av. Afonso Pena, 1.537, Centro. (31) 3236-7400.) Entrada franca. Programação completa disponível no site do festival (festcurtasbh.com)
Efe Godoy fará show e exposição
Entre 2010 e 2015, Efe Godoy era a vocalista de Absinto Muito, banda mineira de rock que muito se popularizou na internet. O grupo gravou álbuns autorais e saiu em turnê pelas capitais do Sudeste. No entanto, com o tempo, os integrantes foram mudando seus interesses a ponto de não ter mais tanta coisa em comum para justificar a existência do grupo.
Corta para 2022. Em meados de agosto, o telefone de Efe, agora com um trabalho voltado para as artes plásticas, toca. Do outro lado da linha, alguém da produção do FestCurtasBH: “Nós estamos preparando a edição deste ano do FestCurtasBH e os sonhos são a temática. Seria muito legal se você realizasse nosso sonho e reunisse novamente a Absinto Muito para tocar na abertura e fizesse exposição individual com suas obras ao longo do evento”.
Efe topou, contatou os antigos colegas de banda e começaram a ensaiar o repertório que vão apresentar na próxima sexta (14/10), dia da abertura do festival. Desta vez, com novo nome: Absinta Efe e a Piscina.
“Nós vamos tocar quatro covers e o resto é música autoral nossa, da época de Absinto Muito”, diz a artista. Cinéfila desde pequena e espectadora contumaz do FestCurtasBH, Efe viu o convite como obra do acaso. Na reunião com a produção do festival, percebeu que, de fato, o acaso estava do seu lado.
“Enquanto estávamos conversando sobre como seria minha participação no festival, mencionei em determinado momento que estava lendo ‘Sonho manifesto: Dez exercícios urgentes de otimismo apocalíptico’ (2022), de Sidarta Ribeiro. Mal sabia eu que era esse livro que estava servindo de inspiração para o festival”, revela a artista.
Realismo fantástico
Além do show de abertura, Efe fará exposição no Espaço Mari'Stella Tristão, que ficará em cartaz durante todo o período do festival. Transitando entre o hibridismo e o realismo fantástico, as obras de Efe – em sua maioria desenho e aquarelas – têm como principal característica expor a diversidade que existe na natureza.
“Tem uma aquarela minha que trata justamente do ginandromorfismo, que são seres considerados masculinos e femininos. Isso é muito comum em borboletas”, explica a artista.
Na mostra que integra a programação do FestCurtasBH, no entanto, as obras que Efe traz não se limitam aos desenhos e aquarelas. “Vou levar algumas esculturas e também uma cama onde as pessoas vão poder deitar e, claro, sonhar”, afirma, entre risos.