Jornal Estado de Minas

MÚSICA

Guilherme Arantes lamenta uso de "Amanhã" pela esquerda e pela direita

Matheus Hermógenes*


Uma retrospectiva dos sucessos da carreira, como "Planeta água", "Cheia de charme", "Deixa chover", "Amanhã", "Meu mundo e nada mais", sem deixar de lado o seu álbum mais recente, "A desordem dos templários" (2021), é o que Guilherme Arantes prepara para o show que apresenta neste sábado (15/10), em Belo Horizonte, no Grande Teatro do Palácio das Artes.





"O meu estilo permanece muito pessoal, muito preservado. Não me deixei alterar ao longo desses períodos em que o marketing e a música mudaram tanto. Continuo muito fiel ao meu alicerce, ao meu estilo. Isso faz a minha música bastante pessoal", diz o cantor e compositor, que contabiliza 46 anos de carreira.

Simultaneamente à frente do piano e dos vocais, ele diz que se dedica sozinho à construção de seus álbuns, suas texturas e acompanhamentos, o que demanda mais tempo e trabalho. "É bem bacana eu ter construído esse universo muito particular do meu piano dialogando com a voz. Isso torna bem difícil a emulação," afirma. 

"Ao mesmo tempo em que eu estou cantando, estou tocando outra coisa. Essa simultaneidade da música cantada por cima e o piano tocado por baixo faz toda uma melodia que dialoga com o canto. Isso é muito difícil emular. Quando alguém canta 'Um dia, um adeus', as pessoas cantam muito mais lineares do que eu. Acho muito bonito e fico muito feliz que eu tenha trilhado esse caminho." 

O álbum mais recente foi produzido durante o isolamento do cantor em Ávila, na Espanha, ao longo da pandemia. O retorno ao Brasil para a turnê tem sido extremamente positivo, segundo ele. Antes da capital mineira, ele se apresentou em São Paulo e no Rio de Janeiro. 





"O público está muito a fim de ir a shows. É um período de uma motivação muito grande. Os shows estão indo muito bem, estão lotando. Não só os nossos, mas eu falo em conjunto. O público voltou a ter uma presença muito forte nos shows", comenta. 

Ele avalia que a música produzida hoje em dia no Brasil, apesar de uma vanguarda valorosa, tem sido feita, em sua maioria, para festas e experiências multigênero, como em festivais como o Rock in Rio. Ele cita como exemplo os ambientes interioranos que favorecem a produção de gêneros hegemônicos, como o sertanejo, a sofrência e o piseiro, mas lamenta que artistas do ramo tenham aceitado se alinhar com o governo atual.  

Gourmetização cultural

"O ambiente está muito pragmático, muito utilitário. A música parou de existir por si só e passou a existir dentro de ambientes que favorecem certos gêneros e certos estilos de música. Você tem toda uma gourmetização cultural de comidas e bebidas. Está na moda o gin, aí todo mundo toma gin. Tudo isso são costumes de uma época totalmente diferente da que a gente viveu. Nos anos 1970, a gente ia no show do Milton para chorar."

Por outro lado, ele cita artistas da nova geração da MPB, como o duo Anavitória, Vitor Kley, a banda Melim e a cantora Roberta Campos, que conseguem articular o interesse do público a uma música bem-feita e bem-executada na busca por valores de beleza harmônica e melódica.





"São artistas que têm o refinamento e uma nova geração de público também bastante numeroso. A gente não pode nivelar e dizer que tudo é comercial, utilitário e fabricado para funcionar. Não é bem assim, tem muita gente boa na música," pondera, valorizando também movimentos de inclusão de ritmos periféricos, como o funk e o rap. 

Ele, por sua vez, prefere falar através de sua música a se manifestar no palco. Ao encaixar uma música na outra, ele tem lidado de um jeito próprio com as manifestações políticas por parte do público. 

"A cena política é muito volátil. Ela muda como as nuvens do céu, como dizia o Magalhães Pinto. O que é num momento, daqui a pouco já não é mais. Isso cria um ambiente muito instável para que as lideranças artísticas fiquem aderindo. Eu sou um crítico dessa adesão superficial, nociva e oportunista", afirma, citando o uso de sua música "Amanhã" por correntes políticas que vão da esquerda à direita, desde Collor, em 1989, a Caetano Veloso,  às vésperas do primeiro turno deste ano. 





"Quando eu levo o show, eu não dou muita bobeira no palco, como é o caso do show de hoje", diz Guilherme Arantes. "A gente está em plena fase de uma decisão importante que o país está tomando, em um momento dramático. O meu papel, no palco, é não dar bobeira e tocar as minhas músicas, cantar o meu universo, que durará. Esta cena da política, eu respeito profundamente o público, mas eu não me sirvo dessa circunstância, dessa oportunidade. Eu não sou o tipo de artista que vai fazer, em cena, símbolos e puxar coro. Desde o início da carreira, eu não sou um cara assim", avisa.

GUILHERME ARANTES E BANDA 

Show neste sábado (15/10), às 21h, no Grande Teatro do Palácio das Artes (Av. Afonso Pena, 1.537, Centro). Ingressos: Plateia I - R$ 160 e R$ 80 (meia); Plateia II - R$ 140 e R$ 70 (meia); Plateia Superior - R$ 110 e R$ 55 (meia), à venda na bilheteria e pelo site Eventim 

*Estagiário sob supervisão da editora Silvana Arantes