Daniel Barbosa
Há seis anos o compositor e multi-instrumentista Marcus Viana não se apresentava em Belo Horizonte. O retorno aos palcos que rompe esse hiato será em grande estilo, no Palácio das Artes. Acompanhado pela Orquestra Sinfônica e pelo Coral Lírico de Minas Gerais, ele fará dois concertos, nesta terça (18/10) e na quarta-feira (19/10), com seleção de trilhas que assinou para a TV e quatro peças inéditas no formato orquestral – uma delas composta há 40 anos.
Há seis anos o compositor e multi-instrumentista Marcus Viana não se apresentava em Belo Horizonte. O retorno aos palcos que rompe esse hiato será em grande estilo, no Palácio das Artes. Acompanhado pela Orquestra Sinfônica e pelo Coral Lírico de Minas Gerais, ele fará dois concertos, nesta terça (18/10) e na quarta-feira (19/10), com seleção de trilhas que assinou para a TV e quatro peças inéditas no formato orquestral – uma delas composta há 40 anos.
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Partitura e gravação perdidas
O compositor chegou a guardar as partituras e o registro, em fita de rolo, da música executada pelo Sagrado Coração da Terra, pensando em retomá-la em algum momento. “O pessoal dizia que era um tema muito anticomercial”, revela. Vários fatores e demandas surgiram e o material permaneceu guardado, até que a partitura e a fita se perderam.
“Aconteceu muita coisa: o baixista da banda morreu, a pianista morreu, a formação original se desfez. Veio a televisão, fui convidado pelo Jayme Monjardim para fazer trilhas, e ‘Montanhas’ meio que caiu no esquecimento”, diz. Com a chegada da pandemia, ele pôde, com o filho João Viana, recém-formado em composição pela UFMG, se ocupar de restaurar a peça a partir de fragmentos, por meio de softwares.
“Fui me lembrando da letra, comecei a cantar e assim fomos reconstruindo. Fizemos um trabalho de arqueologia musical. Entendi que esta música é uma cantata – canção longa com muitas partes instrumentais que se torna sinfonia cantada”, aponta.
Nos dois concertos – o de hoje, ao meio-dia, com entrada franca, e o de amanhã, às 20h30, com ingressos
a R$ 30 (inteira) –, “Montanhas” estabelece conexão com outro tema inédito, “País dos sonhos verdes”. Juntas, formam o embrião do que Viana batizou como “Cantata sinfônica – A memória do futuro”, que se completará com novas composições.
“País dos sonhos verdes”, composta em 1994, chegou a ser gravada no álbum “Grande espírito”, do Sagrado Coração da Terra, mas nunca foi apresentada ao vivo. “Não conseguia executar esse tema com a banda. Tentei, mas saiu meia-boca, não ficou da forma como eu gostaria. É música grandiosa, então minha ideia sempre foi fazer com orquestra”, diz Marcus.
Preservação da natureza
As duas cantatas acabaram orientando a montagem do repertório. Ambas falam sobre o passado, o presente e o futuro no contexto de preservação ambiental. As trilhas que Viana compôs para a novela “Pantanal”, o programa “Terra de Minas” (tema “Pátria Minas”) e a minissérie “Chiquinha Gonzaga” (tema “Um novo século”) foram incorporados ao concerto.
Outra que estreia com roupagem orquestral é “Divertimento para flauta e cordas”, que Viana executou várias vezes com o Sagrado Coração da Terra. Ela foi composta para o maestro, arranjador e flautista Sebastião Viana, pai do multi-instrumentista, que assessorou Villa-Lobos.
“Transformada em música para concerto, ela abre o programa com um solo do Alef Caetano, flautista muito talentoso”, diz o autor.
Viana pretende reescrever sua obra e também criar composições tendo em mente o formato sinfônico. “Agora que estou velho, estou nessa de escrever tudo para orquestra, porque assim a música sobrevive à minha vida. Ela tem mais chances de ficar eternizada na categoria de música clássica, e todo mundo pode tocar à vontade.”
O pai coruja de João Viana
O fato de o filho dominar essa linguagem representa estímulo a mais. A quarta peça inédita, aliás, é “Ardente coração da terra”, composição de João Viana pensada como movimento de uma sinfônica ainda em construção.
“Este é um concerto de pai e filho. João virou coautor dos movimentos da cantata, fez toda a orquestração e o trabalho que executou é incrível. É um orgulho poder tocar com ele, ver o quanto ele é um compositor, orquestrador e instrumentista exímio”, diz o pai coruja.
Viana conta que várias de suas músicas – como “Montanhas” e “País dos sonhos verdes” – foram criadas já com o desejo de que pudessem ser orquestradas.
“Dei muita sorte, porque meu filho se formou, virou um grande compositor erudito, seguindo a linhagem da família. E agora está levando o legado adiante. Fez orquestração grandiosa e densa para os concertos”, adianta Marcus.
A Orquestra Sinfônica, que contará com 75 instrumentistas, será acompanhada por 65 vozes do Coral Lírico de Minas Gerais. Regente assistente da orquestra e responsável por conduzir os dois corpos artísticos da Fundação Clóvis Salgado nos concertos, o maestro André Brant atesta a riqueza da “massa e densidade sonora” das criações de Marcus Viana.
“São peças que se caracterizam principalmente pela grandiosidade. Tanto ‘Montanhas’ quanto ‘País dos sonhos verdes’ requerem nível de refinamento técnico muito grande de cada instrumento e de cada naipe da orquestra. São complexas, grandiloquentes e muito cheias de detalhes. Cada cantata é uma história contada por meio da música e do texto. Elas são de uma beleza extrema”, exalta.
Brant destaca o domínio que Viana tem nos campos da música popular e erudita. Diz que o compositor conhece bem os instrumentos da orquestra, principalmente as cordas, daí sua escrita refinada. “Você vê que ‘Montanhas’ e ‘País dos sonhos verdes’ são realmente eruditas, diferentemente das trilhas, que têm escrita mais popular, com melodias de aceitação muito fácil”, pontua.
Viana batizou as apresentações que fará com a Sinfônica e o Coral Lírico de “Concerto acústico”. E chama a atenção para o fato de que não haverá instrumentos elétricos no palco, apenas os naipes da orquestra. A única exceção é seu violino.
“Não será banda com orquestra, é totalmente acústico. Durante os ensaios, eu e meu filho ficávamos nos olhando, impressionados com a força desse conjunto, que totaliza 140 pessoas no palco. Só tem o meu violino elétrico, com o qual faço uns efeitos especiais. É ele em contraste com a sonoridade acústica da orquestra. Vai ser uma apresentação muito sui generis”, ressalta.
Primeiros passos na Sinfônica
Viana se apresentou com a Sinfônica de Minas Gerais pela última vez há uma década. Tocar com essa formação é refazer os primeiros passos de sua trajetória musical. Ele integrou o primeiro elenco da orquestra, atuando como violinista de 1977 a 1984.
“Saí porque lancei o primeiro disco do Sagrado Coração da Terra e o pessoal do Clube da Esquina me descobriu. Comecei a tocar com Milton Nascimento, Lô Borges, Flávio Venturini. Todo mundo queria tocar comigo, porque não tinha esse negócio de violino elétrico na época, e isso chamou a atenção. Ficou difícil conciliar com a orquestra, mas a tenho como minha primeira escola. O Palácio das Artes é o lar para onde estou voltando agora”, diz.
Marcus se considera um compositor de sorte, por ter podido acompanhar expoentes da música mineira e brasileira, além de ter a possibilidade de criar trilhas para novelas e minisséries de grande alcance popular.
“É difícil para o mineiro quebrar barreiras, ele é acanhado e acaba ficando em Belo Horizonte, essa cidade devoradora de talentos que nascem e morrem aqui. Ter sido levado pelo Jayme Monjardim para fazer trilhas de novelas me permitiu expandir fronteiras”, afirma.
O contato com o então diretor artístico da Rede Manchete ocorreu nos anos 1980. A primeira encomenda foi uma canção para a trilha da novela “Kananga do Japão”, exibida em 1989 e 1990. Ele compôs um tango para os personagens de Daniela Perez e Raul Gazolla.
“Fiz, mandei, ele gostou e me disse que eu faria a trilha inteira da próxima novela. E a próxima novela foi ‘Pantanal’, com aquele sucesso. Aí veio uma atrás da outra: ‘Ana Raio e Zé Trovão’, ‘A casa das sete mulheres’, ‘Chiquinha Gonzaga’, ‘Xica da Silva’, ‘O clone’. Agora passou a minha fase da televisão, mas sou muito grato e orgulhoso dessa oportunidade”, finaliza.
• PROGRAMA
>> “Divertimento para flauta e cordas”
>> “Um novo século”
Abertura de “Chiquinha Gonzaga”
>> “Pátria Minas”
Tema de “Terra de Minas”
>> “A miragem”
Tema de amor de “O clone”
>> “Suíte orquestral do filme ‘Olga’”
>> “Ardente coração da Terra”
Composição de João Viana
>> “País dos sonhos verdes”
Cantata sinfônica
>> “Pantanal”
Tema de abertura
>> “Montanhas”
Cantata sinfônica
“CONCERTO ACÚSTICO”
Marcus Viana e João Viana com Orquestra Sinfônica e Coral Lírico de Minas Gerais. Nesta terça-feira (18/10), às 12h, com entrada franca. uarta-feira (19/10), às 20h30, com ingressos a R$ 30 (inteira) e R$ 15 (meia). Grande Teatro do Palácio das Artes, Avenida Afonso Pena, 1.537, Centro. nformações: (31) 3236-7400