Com os pés no presente, um olho no passado e outro no futuro, a banda Titãs ocupa, nesta sexta-feira (28/10), às 21h, o palco do Grande Teatro do Palácio das Artes, com show que cumpre dupla função. A apresentação, por um lado, celebra os 25 anos de lançamento do disco “Acústico MTV”, recordista de vendas na trajetória do grupo; e, por outro, se presta também ao lançamento do novo álbum, “Olho furta-cor”, divulgado no início do mês passado.
A cobrança dos fãs por algum tipo de celebração em torno do projeto vinculado à MTV começou em 2017, por ocasião dos 20 anos de lançamento do álbum. Na época, no entanto, os Titãs estavam às voltas com a ópera-rock “Doze flores amarelas”, com uma complexa turnê circulando a todo vapor.
Somente em 2020 o grupo pôde atender à demanda de seu público, lançando, ao longo do ano, três EPs que revisitavam o repertório do “Acústico MTV”, acrescido de composições mais recentes e outras, antigas, que não haviam entrado no projeto. No início do ano passado, esses três EPs foram condensados no álbum “Trio acústico” – o 16º da trajetória da banda.
O lançamento ensejou a turnê “Titãs acústico”, que vinha se desenrolando nos espaços de arrefecimento da pandemia, quando as medidas restritivas eram flexibilizadas. Já quando o isolamento social se fazia necessário, os três membros remanescentes do grupo – Branco Mello, Tony Bellotto e Sérgio Britto – se dedicavam, cada um em sua casa, à composição de novas músicas.
Fruto da pandemia
Foi dessa produção que resultou “Olho furta-cor” – título extraído de um poema de Haroldo de Campos. “É um disco que tem essa característica interessante, de ter sido feito todo durante a pandemia”, diz Tony Bellotto.
“A gente vinha compondo separadamente e, à medida que a situação sanitária foi melhorando, passamos a nos encontrar na casa do Branco, que tem um pequeno estúdio, onde fomos trabalhando o álbum”, acrescenta.
“A gente vinha compondo separadamente e, à medida que a situação sanitária foi melhorando, passamos a nos encontrar na casa do Branco, que tem um pequeno estúdio, onde fomos trabalhando o álbum”, acrescenta.
Ele explica que, com a turnê acústica reativada a partir da liberação dos eventos presenciais, o repertório de “Olho furta-cor” foi incorporado ao show.
“Lançamos esse novo álbum, que é elétrico, de rock, mas achamos que cabia enxertar músicas dele no show acústico que já vínhamos fazendo, de forma que, como está formatado, ele tanto celebra os 25 anos de lançamento do projeto da MTV quanto promove o novo trabalho”, diz.
“Lançamos esse novo álbum, que é elétrico, de rock, mas achamos que cabia enxertar músicas dele no show acústico que já vínhamos fazendo, de forma que, como está formatado, ele tanto celebra os 25 anos de lançamento do projeto da MTV quanto promove o novo trabalho”, diz.
Mais do que isso, a apresentação – em que Bellotto, Mello e Britto se revezam entre violões, piano, guitarra acústica e contrabaixo, com o reforço do baterista Mário Fabre e do guitarrista/violonista Beto Lee – celebra os 40 anos de trajetória do grupo. Por essa razão, o repertório, conforme explica Bellotto, tem um forte viés retrospectivo.
“É um roteiro que traz um pouco de tudo o que a gente fez ao longo da carreira. A base do repertório são os sucessos desses 40 anos, então tem muita coisa do ‘Acústico MTV’, tem canções que a gente fez de lá pra cá e que se adequam bem a esse formato, como ‘Epitáfio’, ‘Enquanto houver sol’ e ‘Porque eu sei que é amor’, e tem algumas coisas do disco novo”, aponta.
Ele diz que estender a celebração em torno da efeméride do “Acústico MTV” faz sentido pelo que o álbum representou no percurso da banda. Bellotto não hesita em dizer que foi um divisor de águas, na medida em que aumentou o raio de alcance dos Titãs.
'Acústico MTV': marco na carreira
“Até o lançamento daquele disco, éramos mais conhecidos pelo nosso lado elétrico, contestador, aquela coisa que se firmou a partir do ‘Cabeça dinossauro’ (álbum lançado em 1986). A partir do ‘Acústico MTV’, as pessoas puderam perceber melhor a qualidade da música que havia por debaixo da coisa elétrica. Aumentamos as camadas de público, ficamos conhecidos por mais pessoas, então é um marco”, ressalta.
Ao mesmo tempo, ele diz que o grupo está imbuído em fazer com que “Olho furta-cor” reverbere. O álbum traz 14 faixas inéditas feitas no calor da hora, sendo uma delas, intitulada “Caos”, composta por Rita Lee, Roberto de Carvalho e Beto Lee, recebida pelo grupo como um “presente”, segundo Bellotto.
“As músicas foram todas compostas ao longo do ano passado. Quando o trabalho já estava bem adiantado, chegou esse presente maravilhoso da Rita, do Roberto e do Beto. O disco é um retrato desses tempos que a gente vive, porque tudo aconteceu muito recentemente e de forma muito espontânea”, destaca.
Ele diz que o momento difícil da pandemia também está refletido no repertório de “Olho furta-cor”. “Agora que ela foi debelada com a força da ciência e da consciência das pessoas, e pensando também no cenário político, nas eleições, posso dizer que esse disco traz como conteúdo justamente um olhar sobre esse Brasil de hoje, conturbado, mas também cheio de esperança”, sublinha.
Shows intensos
Desde que “Olho furta-cor” veio à luz, o grupo já se apresentou na capital e no interior de São Paulo e também em alguns estados do Nordeste. Depois de Belo Horizonte, a turnê segue para o Rio de Janeiro, no início de novembro.
“Os shows voltaram com muita força depois da pandemia, animados, concorridos, intensos para a banda e para o público”, comenta.
“Os shows voltaram com muita força depois da pandemia, animados, concorridos, intensos para a banda e para o público”, comenta.
Bellotto observa que, a despeito de no palco o novo álbum ter algumas de suas músicas embaladas no formato acústico, trata-se de um trabalho de pegada roqueira, alinhado com a vertente mais pesada da banda. Ele considera que “Olho furta-cor” dialoga mais proximamente com “Nheengatu”, lançado em 2014, e também herda alguma coisa de “Doze flores amarelas”.
“É um disco bem elétrico mesmo. Tem algumas coisas mais leves, acústicas, mas o que prevalece é a pegada rock”, salienta. Ele diz que a recepção por parte do público tem sido excelente e que o álbum chega num momento muito oportuno. Trata-se de um trabalho que carrega, em termos de temática, muito de crítica e contundência. A música “Caos” é um exemplo.
A letra de Rita Lee diz: “Não estou aqui a passeio / vim em busca de mim / tô viciado em oxigênio / tô pilhado e de saco cheio / da excrescência calhorda / da horda de Vossas Excelências / cuspindo no microfone / cheirando a enxofre (...) Hay gobierno, soy contra”.
“É uma música que aponta o dedo, mas com esse humor, com essa capacidade única que Rita tem de falar de assuntos sérios de um jeito irônico e, ao mesmo tempo, com profundidade”, destaca Bellotto. Com relação às composições assinadas pela própria banda, ele diz que são o combustível para que os Titãs se mantenham com sangue nos olhos, mesmo após 40 anos de estrada.
“Temos um passado glorioso, um repertório construído ao longo do tempo que nos permitiria deitar em berço esplêndido, porque qualquer roteiro de show que a gente resolvesse montar seria bem recebido, mas, para nós, é importante apresentar coisas novas. É uma questão de nos reafirmarmos para nós mesmos, sempre tentando nos superar, nos surpreender.”
Conservadorismo "assustador"
Voltando ao atual cenário político e social no Brasil, Bellotto diz que vê o país cindido e acha necessário retomar um caminho de civilidade e plena democracia, em que as instituições não estejam sob ameaças constantes.
“Temos hoje uma ala mais progressista, preocupada com a questão social, e um contingente conservador que eu, particularmente, não imaginava que fosse tão numeroso, algo até meio assustador”, diz.
Ele afirma que vai votar em Lula para presidente no próximo domingo dizendo que carrega consigo uma concepção de vida humanista, libertária, que tem o olhar voltado para as causas sociais.
“O atual governo é muito perigoso, tem um viés autoritário, flerta com o fascismo, é uma ameaça à nossa democracia. Precisamos reconstruir o país com bases democráticas, com políticas inclusivas”, afirma.
“O atual governo é muito perigoso, tem um viés autoritário, flerta com o fascismo, é uma ameaça à nossa democracia. Precisamos reconstruir o país com bases democráticas, com políticas inclusivas”, afirma.
O músico e escritor aponta que, com as muitas viagens que faz com seu grupo, tem encontrado cenários desoladores. “O que vejo por aí é muita miséria, muita fome, muita injustiça e muito desequilíbrio. Não dá para querer privilegiar só a elite, porque isso vai levar o país a um desastre total. Isso precisa começar a mudar.”
“TITÃS ACÚSTICO”
Show nesta sexta-feira (28/10), às 21h, no Grande Teatro do Palácio das Artes (av. Afonso Pena, 1.537, Centro. Ingressos/1º lote - Plateia 2: R$ 160 e R$ 80 (meia), Plateia Superior: R$ 120 e R$ 60 (meia). 2º lote - Plateia 1: R$ 240 e R$ 120 (meia), Plateia 2: R$ 200 e R$ 100 (meia), Plateia Superior: R$ 160 e R$ 80 (meia). À venda no site Eventim e na bilheteria do Palácio das Artes, das 12h às 21h