Daniel Barbosa
Agora sem a sombra da pandemia pairando no ar, a Feira Literária de Tiradentes (Fliti) chega à sua terceira edição a partir desta quinta-feira (3/11), com uma vasta programação que se estende até o próximo domingo (6/11), na cidade histórica mineira. Criada em novembro de 2020 pela produtora carioca Cristina Figueiredo, a Fliti, que teve sua segunda edição em outubro do ano passado, vive a expectativa de um público recorde.
Entre as atividades, estão previstos lançamentos de livros, com a presença de escritores, ilustradores, editoras e livrarias renomadas. Em diferentes espaços montados na cidade para receber o evento, serão realizadas apresentações artísticas e literárias, narração de histórias, espetáculos cênicos e musicais e bate-papos com autores de Minas Gerais, Rio de Janeiro, São Paulo, Bahia, Brasília e Rio Grande do Sul.
A edição deste ano da Fliti homenageia o escritor, ilustrador e cartunista Ziraldo, que completou 90 anos no último dia 24. Com a saúde debilitada, em razão de três acidentes vasculares cerebrais sofridos de 2018 para cá, ele não comparecerá ao evento. Suas filhas, Daniela Thomas e Fabrizia Pinto; a esposa, Márcia Martins; e a irmã, Santinha, marcam presença, assim como representantes do Instituto Ziraldo, criado em 2018, no Rio de Janeiro.
"Nossa ideia é que a Fliti tenha uma pegada bem lúdica, para tirar essa pecha que existe entre os jovens de que literatura é uma coisa chata, porque você é obrigado a ler os livros que o professor manda. Literatura é prazer, então queremos que a feira seja algo estimulante"
Cristina Figueiredo, idealizadora e produtora da Fliti
As celebrações em torno do artista gráfico estão concentradas no Centro Cultural Yves Alves, que abriga a exposição “Era uma vez um menino de 90 anos” e onde serão apresentadas sessões de cinema com os longas de ficção “O Menino Maluquinho – O filme” (1995), de Helvécio Ratton, e “O Menino Maluquinho – A aventura” (1998), de Fabrizia Pinto e Fernando Meirelles, além do documentário “Ziraldo, era uma vez um menino”, também dirigido por Fabrizia.
Tiradentes
Em consonância com a escolha do homenageado, a edição deste ano tem um direcionamento grande para o público infantojuvenil, segundo Cristina Figueiredo. “Teremos um protagonismo das crianças e adolescentes, são 1.140 alunos das escolas públicas de Tiradentes – nove municipais e uma estadual – envolvidos em diversas atividades”, diz a idealizadora da Fliti.
Ela destaca que, para esse grupo discente, a Feira já começou. Desde o início desta semana, turmas das instituições de ensino da cidade têm sido levadas para assistir aos filmes no auditório, com 120 lugares, do Centro Cultural Yves Alves. “Tiradentes é uma cidade de aproximadamente 8.300 habitantes que não tem nenhuma livraria e nenhum cinema, então é um público muito carente de acesso a esses bens culturais”, observa.
Por meio de uma ação viabilizada pelas empresas patrocinadoras do evento, foram distribuídos vouchers no valor de R$ 25 para todos os alunos da rede pública e de R$ 35 para o corpo docente, a fim de que possam comprar livros.
Sobre “Era uma vez um menino de 90 anos”, Cristina diz tratar-se de um recorte da mostra “Terra à vista e pé na lua”, que passou pelo Museu Histórico Nacional, no Rio de Janeiro, onde foi inaugurada em novembro do ano passado, com foco na trajetória de Ziraldo.
“É uma exposição muito lúdica, cheia de adesivos, que permite uma interação grande. São duas salas do Centro Cultural dedicadas às histórias e personagens de Ziraldo, com destaque para Flicts e para o Menino Maluquinho. Ele é uma figura muito emblemática, conhecida no Brasil inteiro, e as comunidades carentes aqui da região que não o conhecem terão essa oportunidade agora”, diz.
Mesmo diante das dificuldades impostas pela pandemia e pela debilidade das políticas públicas voltadas para a cultura, a Fliti vem cumprindo uma trajetória de expansão, conforme observa sua idealizadora. A primeira edição contou com um público de 3,6 mil pessoas, que saltou para 8 mil na feira do ano passado. Agora, há a expectativa de que 20 mil pessoas acompanhem a programação ao longo dos quatro dias de evento.
Novos espaços
“Por conta da pandemia, nas duas edições anteriores tínhamos os estandes fechados, com circulação de público limitada. Agora eles estão abertos, para que a população socialize, entre e saia quando bem entender”, pontua Cristina. Ela destaca, também, a criação de uma segunda arena literária, com 60 lugares, que se soma à principal – ambas montadas no gramado do Santíssimo Resort, no Centro Histórico de Tiradentes.
No ano passado, foram ocupados 1.500 metros quadrados do gramado; este ano, serão 2.500. Nessa área, estarão montados os estandes das 30 editoras convidadas – foram nove na primeira edição e 22 na segunda. “Em três anos, triplicamos essa presença das editoras. Apesar do crescimento, a gente procura manter um certo caráter intimista da feira, com a possibilidade do olho no olho”, pontua.
As duas arenas literárias vão receber, além de palestras e rodas de conversas, diversas atividades artísticas. “Nossa ideia é que a Fliti tenha uma pegada bem lúdica, para tirar essa pecha que existe entre os jovens de que literatura é uma coisa chata, porque você é obrigado a ler os livros que o professor manda. Literatura é prazer, então queremos que a Feira seja algo estimulante”, aponta, enfatizando que toda a programação é gratuita.
Ela diz que, nesse sentido, outra ação importante, realizada nas duas edições anteriores e mantida nesta, é o circuito do ônibus-biblioteca, que já está percorrendo as escolas públicas da cidade realizando o empréstimo gratuito de livros.
“Esse é um projeto que já realizo há muitos anos no Rio de Janeiro e trouxe para cá, a partir da criação da Fliti. Na primeira edição, a gente emprestou 168 livros para a população de Tiradentes. No ano passado, foram 428 empréstimos. Estamos certos de que esses números, que são reveladores do sucesso da iniciativa, vão aumentar nesta terceira edição”, afirma.
Cristina considera que são vários os destaques da programação que a Fliti oferece ao público a partir de amanhã. Ela aponta, por exemplo, a presença da atriz Beth Goulart, que promove, no sábado, o lançamento do livro “Viver é uma arte: Transformando a dor em palavras”, escrito em homenagem à mãe, a também atriz Nicette Bruno, que morreu em dezembro de 2020, vítima da COVID-19.
Música
No dia seguinte, o ator Cacau Hygino também lança, em bate-papo com o público, um livro dedicado à atriz: “Nicette Bruno – Mãe de todos”. Outro destaque que a idealizadora da feira aponta é o lançamento do livro “A música de Milton Nascimento”, escrito pelo instrumentista e compositor Chico Amaral, que conversa com o público e apresenta pocket show ao lado de Túlio Mourão, no sábado.
Ao longo de todos os dias do evento, ocorrem, na arena literária 2, mesas de debate em que os convidados falam sobre a vida e a obra de Ziraldo. Participam desses encontros Guto Lins, Roger Mello, José Mauro Brant, Antônio Gois, Stella Maris Rezende, Ana Raquel e Daniela Thomas, entre outros.
Cristina aponta, ainda, as presenças dos autores Luciana Savaget, Léo Cunha, Mary Del Priori e Olavo Romano. “Teremos também algumas palestras mais didáticas, sobre temas contemporâneos, como a literatura afro-brasileira voltada para crianças, com a Cidinha da Silva lançando o livro ‘A menina linda’. E vamos ter a Joana Penna, ilustradora da série ‘Diário de Pilar’, que é muito popular, lançando o volume mais recente, ‘Pilar na Índia’, e ministrando um workshop de ilustração para crianças.”
Ela chama a atenção, também, para as participações de Fábio Ferrari Porchat, que é pai do humorista Fábio Porchat, lançando os livros “A breve e longa vida de Joaquim Conceição” e “Aurora em dia nublado”; e de Beto Silva, integrante da trupe do Casseta & Planeta, que conversa com o público sobre o humor nos dias atuais e promove o lançamento do livro “Estão matando os humoristas”.
“Também há muitas atrações musicais interessantes. Além do pocket show de Chico Amaral e Túlio Mourão, vamos ter uma apresentação da Banda Ramalho, celebrando seus 162 anos de tradição em Tiradentes, no encerramento da feira”, ressalta.
Escritores
Com uma programação tão ampla e diversificada, os novos talentos também encontram espaço para mostrar seus trabalhos. Na edição deste ano, a Fliti lançou edital voltado para escritores locais e independentes, que estão começando a carreira. De um total de 79 inscritos, 21 foram chamados para compor as mesas junto aos demais convidados e proporcionar debates em torno da literatura.
“São pessoas que não têm editora, mas escrevem e, eventualmente, têm muita coisa guardada. Elas vão se conhecer e travar contato com autores renomados e editores, então é uma oportunidade muito interessante de network. Esse edital foi uma ação muito bacana, que está sendo bastante elogiada”, diz.
Mesmo antes do início desta terceira edição da Fliti, Cristina já se diz muito satisfeita com a forma como o evento vem caminhando e como foi abraçado pela cidade. Ela chama a atenção para a enorme quantidade de hotéis, pousadas, restaurantes e cafés que entraram como parceiros – praticamente todos da cidade.
“Essa rede de sustentação nos permite convidar cada vez mais autores e ilustradores para participarem da Fliti. Na primeira edição, foram 36; na segunda, 58, e agora estamos recebendo um total de 102 escritores e ilustradores. Entendo que a feira já é parte importante do calendário cultural de Tiradentes”, diz.
3ª FEIRA LITERÁRIA DE TIRADENTES
A partir desta quinta-feira (3/11) até o próximo domingo (6/11), em diferentes espaços da cidade, com programação diária e gratuita, das 10h às 20h. Programação completa disponível no site da Fliti