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Estado de Minas SÉRIE

'O Clube da Meia-Noite' seduz ao abrir mão de elementos clássicos do terror

Criação de Mike Flanagan para a Netflix deixa assombrações e criaturas malignas em segundo plano, para valorizar temas como morte, cura e sinais do além


05/11/2022 04:00 - atualizado 04/11/2022 21:26

Sete adolescentes com sintomas de doença terminal rodeiam garota na cadeira de rodas, segurando lanterna, em cena da série O clube da meia-noite
Adolescentes em estágio terminal vivem no limite entre morte e vida na série "O Clube da Meia-Noite" (foto: Netflix/divulgação)
 

"O horror é uma ferramenta para desenvolver a coragem e nos ajudar a confrontar coisas sobre nós mesmos que evitamos"

Mike Flanagan, diretor e roteirista


Mesmo que histórias de terror com casas mal-assombradas não sejam novidade, foi esse o tema usado como chamariz pela Netflix na tentativa de atrair o público para a série “A maldição da residência Hill”, criada pelo americano Mike Flanagan e lançada em 2018. A aposta deu certo, mas não por causa da mansão amaldiçoada do título.

A série conquistou elogios da crítica e dos fãs do gênero porque fugiu de clichês para mergulhar nos dramas de uma família traumatizada por terrores do passado. “Residência Hill” fisgou até os mais medrosos. Foi o suficiente para a parceria entre Flanagan e a Netflix perdurar por mais três séries de terror, lançadas quase anualmente.

Pacto com o além

“O Clube da Meia-Noite” é a nova criação do cineasta para a plataforma. Jovens em estado terminal que moram numa clínica se reúnem à noite para contar histórias assustadoras. A partir dos encontros, surge o pacto: quem morrer primeiro deve enviar um sinal do além para os vivos.

É a primeira série de Flanagan protagonizada só por adolescentes. Antes disso, ele criou tramas adultas com mansões habitadas por espíritos e entidades malignas, como “Residência Hill” e “A maldição da mansão Bly”, de 2020, e depois misturou religião com terror em “Missa da meia-noite”, lançada no ano passado.

O americano faz parte do grupo de cineastas que tenta reciclar o terror nas telas, assim como Jordan Peele, de “Corra” e “Nós”, e Ari Aster, de “Midsommar – O mal não espera”. A diferença entre eles é que Flanagan tem apostado em seriados para contar suas histórias com calma e desembrulhar lentamente cada personagem.
 
Padre está no altar e fiéis de costas para a câmera, durante missa, na série Missa da meia-noite
Religião e terror: a fórmula bem-sucedida de "Missa da meia-noite" (foto: Netflix/divulgação)
 

Em “Residência Hill”, por exemplo, as angústias dos moradores do tal casarão assombrado e a complexidade da relação entre eles jogam para escanteio as dezenas de espíritos escondidos nos cenários e a maldição que conduziriam a narrativa caso ela fosse uma história clássica de horror.

O mesmo ocorre em “Mansão Bly”, que toca em temas como morte, perda, confiança, amor, traição e culpa. A trama brilha mais quando se esquece do espírito maligno da casa amaldiçoada para examinar as minúcias de cada personagem.

Em entrevista por videoconferência, o cineasta explica que realiza uma espécie de ritual para avaliar suas produções. Tira os traços de terror da história e analisa se o texto se mantém interessante o suficiente. É o jeito que encontrou de tentar furar a bolha do gênero para seduzir os medrosos e aumentar a audiência.
 
 

Família, trauma e cura

Questionado sobre por que “Residência Hill” deu certo mesmo entre quem não gosta de horror, Flanagan afirma que o público encontrou naqueles personagens características que ecoam suas próprias vidas. A intenção era falar de família, trauma e cura, temas que para ele se relacionam com qualquer pessoa, fã do gênero ou não.

Flanagan lançava filmes de horror antes de ser descoberto pela Netflix, época em que arriscava menos. É dele, por exemplo, “Hush – A morte ouve” e “Doutor Sono”, baseado num livro de Stephen King, ambos longas que não tentam reinventar a roda.

O cineasta diz que o que o atrai no seriado é a possibilidade de contar histórias sem pressa. Suas séries são longas mesmo. Todos os episódios de “Missa da meia-noite”, por exemplo, demoram mais de uma hora para acabar.

Mike Flanagan sabe que seu jeitão prolixo dificulta a tarefa de prender a atenção do público. “Dentro de casa, as pessoas assistem à história cercadas pelo mundo delas. Tem o celular, a cozinha que está logo ali, o marido e a mulher que chegam conversando, ou a internet, onde é possível fazer qualquer outra coisa”, diz.

Para contornar esse problema, às vezes ele recorre a artifícios clássicos do horror. Há pelo menos cinco “jumpscares” (sustos dados de repente) no primeiro episódio de “O Clube da Meia-Noite”, que tem ainda a tarefa de apresentar sua protagonista. Ilonka é uma adolescente com câncer que chega ao estágio terminal da doença, mas não aceita a morte e quer achar a cura.
 
O tema se assemelha à forma como o próprio Flanagan vê o gênero. “Percebi que o horror é uma ferramenta para desenvolver a coragem e nos ajudar a confrontar coisas sobre nós mesmos que evitamos”, diz.

Ele era uma criança medrosa, dessas que se escondem quando os colegas querem ver filmes de terror. Com o tempo, Flanagan, de 44 anos, amadureceu e percebeu que se sentia mais destemido sempre que voltava ao gênero.

“Fui de alguém aterrorizado à pessoa que sabe que esse é um dos estilos mais importantes para contar histórias”, diz Flanagan. 

“O CLUBE DA MEIA-NOITE”

• Criação e direção: Mike Flanagan
• Primeira temporada/2022
• 10 episódios
• Disponível na Netflix

“MISSA DA MEIA-NOITE”

• Criação e direção: Mike Flanagan
• Primeira temporada/2021
• 7 episódios
• Disponível na Netflix


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