Parceiro de Gilberto Gil na clássica “Procissão” (1967), o cantor, compositor, ator e artista plástico baiano Edy Star, de 84 anos, tem parte de sua história contada em “Diário de um invertido” (Editora Noir), livro organizado pelo historiador Ricardo Santhiago, professor da Universidade Federal de São Paulo.
Também chegam às plataformas dois singles de Star, interpretando “A quién le importa”, da banda espanhola Alaska y Dinarama, e o blues “Homens”, de Moisés Santana.
Com posfácio de Luiz Morando, orelha de Luiz Mott e comentários de Benito Bisso Schmidt, João Carlos Rodrigues e João Silvério Trevisan, o livro é baseado nos cadernos de Edivaldo Souza, nascido em Juazeiro, terra de João Gilberto e Ivete Sangalo.
“São anotações, como um diário qualquer de juventude que tem tempo determinado para acabar, virando somente recordação. São coisas da época, não é memorização que fiz agora, tentando lembrar como é que tudo aconteceu”, afirma Edy Star.
Memorabilia sessentista
Escritos à mão de 1956 a 1963, os textos de Edy estão hoje sob a guarda da Unifesp. A eles somam-se poemas, anedotas que circulavam em Salvador recolhidas e recriadas pelo artista, contos ficcionais e fotografias dele e dos amigos.
Desde pequeno, o baiano Edivaldo foi incentivado pela família a ler e a desenhar. Cantar e atuar sempre foram sonhos dele. Edy conta que, a certa altura, foi embora com um circo. “Os espetáculos eram aqueles dramalhões, com a plateia chorando. Aquilo exercitava a minha parte de ator, embora já tivesse feito teatro na Bahia.”
Ele viveu a efervescência cultural de Salvador nos anos 1960, convivendo com Glauber Rocha, Raul Seixas, Caetano Veloso e Gilberto Gil, entre outros. Foi o primeiro artista brasileiro a revelar publicamente sua homossexualidade.
O disco mais recente do baiano, “Cabaré Star”, foi produzido por Zeca Baleiro. “Está nas plataformas digitais e vou relançá-lo em breve”, anuncia Edy. “Continuo cantando e agora quero me dedicar também aos idosos. Sou um idoso que trabalha. E olha que faço um show de duas horas, com banda de rock, correndo pelo palco.”
O historiador Ricardo Santhiago conta que se aproximou de Edy quando escrevia a biografia de Miriam Batucada (1947-1994), parceira do baiano. “Comecei a fazer a documentação da vida dele, gravando entrevistas para algum projeto futuro. Edy ainda tem muita história para contar. Embora esteja com 84 anos, tem a energia de alguém de 40 e memória de criança.”
Sexo, afeto e preconceito
Em seus cadernos, Edy Star revela a descoberta da sexualidade e da afetividade em Salvador há quase 70 anos. “Em 1956, ele comprou o livro 'Homossexualismo masculino'. A primeira parte é um tratado médico que assume a homossexualidade como doença ou perversão”, ressalta Santhiago.
“A segunda é uma história ficcional, na qual personagens gays são condenados à morte, à lepra ou ao vício de drogas. Era um livro pedagógico, mas no sentido de afastar as pessoas. Edy ficou tão impactado que resolveu escrever um diário para ele mesmo, para se entender melhor”, diz o historiador. Surgiu assim o “Diário de um invertido”.
Naquele período, Edy pensava ser o único gay do mundo. “A partir dessa leitura, ele é estimulado a explorar a cidade de Salvador, onde conhece outras pessoas gays e forma com elas uma turma”, comenta Santhiago.
O primeiro disco do baiano foi produzido por Raul Seixas, no início dos anos 1970. Logo depois, em 1971, ele gravou o LP “Sociedade da Grã-Ordem Kavernista” com Raul, Sérgio Sampaio e Miriam Batucada.
Roberto e Erasmo Carlos, Gilberto Gil, Caetano Veloso e Jorge Mautner estão entre os astros que compuseram para Edy Star.
“DIÁRIO DE UM INVERTIDO”
. Org: Ricardo Santhiago
. Editora Noir
. 144 páginas
. R$ 59,90