Alguém tinha que falar abertamente. Mas, na maior parte do tempo, duas repórteres com uma história bem trabalhada – fruto do tino investigativo, muito tempo de apuração e todo o arsenal que só o “The New York Times” poderia oferecer – só recebiam nãos. As negativas vinham por medo, vergonha e, principalmente, cláusulas de confidencialidade em acordos que envolveram advogados poderosos e algumas boladas de dólares.
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Vilão do MeToo
Cumprindo pena de 23 anos em Nova York e em meio a novo julgamento criminal em Los Angeles, Weinstein, vencedor do Oscar por “Shakespeare apaixonado” (e produtor de centenas de filmes e séries, com títulos assinados por Quentin Tarantino e Martin Scorsese), é o maior vilão do MeToo.
O movimento, que explodiu mundialmente após as denúncias, provocou a saída de outros altos executivos e mudanças para as mulheres tanto na indústria cinematográfica quanto em outros locais de trabalho.
Dirigido pela alemã Maria Schrader, “Ela disse” é uma adaptação do livro homônimo que Megan Twohey e Jodi Kantor, vencedoras do Pulitzer, publicaram sobre a história.
Assim como “Spotlight” e o clássico “Todos os homens do presidente”, o longa acompanha o trabalho árduo, de persistência, mas também de alguma frustração, que redundou no furo jornalístico que acabou por mudar o curso da história.
Aqui, elas são duas repórteres que apenas se conhecem da redação do “Times”. A investigação tem início com Jodi Kantor, jornalista que tem que se dividir entre a vida de repórter e a família com duas crianças pequenas. Ela se encontra num beco sem saída – a história dos abusos já era ventilada, mas ninguém falava nada – quando Megan Twohey, mais experiente, volta à ativa depois da depressão pós-parto.
Megan já havia causado barulho um ano antes, quando investigou denúncias de agressão contra o então candidato à presidência Donald Trump. O caso não foi longe – Trump acabou eleito naquele ano, não custa lembrar – mas ela, no retorno ao trabalho após a licença maternidade, agarra a oportunidade.
A partir do encontro entre as duas personagens, o filme mostra, com minúcias, todo o processo investigativo. Tateando em busca de confirmações, elas vão atrás de atrizes – Ashley Judd, a única celebridade que falou abertamente sobre o caso na primeira reportagem, interpreta a si própria, em uma cena cheia de dor – e de mulheres desconhecidas que trabalharam com Weinstein.
O filme traz ainda a participação de Gwyneth Paltrow, que venceu o Oscar por “Shakespeare apaixonado” – é a voz da própria atriz que se ouve em um telefonema com Jodi Kantor.
O caso chega até a Europa, mais especificamente ao Reino Unido, onde há outras mulheres vítimas de Weinstein. A entrada da personagem Laura Madden (Jennifer Ehle), que trabalhou com ele na juventude, terá desdobramento importante na história, já que a maior parte das fontes não revela seu nome.
Enfoque feminino
As mulheres são o foco o tempo todo – não há nenhuma cena de violência explícita na tela, tampouco a visão de Weinstein, interpretado por um ator e visto somente de costas.
À medida que a narrativa avança, vemos ainda o impacto que as revelações trazem para a dupla de jornalistas, que trabalha à beira de exaustão.
Em sua metade final, “Ela disse” ganha ritmo mais frenético, pois o “Times” começa a correr contra o tempo – a equipe fica sabendo que Ronan Farrow (filho de Mia Farrow e Woody Allen) também publicaria matéria de denúncias contra Weinstein na “The New Yorker”.
As duas reportagens saíram com a diferença de cinco dias – a do “Times” conseguiu se antecipar.
“ELA DISSE”
(EUA, 2022, 129min., de Maria Schrader, com Carey Mulligan e Zoe Kazan)
• Estreia nos cines Pátio 7, às 15h05, 17h55 e 21h10 (qui, sáb, dom, seg), 17h50 e 21h10 (sex), 19h15 e 22h10 (ter) e 17h40 (qua); Ponteio 1, às 18h10 (exceto quarta); Ponteio 4, às 16h20 e 21h20.
• Estreia nos cines Pátio 7, às 15h05, 17h55 e 21h10 (qui, sáb, dom, seg), 17h50 e 21h10 (sex), 19h15 e 22h10 (ter) e 17h40 (qua); Ponteio 1, às 18h10 (exceto quarta); Ponteio 4, às 16h20 e 21h20.