Leila de Luca*
Especial para o EM
Chaya ou Clarice? Qual o nome por trás do nome? A mística ucraniana mais nordestina e brasileira que conheci. Conheci-a em todas as suas criaturas e em nenhuma ao mesmo tempo. Ângela, Joana, Lidia, Ana, Laura, Martim... Santa e pagã, mulher e menina, leoa e cachorro sem dono. Da incapacidade de se entender suas contradições e sentir sua poesia, compreende-se a alcunha de esfinge. Mas, longe de ser esse monumento inalcançável e indecifrável, era bicho-gente. Gritava isso em seus personagens.
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Perdida em si mesma ainda no início de sua vida, foi capturada pelas palavras e através delas espreitava a vida de dentro. "A literatura é vida vivendo", disse. Ela nos remete com suas palavras-chave à substância da qual somos feitos ou, melhor, feitas, porque só homens com alma feminina aflorada podem captá-la.
As palavras, nas mãos de Clarice, são desconstrução da razão e descortinamento do sentir. Clarice debruçou-se sobre os ombros daquelas antigas mulheres e soprou em nossos corações a brisa congelantemente quente de se sentir, a um só tempo, num mundo tão carne e osso, opaco, e tão fantasticamente misterioso, iluminado. O espectro de seus movimentos internos alcança os ossos de nossas almas, levando a nos incomodar com nossas certezas. Pois que, como água-viva, movimentamos no líquido chamado vida que apenas vislumbramos, percebemos num insight, mas que escapa assim que tentamos moldá-la.
Chaya ou Clarice? O nome oculto é Mulher! Sopro molhado que se fez notável. Movimenta e vibra divinamente nos oferecendo lírios brancos ao que dói em nós.
*Leila De Luca é escritora, artista visual e taróloga