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Estado de Minas RESGATE DE IDENTIDADES

Da dor à arte: mulheres que passaram por violência estampam exposição em MG

'As fotografias fortaleceram em mim a vontade de viver', diz Poliana Luce Gonçalves, de 37 anos, uma das integrantes do projeto 'O Nome Delas', em Juiz de Fora


15/12/2022 18:58 - atualizado 15/12/2022 22:17

Poliana Luce Gonçalves
Poliana Luce Gonçalves, de 37 anos, integra a exposição 'O Nome Delas', que fica em cartaz até 2 de janeiro (foto: Ana Ferreira/Divulgação)
Por meio da arte manifesta nos corpos captados pelas lentes da fotógrafa Ana Ferreira, de 34 anos, oito mulheres que passaram por violência doméstica estampam a exposição “O Nome Delas”, que está em cartaz no Teatro Paschoal Carlos Magno, no Centro de Juiz de Fora, na Zona da Mata mineira. Para muito além da estética, o projeto fotográfico funciona como uma via de acesso na transformação da dor em coragem para que elas possam seguir em frente e – sobretudo – resgata identidades adormecidas. 
 
Todos os ensaios fotográficos aconteceram na Casa da Mulher da Prefeitura de Juiz de Fora. A instituição – que atende casos de violência doméstica e oferece serviços assistenciais, como atendimento psicológico e orientação jurídica – fez a intermediação entre a fotógrafa e as mulheres em 2019. O projeto fotográfico é financiado pela Lei Municipal Murilo Mendes e pode ser visitado de segunda a sexta-feira, das 9h às 18h, até 2 de janeiro. 

Perguntas como “você tem um sonho?”, “como está hoje?” e “me conta uma história da infância que deixa você feliz?” foram guiando os encontros de Ana com as mulheres. O processo de entrevistas teve início em agosto deste ano. 
 
Ao Estado de Minas, a idealizadora do projeto explica que a ideia foi fazer deste momento “um presente”. “Todo o trabalho aconteceu com muito diálogo. Após as entrevistas, cada dia de ensaio durava cerca de duas horas e meia. Eu ia mostrando as fotos com o objetivo de saber se elas estavam gostando. Tentei estabelecer um vínculo de confiança”, conta Ana, destacando que o processo criativo aconteceu de forma livre. 
 
Nesse sentido – afastando-se das amarras estéticas pré-elaboradas – , as mulheres não receberam nenhum tipo de direcionamento em relação às roupas que deveriam usar ou como deveriam se portar em frente à câmera. 
 
“Não houve orientação a não ser ir do jeito que elas se sentissem bem. No decorrer do ensaio, muitas até dançavam e começaram a posar espontaneamente. A intenção foi festejar o corpo delas e trazer o que elas quisessem manifestar. O resultado conduz a uma interpretação que será subjetiva por parte do público”, detalha.  
 
Nesse sentido, cada mulher está retratada em um álbum com 12 fotografias. Segundo Ana, mais de 1.500 fotos foram tiradas em cada dia de ensaio. Depois, cerca de cem imagens foram selecionadas, e as próprias mulheres ajudaram a escolher aquelas que integrariam o projeto. 
 
“Os álbuns guardam caráter de memória e afetividade, se configurando como livros que contêm narrativas contadas a partir da perspectiva de suas personagens como protagonistas. É importante que o visitante da exposição se sinta assim: conhecendo uma história, uma personalidade”, explica Ana. 

'As fotografias fortaleceram em mim a vontade de viver'

 
Além da agressão física, Poliana Luce Gonçalves, de 37 anos, conta em entrevista ao Estado de Minas que viu a relação com o ex-companheiro virar um pesadelo quase diário. Após cinco anos de convivência, ela decidiu se separar em 14 de janeiro. O casamento já estava marcado e aconteceria no mês seguinte.

“Durante esses anos, sempre vivi um cenário de violência doméstica, porém atualmente percebo que meu agressor me manipulava psicologicamente e, dentro dessa relação, eu não percebia essas agressões, apesar da minha família ter tentado me alertar diversas vezes”, inicia. 
 
Em 27 de maio, segundo conta, ao visitar a filha do casal – que mora com a mãe e hoje tem 1 ano e 10 meses –, o ex a agrediu fisicamente de forma violenta, além de atacá-la verbalmente. Na ocasião, a Justiça concedeu uma medida protetiva para Poliana. “Ele pegou nossa filha e se negou a devolvê-la. Fomos parar na delegacia, onde ele também ficou agressivo, entre gritos e xingamentos”, comenta.
 
“Eu tinha planos grandes pra nós. Faltava um mês para o nosso casamento e, de repente, me vi só. Apenas me recuperei com a ajuda da minha família e o apoio fundamental que tive na Casa da Mulher aqui de Juiz de Fora”, explica Poliana, destacando que sua vida ganhou novos contornos após integrar o projeto “O Nome Delas”.
 
“A Ana [fotógrafa] conseguiu levantar minha autoestima. Essa mulher linda das fotos me traz a mulher guerreira que eu sou aqui dentro. As fotografias fortaleceram em mim a vontade de viver e sorrir, mesmo em dias difíceis”, reflete. 
 
O projeto traz ainda registros fotográficos de Vanessa, Valkiria, Goreti, Edilene, Cíntia, Angélica e Ângela – mulheres que, assim como Poliana, transformaram suas dores em coragem para prosseguir. Pelas lentes de Ana, as potencialidades outrora sufocadas pela violência vieram à tona na exposição intitulada “O Nome Delas”. 

Minas no mapa da violência doméstica

 
Com 2.859 denúncias registradas até a primeira semana de julho deste ano, Minas Gerais é o terceiro estado no ranking da violência doméstica no Brasil, conforme aponta o último levantamento divulgado em 8 de agosto pelo Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos. No primeiro lugar está São Paulo, com 6.566 registros, seguido do Rio de janeiro, que contabiliza 5.604 ocorrências. 
 
Ao todo, no primeiro semestre de 2022, a Ouvidoria Nacional dos Direitos Humanos recebeu 31.398 denúncias e 169.676 violações envolvendo a violência doméstica contra as mulheres. Denúncias podem ser feitas por meio de uma ligação para o número 180. 


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