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FKL: escova de dentes na mão e várias ideias na cabeça

Pintor troca os pincéis por inusitada ferramenta de trabalho e atrai a atenção na Cobo, galeria do Mercado Novo que tem Rogério Flausino entre os sócios


21/12/2022 04:00 - atualizado 20/12/2022 22:59

Franklin Brito Araújo, o FKL, está com as mãos sob a mesa. Atrás dele, nas parede, estão os quadros que pintou
Franklin Brito Araújo, o FKL, fez carreira na área de tecnologia e planeja usar tudo o que aprendeu neste setor para criar arte (foto: Túlio Santos/EM/D.A Press)

'No momento de raiva, meio querendo estragar aquilo que estava fazendo, peguei os materiais mais grotescos e comecei a rabiscar a tela. O que estava mais perto era uma escova de dentes'

FKL, pintor


Foi durante um acesso de fúria, quando pretendia destruir a tela que havia acabado de pintar, que o artista plástico Franklin Brito Araújo, o FKL, de 54 anos, encontrou sua nova técnica: o uso da escova de dentes no lugar do pincel.

“Eu era o cara que ficava buscando a perfeição, mas não conseguia alcançá-la. Quando pintava um rosto, achava que ele tinha de parecer fotografia. Aí, no momento de raiva, meio querendo estragar aquilo que estava fazendo, peguei os materiais mais grotescos e comecei a rabiscar a tela. O que estava mais perto era uma escova de dentes”, conta o artista.

Perfeição e erros

Pois não é que as “pinceladas” com a escova deram o resultado? Não era a perfeição que FKL buscava, mas algo diferente, que ele ainda não vira em trabalhos de outro pintor.

 

“Acabou dando certo usar aquela ferramenta tosca”, brinca FKL, que expõe trabalhos na galeria de arte Cobo, no Mercado Novo, aberta por Marcus Paschoalin e Rogério Flausino, vocalista do Jota Quest.

“Em vez de continuar tentando buscar a perfeição, ela (a escova de dentes) me proporcionou habilidade para lidar com erros. Isso me deixou mais solto, trouxe mais à tona a habilidade de fazer contrastes, luzes, questões de cor”, emenda.

Bonachão e descontraído, ele conta que a amizade é de longa data com os donos da galeria, que lhe cederam espaço para a exposição permanente de suas obras.
 
Quadro de Janis Joplin mostra a cantora sorrindo e segurando os óculos
Quadro de Janis Joplin foi pintado com escova de dentes (foto: FKL/reprodução)
 
Na Cobo, ele exibe trabalhos mais recentes, como telas com os rostos de Milton Nascimento, Rita Lee, Belchior (1946-2017), Raul Seixas (1945-1989), Gal Costa (1945-2022) e Erasmo Carlos (1941-2022).

“No começo, quando saquei que a escova de dentes dava aquele traço grosso, a primeira coisa que falei pra mim mesmo foi: fica caladinho, não fala nada não, porque ninguém vai entender de onde saiu isso, eles vão achar que você tem habilidade incrível com o pincel.”

No entanto, a frase de um amigo fez FKL perceber que deveria divulgar seu modo de pintar, e não escondê-lo. “Ele estava olhando a pintura de um leão e me disse: ‘Cara, gostei muito desse quadro, achei interessante e coisa e tal, mas quando descobri que foi pintado com escova de dentes, ele ganhou outro valor, muito maior’”

Descobrir a técnica foi fácil para FKL – um acaso, para dizer a verdade. O desafio foi dominá-la. Depois de muita tentativa e erro, ele decidiu se gravar pintando. Assim, quando acertasse, poderia assistir ao vídeo depois e entender o que fizera.
 

'Quando saquei que a escova de dentes dava aquele traço grosso, a primeira coisa que falei pra mim mesmo foi: fica caladinho, não fala nada não, porque ninguém vai entender de onde saiu isso, eles vão achar que você tem habilidade incrível com o pincel'

FKL, pintor


O pintor sem pincel

Resultado: FKL precisou recorrer ao vídeo 147 vezes para entender como deveria “pincelar” com a escova de dentes. Ele comenta que as cenas o ajudaram também a se acostumar com a ideia de que poderia abrir mão do pincel, que, até então, ele acreditava ser a ferramenta fundamental de um pintor.

A dificuldade em lidar com mudanças e com a própria liberdade se deve ao histórico profissional dele. Só em 2021 FKL passou a se dedicar inteiramente à arte.

Trabalhou na área tecnológica durante grande parte de sua vida. Em 1999, abriu empresa de downloads de ringtones, fechando parcerias com operadoras de todo o Brasil e da América Latina.

Em 2004, migrou para a programação de aplicativos. Criou o primeiro aplicativo de rádio do Brasil e também o primeiro aplicativo de banda brasileiro. Até 2020, dedicou-se a projetos de inteligência artificial para empresas nacionais e estrangeiras.

“O fato de hoje estar focado na produção artística é resultado de tudo o que aprendi trabalhando com tecnologia. Vivi tanto essa era tecnológica que acabei percebendo que a tecnologia, na verdade, é só um aparato para coisas muito mais importantes”, ressalta.

Em busca dessas coisas, FKL decidiu largar tudo e se dedicar inteiramente à pintura. “Deu medo demais”, ele confessa.

 No começo, até tentou conciliar carreira artística com alguns projetos de design industrial para se manter financeiramente.

“Mas não posso negar que fui abençoado pelas amizades que construí e pelo fato de, no começo do ano, a Cobo ter sido criada”, reconhece.

Quando a galeria surgiu, os sócios Paschoali e Flausino convidaram FLK para ser artista residente. 

“Foi generosidade deles, porque é espaço meio que só meu para poder divulgar minha arte”, conta.

'Vivi tanto essa era tecnológica que acabei percebendo que a tecnologia, na verdade, é só um aparato para coisas muito mais importantes'

FKL, pintor


Vernissage com 'enxurrada de alegria'

Na abertura da galeria, em março deste ano, ele fez sua primeira exposição, com 16 obras. No primeiro dia, conseguiu vender 12. “Ali já tive uma enxurrada de energia, falando assim: vai para o mundo da arte, cara, porque aí tem campo bacana para você explorar'”.

Naquele momento, ele relaxou em relação à angústia de largar emprego “fichado” e estabilidade financeira.

 Embora esteja confortável fazendo o que gosta, FKL quer encarar novos desafios. Este ano, voltou a compor. Até então, sua última música, “Vou a pé”, foi lançada pelo Jota Quest no álbum “Até onde vai” (2005).

“Essa coisa de escrever música é culpa do Rogério (Flausino). Desde moleque, era sempre assim, ele tocava alguma coisa e tinha um xananã. Ele vocalizava a melodia e eu brincava de encaixar palavras”, lembra.

Recentemente, FKL compôs a letra de “Te ver superar”, musicada por Flausino, que virou single lançado pela banda Jota Quest com a participação de Dilsinho.

FKL não se contentou em escrever o poema, decidiu pintar um quadro com o mesmo tema da canção. Feito isso, veio o interesse por obras interativas.

“Pensei: se consegui misturar as habilidades de escrever e de pintar, assim deveria ser minha próxima série. Vou trabalhar um pouco com o assembly e o python (linguagens de programação) para fazer com que os quadros se abram, apresentem ao fundo a letra e, ao mesmo tempo, toquem a canção. Vou explorar um pouco as minhas habilidades fora dessa coisa da escova de dentes”, promete.

FKL

Galeria Cobo, no terceiro piso do Mercado Novo (Avenida Olegário Maciel, 742, Centro). Trabalhos de Franklin Brito Araújo, o FKL, podem ser conferidos às quintas e sextas-feiras, das 16h às 22h, aos sábados, das 10h às 22h, e aos domingos, das 10h às 16h. Entrada franca. Informações no Instagram (@cobogaleria).


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