(none) || (none)
UAI
Publicidade

Estado de Minas MÚSICA

Wagner Tiso lança songbook de 100 partituras e comemora 60 anos de carreira

Material será distribuído a escolas que se dedicam à educação musical e ficará disponível gratuitamente no aplicativo SpotPart


26/12/2022 04:00 - atualizado 25/12/2022 23:36

Wagner Tiso toca piano na Praça da Estação, em BH, tendo ao fundo o prédio da antiga estação ferroviária da capital mineira
Wagner Tiso durante a Festa da Música, na Praça da Estação, no show comemorativo dos 80 anos do Estado de Minas, em agosto de 2008 (foto: Jackson Romanelli/EM/D.A PRESS/31/8/08)


Wagner Tiso comemora 60 anos de carreira. Não é uma efeméride qualquer. Maestro, compositor, orquestrador, pianista, arranjador e sócio-fundador do Clube da Esquina, esse mineiro de Três Pontas, de 77 anos, é capítulo à parte na história da MPB e do cinema nacional.
 
Ele gravou cerca de 30 álbuns; tocou, fez arranjos e regeu orquestras para 150 cantores; é autor de mais de 30 trilhas sonoras de filmes; também criou duas peças sinfônicas.
 
Não bastasse tudo isso, Wagner compôs com Milton Nascimento o hino da redemocratização brasileira: “Coração de estudante”.
 
Wagner Tiso toca teclado no último show de Milton Nascimento, no Mineirão, em 13 de novembro deste ano
Wagner Tiso no último show de Milton Nascimento, no Mineirão, em 13 de novembro deste ano (foto: Alexandre Guzanshe/EM/D.A Press)
 

O filho de dona Walda

Quem sai aos seus não degenera, diz o ditado. Filho de Walda Tiso Veiga, professora de piano que educou musicalmente várias gerações em Três Pontas e Alfenas, no Sul de Minas, Wagner festeja suas seis décadas de ofício também com o propósito de ensinar.
 
Acaba de sair o songbook instrumental “Wagner Tiso – 60 anos de música”, com 100 partituras autorais dele. Quinhentos exemplares vão ser destinados a escolas que trabalham com educação musical. O projeto é patrocinado pela Fundação Anita Mantuano de Artes do Estado do Rio de Janeiro (Funarj).
 
As partituras ficarão disponibilizadas gratuitamente no aplicativo SpotPart, trabalho coordenado por Mariana Tiso, mulher de Wagner. O songbook tem 380 páginas, trazendo textos em português, inglês e espanhol, com apresentação do poeta e compositor Geraldinho Carneiro.
 
As partituras foram selecionadas pelo compositor, algumas delas inéditas. Desenhos e diagramas são do próprio Wagner.
 
“No livro, temos partituras de músicas minhas feitas com Milton Nascimento, Ronaldo Bastos, Fernando Brant e Murilo Antunes, entre outros”, conta ele.
 
A princípio, 500 exemplares chegarão às escolas. “Assim que todos forem distribuídos, aí, sim, faremos tiragem que será disponibilizada ao público e estará à venda nas principais livrarias brasileiras”, informa Wagner.
 
LEIA:

Do Brasil para o mundo

“O aplicativo Spotpart vai colocar as partituras para o mundo inteiro”, ressalta Mariana Tiso. “Partitura é linguagem universal, por isso todos os músicos poderão tocar junto, tudo estará disponível no streaming”, enfatiza. “Achamos importante a obra do Wagner estar materializada. Não adianta ela estar apenas em alguns livros, porém sem acessibilidade.”
 
O então governador de Minas Tancredo Neves com Milton Nascimento, Wagner Tiso e Gonzaguinha, artistas engajados na campanha da diretas
O então governador de Minas Tancredo Neves com Milton Nascimento, Wagner Tiso e Gonzaguinha, artistas engajados na campanha da diretas (foto: Jorge Gontijo/EM/D.APress/4/2/84 )
 
 
O songbook traz vários textos. Um deles é de Milton Nascimento, que relembra a época em que os dois meninotes eram vizinhos em Três Pontas.
 
“Ele me falou que passava em frente à minha casa, ouvia o som da minha sanfoninha e dos quatro baixos e falava: 'Esse cara é diferente'. O Dida falou para mim que o Wagner tinha um lance de achar que eu era cantor e que precisava de gente que me acompanhasse”, conta Milton.
 
Ou seja, alguém que acompanhasse “a cabeça, o ouvido e tudo” daquele garoto apelidado Bituca, filho da carioca dona Lília e do três-pontano Josino. “O primeiro foi o Wagner. Teve vários pianistas, várias coisas assim, mas igual a Wagner, ninguém. Depois teve o Clube da Esquina”, diz Milton.
 
Falando nisso, uma das partituras traz a melodia de “Bituqueando”, além de “Mar azul”, “O grande mentecapto”, “Giselle”, “Chico Rei”, “Dona Beija”, “Meu ninho” e “Pai Francisco”, entre outras composições de Tiso. O songbook vem com alentado perfil biográfico de Wagner Tiso assinado pelo jornalista e historiador João Marcos Veiga.
 
“A cada acorde e compasso, percebe-se o próprio pulso da música brasileira da segunda metade do século 20 que encantou o mundo: a sofisticação sem perder a brasilidade, o diálogo de gêneros e ritmos, o sinfônico de braços dados ao popular. O pianista mineiro parece sintetizar como poucos tudo isso”, escreve Veiga, lembrando que Tiso é presença marcante em momentos emblemáticos da vida cultural brasileira nos últimos 50 anos.
 
 

Milton e Wagner em BH

Wagner e Milton trocaram o Sul de Minas por Belo Horizonte na década de 1960, onde conheceram Lô Borges, Márcio Borges, Fernando Brant e Beto Guedes. A eles se juntou o fluminense Ronaldo Bastos. Formou-se aí o embrião do disco e do movimento Clube da Esquina, que até hoje impacta a MPB.
 
“Nos anos 1960, a bossa nova ainda é forte referência, mas na virada para os 70, Tiso incorpora, principalmente junto ao grupo Som Imaginário, um novo universo musical que passa pelo rock progressivo e instrumental contemporâneo”, observa Veiga.
 
Nivaldo Ornellas, Wagner Tiso e Milton Nascimento, usando ternos, tocam na noite de BH nos anos 1960
Nos anos 1960, em BH, com Nivaldo Ornellas no sax e Milton Nascimento no contrabaixo (foto: Acervo pessoal)
 
 
De acordo com o historiador, a assinatura pessoal de Tiso emergiu a partir das canções “A matança do porco” e “Armina”, ainda com o grupo de rock, “transitando da delicadeza à catarse progressiva e orquestral”.
 
Algum tempo depois, álbuns solos de Wagner trariam temas belíssimos, como “A igreja majestosa”, “Os cafezais sem fim” e “Zagreb”. Paralelamente, ele marcava presença em discos dos colegas do Clube e de estrelas da MPB.
 
“Criações de Wagner vão de canções que marcaram o século 20, incluindo o hino da redemocratização, a temas eruditos e de caráter fortemente experimental e visual”, pontua Veiga, chamando a atenção para a contribuição do compositor para o cinema.
 
Wagner musicou, entre outros, os filmes “Os deuses e os mortos, de Ruy Guerra; “A ostra e o vento”, “A lira do delírio”, “Inocência”, “Chico Rei” e “Os desafinados”, de Walter Lima Jr.; “Jango”, de Silvio Tendler (cujo tema era “Coração de estudante”); “Vida de menina”, de Helena Solberg; e “O guarani”, de Norma Benguel. Também é dele a trilha da novela “Dona Beija”, sucesso da extinta Rede Manchete.

Cidadão do mundo

Nos anos 1980 e 1990, observa Veiga, Wagner extrapolou a canção formal, “buscando sonoridades de outros cantos do mundo”. Descendente de ciganos, o músico gravou três discos na Suíça, morou na Espanha entre 1988 e 1989, viveu em Portugal em períodos alternados, de 1972 a 2000. Também tocou com o Quinteto de Cello na Dinamarca, Alemanha e na França.
 
No teatro, foi elogiado pela opereta “Manu Çuarê”. Essa multiplicidade de referências se reflete nas parcerias – Wagner trabalhou com Ferreira Gullar, Henfil, Geraldo Carneiro, Murilo Antunes, Fernando Brant e Paulo Sérgio Valle.
 
“Um cancioneiro que não se limita ao Brasil dos holofotes, revirando constantemente o chão da fértil da música popular de nosso país, com 'O frevo ilumina a cidade', 'Joga na bandeira', 'Sambaxixe' e 'Olinda-Guanabara'. Nessa variedade de gêneros que visita em suas músicas, chama a atenção, junto ao caráter visual, a estrutura bem-acabada e de paredes sólidas, como dos tijolos das antigas fazendas mineiras”, observa Veiga.

Desde 2016, Wagner Tiso vem se apresentando como maestro com vários artistas, além de fazer shows solo. Retomou o Som Imaginário ao lado de Robertinho Silva, Victor Biglione, Luiz Alves e Tavito (que morreu em 2019).

Planos para 2023

Mais recentemente, tem percorrido o Brasil em dueto com o guitarrista Victor Biglione. Os planos são muitos para 2023. Animado, Tiso conta que pretende gravar um disco de inéditas.
 
“Venho compondo ao longo dos anos e como também faço trilhas para cinema, tenho muita coisa guardada. Farei uma seleção entre aquelas já estão finalizadas e gravarei com orquestra, quarteto, trio, duo e até mesmo solo. Tenho muita coisa legal”, revela.
 
Wagner Tiso e Victor Biglione no palco
Wagner Tiso e Victor Biglione fazem turnê pelo país (foto: Ana Luiza Nolasco/Morandi Fotografia)
 
 

TRAJETÓRIA

. 1958

Wagner Tiso inicia carreira no grupo W’s Boys, banda de baile do Sul de Minas, em que Milton Nascimento se apresentava como Wilton.

. ANOS 1960

Participou do Sambacana, em BH, dos grupos de Edison Machado e Paulo Moura, além do Berimbau Trio. Surge o embrião do Clube da Esquina. Em 1969, faz o arranjo e compõe “Matança do porco” para a trilha sonora de “Os deuses e os mortos”, filme de Ruy Guerra.
 
Wagner Tiso, usando bata e tem cabelos compridos, durante as gravações de 'Clube da Esquina 2'
Wagner no estúdio, durante as gravações de 'Clube da Esquina 2' (foto: Acervo pessoal )
 

. ANOS 1970

Com Robertinho Silva, Tavito, Luis Alves, Laudir de Oliveira e Zé Rodrix, cria a banda de rock progressivo Som Imaginário. Em 1972, arranja e orquestra os discos “Clube da Esquina” e “O milagre dos peixes”, de Milton Nascimento. Em 1977, grava o primeiro disco solo, “Wagner Tiso”.
 
Integrantes da banda Som Imaginário conversam em frente a uma mesa
Wagner e Som Imaginário (foto: Acervo pessoal)
 

. ANOS 1980

Lança os discos “Todas as teclas”, com César Camargo Mariano; “Coração de estudante”, com participação de Milton Nascimento; “A Floresta do Amazonas – Villa-Lobos”, com João Carlos Assis Brasil e Ney Matogrosso; e “Manú Çaruê – Uma aventura holística”, com Cazuza e Ritche.

. ANOS 1990

Entre outros álbuns, lança “Wagner Tiso – Profissão: Música”, com clássicos de Waldir Azevedo, Tom Jobim e Dolores Duran; e “Debussy e Fauré com o Rio Cello Ensemble”.

. ANOS 2000

Lança “Memorial”, com Zé Renato; “Tom Jobim Villa-Lobos”, com Rio Cello Ensemble; “Cenas brasileiras”, com Orquestra Petrobrás Pró-Música e Roberto Tibiriçá; “Um som imaginário”; “Da sanfona à sinfônica – Wagner Tiso 40 anos de arranjos”; “Samba e Jazz – Um século de música”; “Outras canções de cinema”, com Márcio Malard. Em 2018, realizou o primeiro Festival Internacional de Piano Solo, em Belo Horizonte.


receba nossa newsletter

Comece o dia com as notícias selecionadas pelo nosso editor

Cadastro realizado com sucesso!

*Para comentar, faça seu login ou assine

Publicidade

(none) || (none)