Causou certo rebuliço entre os fãs da escritora italiana Elena Ferrante o anúncio feito pela Netflix, em maio de 2020, de que iria adaptar para o formato de série o romance “A vida mentirosa dos adultos”. Dois anos antes, a HBO havia estreado a versão televisiva de “A amiga genial”, provavelmente o mais bem-sucedido livro da misteriosa escritora italiana, que protege sua identidade sob o pseudônimo Elena Ferrante.
Em seis episódios dirigidos por Edoardo de Angelis, a série “A vida mentirosa dos adultos” estreou nesta semana na plataforma de streaming. Pois bem, trata-se de uma decepção. “A vida mentirosa dos adultos” acompanha Giovanna, uma garota de 12 anos que vive sua juventude na Nápoles dos anos 1990. No entanto, à medida que vai deixando a infância começa a entender que o “mundo dos adultos” é feito de mentiras, hipocrisias e traições.
Essa percepção ocorre ao descobrir a vida paralela que o pai mantém com a esposa do melhor amigo. Um caos se instala na cabeça da garota, obviamente. É em tia Vittoria que Giovanna encontra certo alento e entende que, de fato, este é o mundo que espera por ela, e que não há muito a fazer.
Figura ausente nas reuniões de família, Vittoria é persona non grata por seu estilo de vida. Livre das amarras sociais e sem papas na língua, ela não se importa de ser considerada uma mulher vulgar; afinal, suas maiores preocupações são as pessoas com quem realmente se importa.
Rebelde e mimada
É fato que a produção da Netflix traz esse dilema enfrentado por Giovanna (interpretada por Giordana Marengo). Contudo, concentra-se mais na descoberta da sexualidade e no comportamento rebelde da protagonista, sem se aprofundar nas razões que a levam a agir conforme age, de modo que, muitas vezes, Giovanna parece ser uma menina mimada, que se sente injustamente incompreendida por todos.
A hipocrisia que rodeia os adultos, entretanto, é bem representada na figura de Andrea (Alessandro Preziosi), pai de Giovanna. Intelectualizado e preocupado em mostrar que se importa com as causas sociais – é ligado aos movimentos de esquerda da cidade –, vive uma vida de luxo, regada a champanhe e caviar, que é compartilhada somente com os amigos mais próximos.
Nella (Pina Turco), a mãe de Giovanna, por sua vez, é uma editora de livros, o que lhe confere certo ar de intelectualidade, mas ela logo se mostra superficial e frágil em seus comportamentos.
Assim como na obra original, a tia desprezada pela família é a única mulher da série com personalidade forte e que faz valer a luta feminista, embora esse comportamento seja natural dela, e não represente um engajamento deliberado na causa.
Corrompendo tantos personagens e deixando a complexidade da obra de Ferrante de lado, a versão de Edoardo de Angelis para “A vida mentirosa dos adultos” demonstra que ainda não são todos os homens que conseguem fazer uma leitura à altura da obra da escritora e compreender seu discurso, belamente realizado por meio de metáforas e alegorias.
“A VIDA MENTIROSA DOS ADULTOS”
Série em seis episódios, disponível na Netflix
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