Nem todo mundo da escola onde MC Braz estudava, em 2014, ano em que ele dava os primeiros passos como cantor, acreditava que aquele jovem de 14 anos, que sonhava em ter o rosto reconhecido em qualquer canto do país, pudesse vingar na cena do funk.





Acharam até que ele era piada. “As pessoas viam mais na brincadeira e zoeira. Isso nunca me incomodou, nem sequer me chateou”, revela Luiz Henrique Braz Vieira, o MC Braz, de 23 anos.

Pois a “piada” se tornou uma das revelações do funk nacional. Com mais de 3 milhões de ouvintes mensais no Spotify, uma série de hits nas plataformas digitais e alianças com outros nomes da música, o artista belo-horizontino lança agora o primeiro álbum cheio, “Beagá”, e planeja expandir, cada vez mais, seu nome no cenário nacional.

“Fiz várias turnês em Santa Catarina e no Rio Grande do Sul, estados que escutam muito o funk de Belo Horizonte”, diz. “Estou trabalhando para que as pessoas me conheçam em qualquer lugar do Brasil.”





“Beagá” é calcado no funk “pique BH”, resume MC Braz, referindo-se ao subgênero mineiro do batidão. A primeira amostra desse trabalho é “Culpa sua”, single lançado no último dia 27, com direito a videoclipe e participação do paulista Gaab.

Em entrevista ao Estado de Minas, o funkeiro fala de seu disco de estreia, dos próximos projetos, de sua trajetória e da cena do funk na capital mineira.

MC Braz e Gaab (à direita): aliança selada entre o funk de BH e o "pique SP"

(foto: Jhenis M. Silva Neto)

Como foi o processo de parceria com Gaab, de São Paulo, e o mineiro DJ Win para o single “Culpa sua”, que estará presente no álbum “Beagá”? Por sinal, os dois são referências para você, que se tornou representante do funk de BH na cena do Brasil.
Sou fã do Gaab desde que comecei a cantar, em 2014. Sempre acompanhei as músicas dele, acho a voz dele incrível. Surgiu a oportunidade de fazer esta música, no “pique BH”. Teremos mais músicas juntos, com certeza. Fechamos a parceria, fui para São Paulo e escrevemos a música no estúdio. Quem produziu foi o DJ Win, que trabalha comigo, é meu amigo e DJ que vai estourar em Belo Horizonte, um dos que mais está acertando na produção do funk de BH raiz.





O que BH representa para você enquanto artista e cidadão?
Belo Horizonte representa não apenas meu contexto pessoal, por ter nascido e crescido aqui, como também musical. Tenho muito orgulho de ser de BH e trabalhar com funk. Um funk que, cinco anos atrás, não tinha notoriedade nacional e vem crescendo muito, explodindo músicas uma atrás da outra, cada vez mais tomando identidade própria. Hoje, você consegue ouvir um funk de São Paulo, um do Rio e um de BH e saber exatamente qual é qual, de onde é cada um. Acredito que (BH) tenha sido um dos estilos que mais estouraram música no TikTok nos últimos anos. Tenho muito orgulho de fazer parte disso e trabalhar com o funk de BH.

O álbum seria uma declaração a Belo Horizonte e ao funk da capital? Seria uma espécie de metalinguagem? Ou seja, funk falando de funk e usando essa música para falar da cena funk de BH e também da cidade?
É exatamente uma declaração ao funk de BH, mas é, sim, uma maneira de consolidar o funk de BH na cena nacional, embora (o estilo) já esteja consolidado. É 100% BH, tanto musicalmente quanto nos videoclipes. Só vai ter uma surpresinha no final do álbum, que não é BH e também não é Brasil. Mas é proposital.

Como foi o trabalho e a produção do clipe de “Culpa sua”?
Fiquei muito orgulhoso do clipe. Como falei antes, sou muito fã do Gaab. Uma honra enorme fazer esta música e gravar esse clipe. Ficou muito boa. A gente vai para o estúdio sem saber o nível de música que teremos. Sempre uma surpresa. Os meninos da Hard são extremamente profissionais (o clipe teve produção executiva da Hard Produção e de Beatriz Paranhos).





O que há de diferente nas músicas deste álbum em relação a outros sons que você já soltou? O que podemos esperar de seus próximos singles?
A única diferença que tem entre as músicas do álbum e as que já lancei na vida toda é que lancei outros estilos também, como trap, funk “pique SP” e “pique RJ”. Neste álbum, queria trabalhar 100% com funk “pique Belo Horizonte”, queria consolidar isso, fazer o funk que mais me dá satisfação, um funk que cresceu muito e veio de onde eu vim.

Como foi o início de sua trajetória como artista em BH?
O início foi bem complicado. Na época, não tinha dinheiro para produzir músicas. De 2014 a 2017, lancei umas quatro músicas só, porque era bem difícil pagar produção. Quem era amigo mais próximo na escola apoiava e achava legal. Mas, no geral, achavam que eu era mais uma piada do que coisa séria. As pessoas viam mais na brincadeira e zoeira. Isso nunca me incomodou, nem sequer me chateou. Porém, no início foi bem difícil a situação financeira. Só depois de 2017, quando consegui estourar minha primeira música em Belo Horizonte – não no Brasil –, foi que DJs de BH que estavam na cena começaram a olhar para mim, a trabalhar comigo sem cobrar. Sem eu precisar ir atrás deles. Eles enxergaram meu trabalho com outros olhos.

E quanto à cena atual do funk de BH? O que você acha dessa efervescência, dos artistas que estão aí fazendo o trampo deles?
Tenho uma opinião um pouco crítica à cena atual do funk de BH. Sou suspeito para falar o quanto amo o estilo de Belo Horizonte. Mas, apesar de trabalhar nisso, sinto que há uma carência muito grande de profissionalismo. Tem muito artista em BH com músicas explodidas: 100 milhões, 150 milhões, 200 milhões (de streams). Tem também artistas com menos, mas com músicas também explodidas, com 10, 20, 30 milhões (de streams). Mas esses artistas não têm uma gestão profissional de carreira, não têm assessoria de imprensa, não vão para fora gravar feat com outros artistas, não trabalham imagem... Não sei o porquê. Não sei se é a mentalidade ou porque não têm empresário em Belo Horizonte que realmente viva a música, fica no pé do artista e trabalha a carreira dele como um todo. O artista estoura a música, mas não consolida imagem, só a música. É um problema que Belo Horizonte tem de resolver. Já passei muito por esse problema. Estou me organizando e trabalhando em cima disso. A Bianca (Beatriz) me ajuda muito, faz a gestão da minha carreira. Querendo ou não, para crescer na carreira como um todo, não adianta só estourar música, tem que ter uma imagem, tem que ter trabalho em cima da carreira, precisa de assessoria de imprensa, estar presente na rede social, aparecer na TV. A cara tem de aparecer em tudo quanto é lugar. As pessoas têm de saber que a música que escutam todo santo dia ou todo santo final de semana é sua, tem o seu rosto. É ter uma imagem bem trabalhada principalmente para vender publicidade. Tudo encarece quando você não tem só música. Quando também tem imagem, encarece o cachê e a publicidade. Muitas oportunidades se abrem.





O que mais mudou no funk, em termos de evolução, desde que você iniciou sua carreira? Como foi a sua própria evolução neste período?
A produção em si mudou. Mas tem a mesma raiz, a mesma origem. Mudou muito o estilo das letras. Mas é como tudo na vida, nada continua por muito tempo como é. E o que continua fica ultrapassado. Eu mesmo, quando escuto músicas minhas de dois ou três anos atrás, acho um pouco estranho. Assim como sei que músicas que escrevo hoje provavelmente serão estranhas para mim daqui a dois ou três anos. Estranho achar que posso fazer coisa melhor. Mas amo e acho sinistro o que escrevo hoje, assim como dois anos atrás achava sinistro o que eu escrevia. Estamos em constante evolução. O que mudou e evoluiu, mesmo, foi o nível das letras e das produções.

Vamos agora de BH para o Brasil. Como tem sido a repercussão de sua trajetória em outros estados?
Graças a Deus, meu funk toca muito e faço muito show no Sul do Brasil. Fiz várias turnês em Santa Catarina e no Rio Grande do Sul, estados que escutam muito o funk de Belo Horizonte. Parece até que estou em BH quando vou para lá. Se não fosse o sotaque diferente, seria como estar em casa. Já rodei muito o interior de Minas também. Acredito que cada parte do Brasil tem seu estilo, musical e culturalmente falando. Dificilmente você vai chegar no Nordeste e escutar um funk de Belo Horizonte. Obviamente, acontece de tocar, mas culturalmente as pessoas gostam de outro estilo, e isso é normal. Estou trabalhando para que as pessoas me conheçam em qualquer lugar do Brasil.

Quais são os planos para 2023, além dos singles e do novo álbum? 
Para 2023, digamos que minha agenda de trabalho esteja praticamente fechada, não de shows, mas musicalmente falando. Claro que estamos sempre em movimento, no estúdio fazendo música nova. Até porque também faço projetos que não são para meu canal, mas para outras pessoas, isso não atrapalha o meu planejamento. Já tenho o álbum “Beagá” aí. Depois dele, terei um trabalho com um produtor e compositor muito “pica”, muito conhecido no Brasil. Não vou falar ainda quem é, mas fui a Salvador trampar com esse cara, que é muito sinistro. Já o acompanho há muitos anos, temos várias músicas prontas para um novo álbum, que não vai ser funk “pique BH”, será pop. Não pop de verdade, mas vai me abrir portas fora do funk. Já sou funkeiro e MC, quero expandir. Quero ser respeitado em todas as áreas. Já tem planejamento até o fim do ano, e a galera vai gostar. É qualidade 101%.





Qual é o sonho que você ainda não realizou?
Profissionalmente falando, um sonho que ainda não realizei é ter meu rosto reconhecido no mesmo nível que minhas músicas são reconhecidas. Neste ano, espero trabalhar isso. Que meu rosto seja reconhecido em qualquer lugar onde eu vá, que minha imagem se consolide nacionalmente. Agora, no aspecto pessoal, um sonho que sempre falo e, graças a Deus, estou começando a realizar é construir um prédio. Tenho investimentos fora do funk, estou construindo casas para vender. Sempre gostei do ramo imobiliário. Inclusive, acho necessário ter outras fontes de renda para não ficar refém de uma coisa só. Meu sonho é construir sozinho um prédio para vender, ter condições financeiras para isso.

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