A mexicana Lucrécia (Danna Paola) inicialmente seria russa. Christian (Miguel Herrán) é quem deveria ter desaparecido como parte de um plano para desvendar o assassinato de Marina (María Pedraza). Se isso tivesse ocorrido, Samuel (Itzán Escamilla) e Carla (Ester Expósito) jamais teriam ficado juntos.





 

Essas são apenas algumas das revelações de Darío Madrona, um dos criadores de "Elite", série espanhola que tem seis temporadas disponíveis na Netflix e cuja sétima temporada está sendo gravada em Madri atualmente. O roteirista, que esteve recentemente em São Paulo no encerramento do Serie_Lab Festival, conta que partiu da Netflix a ideia de que Lucrécia fosse vivida por uma latino-americana. "Eles achavam que a série poderia funcionar muito bem nesse mercado e tinham toda a razão do mundo", afirma.

 

Afastado do dia a dia da produção desde a terceira temporada, ele conta que o processo para a introdução do personagem Iván, vivido pelo brasileiro André Lamoglia desde a quinta temporada, deve ter sido parecido. "Nós notávamos, pela quantidade de mensagens que recebíamos em português – fosse nos elogiando ou nos xingando –, que a paixão das pessoas daqui pela série era grande", avalia. "Sabíamos que a série estava funcionando no Brasil, que além de tudo é um mercado gigantesco."

 

Ele diz desconfiar que o motivo pelo qual a série foi bem em alguns países é a desigualdade social, explorada na série pelos três personagens, que ganham bolsa em um colégio exclusivíssimo frequentado por filhos de milionários. Foi assim na Índia, onde a série acaba de ganhar um remake local ("Classes").





 

"A história quase funciona melhor por lá, porque a desigualdade social na Índia é muito forte e ainda tem a questão das castas", avalia. Ele conta que recebeu a “Bíblia” e o roteiro da adaptação e que fez algumas observações, não para corrigir, mas para passar algumas informações que poderiam ser úteis para eles.

 

Uma delas, segundo diz, foi o arco original da segunda temporada, que deveria ser centrada em Christian. Contudo, o ator Miguel Herrán precisou se afastar da trama após o sucesso retumbante de "La Casa de Papel", que ele também estrelava na época. "Quando ele precisou sair, tivemos que mudar tudo, porque ele era o protagonista", lamenta.

 

Sem mágoa

Madrona diz que não guarda mágoas dele nem dos demais atores que foram deixando a série aos poucos. "Quando os atores têm contrato por um certo tempo e dão tudo de si nesse período, mas querem fazer outras coisas depois, só podemos ficar agradecidos, principalmente se você tiver tempo de preparar a saída e dar aos personagens um final digno", diz.

 





No caso de uma série como "Elite", o roteirista admite que foi razoavelmente mais fácil lidar com as saídas de Danna Paola, Ester Expósito e Mina El Hammani. "Como é uma série que se passa em um colégio, podemos ir trocando os personagens à medida que eles vão se formando, aí entra uma nova geração, e isso permite que possamos contar novas histórias sem tantas dificuldades", afirma.

 

Ele conta ainda que, inicialmente, a encomenda da Netflix foi de três temporadas, mas com a certeza apenas de que a primeira temporada seria produzida. "Nós tínhamos uma ideia muito vaga do que iria acontecer nas temporadas seguintes, a maioria dos profissionais de TV trabalha temporada a temporada – e quem disser o contrário está mentindo", brinca. "A cada ano, começamos com uma tela em branco, tentamos chegar ao final da melhor forma e, se tivermos a sorte de a série ser renovada, começamos tudo de novo."

 

A série já é uma das mais longevas entre as originais da Netflix, e Madrona diz que não tem ideia de até quando ela pode durar. "Acho muito difícil que hoje em dia uma série acabe tendo muitas temporadas, porque as pessoas se cansam e a oferta de produções novas é muito grande", diz. "São como crianças na frente de brinquedos novos, e que deixam o antigo um pouco de lado."





 

 

Antologia

Ao saber do caso de "Malhação", que teve 27 temporadas, o roteirista diz que isso é mais plausível de acontecer no modelo adotado pela Globo, com temporadas com histórias, autores e personagens independentes. "É quase uma antologia, e acho que o futuro vai ser por aí, porque podemos oferecer algo novo, mas, ao mesmo tempo, o público vai reconhecer uma marca de que já gosta", compara. "Acho uma estratégia inteligente e acho que poderia ser adotada em 'Elite', mantendo o nome e o tom, mas com a trama se passando em outro lugar."

 

O autor conta ainda que visitou dois ou três colégios quando estava fazendo a pesquisa para a série – ele revela que em pelo menos um deles contou que tinha um filho com Carlos Montero, o outro cocriador de "Elite", para que pudessem lhe mostrar as instalações. "Eram escolas cheias de filhos de milionários, de diplomatas etc.", lembra.

 

Ele também conta que, apesar de os adolescentes da série se comportarem como adultos e da classificação para maiores de 18 anos, trata-se de uma série sobre jovens e para jovens. "Eu acho que 'Euphoria', por exemplo, é uma série sobre jovens que não é para jovens, mas os jovens assistem do mesmo jeito, porque gostam de se ver representados na tela", afirma. "Acho que parte do sucesso de 'Elite' é que os personagens são bem adultos, e os jovens gostam de se sentir assim, de saber que seus conflitos são importantes."

 

Sobre as queixas de alguns internautas sobre a trama ser pouco realista, ele diz que não se incomoda. "Quando você faz uma série sobre advogados, muitos advogados aparecem dizendo que aquilo não é real, assim como ocorre com as séries médicas", diz. "Mas o resto do público não quer saber."





 

 

Coerência

"A série se passa em um colégio, e todo mundo passou por um colégio, então o público sabe que não é real", admite. "Isso não importa, nós não pretendíamos que fosse real, assim como uma série sobre vampiros ou sobre zumbis não pretende ser real. Se buscássemos o realismo, não teríamos feito essa série. O que a trama precisa é ser coerente dentro do mundo que você está criando. Se o que ocorre é crível nesse universo, as pessoas acreditam." 

 

 

 

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