Foi em 20 de fevereiro de 2009, sexta-feira de um carnaval que não existia. Um grupo de amigos, muitos deles músicos, se reuniu no Bar do Orlando, em Santa Tereza. Era uma tentativa de trazer alguma folia a uma Belo Horizonte que adormecia na época.
No dia seguinte, vários deles foram para o Parque Municipal. Arrastaram as pessoas da rua e o desfile improvisado saiu, rumo à Rua Sapucaí, na Floresta, e de lá para a Praça da Estação. Até ligaram o chafariz, mesmo que não houvesse nenhum sinal do que viria a se tornar a Praia da Estação.
É desta maneira que Gustavo Caetano, fundador e mestre de bateria, se recorda do primeiro carnaval do Samba Queixinho, um dos blocos mais conhecidos do carnaval de rua de Belo Horizonte. Quinze anos depois – e há dois sem desfilar em decorrência da pandemia – o Queixinho volta à ativa.
Neste domingo (19/2), a partir das 14h, a bateria inconteste de 200 integrantes sai do Barro Preto, em frente à Sala Minas Gerais. Serão seis horas de desfile até a Praça da Assembleia, onde o bloco se encontra com trio elétrico comandado por Heleno Augusto (à frente do Havayanas Usadas, que desfila na segunda, a partir das 10h, no bairro Pompeia) e o sambista Robertinho Junqueira.
O local do desfile não foi acaso. Desde 2016, o Queixinho homenageia algum grupo ou artista de BH. Neste carnaval, a Orquestra Filarmônica de Minas Gerais, que está comemorando 15 anos neste mês, será a homenageada.
Convite
“São universos distintos, mas que se comunicam demais”, afirma Rafael Alberto, principal percussionista da orquestra. Ele é um dos instrumentistas da Filarmônica que topou o convite: neste domingo, tocando tamborim, Alberto se junta aos demais integrantes da bateria. Terá algumas colegas na função: a flautista Cássia Lima, também chefe de naipe; a oboísta Maria Fernanda Gonçalves e a arquivista Ana Kobayashi, que integra a equipe técnica da orquestra.
Para Alberto, um dos aspectos mais interessantes do Queixinho é justamente sua formação. “É só percussão, o que faz o bloco ter uma das baterias mais elaboradas (do carnaval de BH), com muitas convenções. É neste aspecto que vejo a interseção entre o que faço na Filarmônica.”
O resto, diz ele, é diferente. “Tudo o que toco na orquestra está escrito na partitura. No bloco não tem nada escrito, o Gustavo nos dá as coordenadas por meio de símbolos.” Alberto, que começou a frequentar os ensaios do Queixinho em janeiro, admite que teve dificuldade em aprender as convenções. Se Caetano faz um coração com as mãos, isto significa uma coisa; se o gesto é outro, o movimento dos músicos também.
E a outra questão, Alberto comenta, é o estilo. No bloco, tem que tocar forte, ao contrário da orquestra. “Não estou acostumado, então cansa muito.” O que dirá então desfilar tocando durante seis horas.
Sem patrocínio
O Queixinho sai neste domingo para um desfile na marra. O bloco perdeu patrocinador e fez uma vaquinha virtual para arcar com vários custos. “O patrocínio de um edital da Belotur ajuda, mas é insuficiente para a grandeza do espetáculo que gostaríamos de fazer.” Os custos, de 2020 para cá, aumentaram exponencialmente, diz Caetano.Um trio elétrico, por exemplo, cujo aluguel custava R$ 18 mil, está saindo agora por R$ 35 mil. A vaquinha, ele comenta, foi um “pedido de socorro”. “Eu queria um carnaval em que pudesse contratar muita gente. Seria uma distribuição de renda que atingiria 350 pessoas. Em vez disso, estamos todos acumulando funções. A parte da alimentação está saindo do meu bolso”, acrescenta.
Caetano é crítico da maneira com que o carnaval de BH vem sendo conduzida. “Comparando com Olinda, Recife, Salvador, o carnaval de BH é muito recente. Por outro lado, ele cresceu desproporcionalmente e ainda não tem um modelo estabelecido. O crescimento é maravilhoso, carnaval tem que ser cada vez maior, mas é difícil acompanhar se as empresas retraíram.”
Ele comenta sobre os 5 milhões de pessoas que são esperadas para a folia belo-horizontina. “Estou com dificuldade para entender: a rede hoteleira está lotada, não tem passagem para cá, e como os blocos estão passando dificuldade?”
Para Caetano, há que haver um investimento grande na festa. “Empresas privadas que se beneficiam com o carnaval, como cervejarias, drogarias, não retornam o dinheiro. Por mais que seja um carnaval que tenha crescido de 10 anos para cá, ele merece respeito.”
Mesmo com as dificuldades, a parte artística do desfile não será afetada, Caetano garante. Tampouco sua vontade de fazer um carnaval sempre maior e melhor. “Duas semanas depois que o carnaval terminar, nós retomaremos os trabalhos com os ensaios na nossa sede (no antigo Cine Odeon, na Floresta).” As portas estarão abertas para novos alunos.
SAMBA QUEIXINHO
Desfile neste domingo (19/2), a partir das 14h, em frente à Sala Minas Gerais, Rua Tenente Brito Melo, 1.090, Barro Preto
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