Músico indígena Nelson D. se apresenta na ilha virtual em dupla com a artista visual Bianca Turner

(foto: Amanda Moraes/divulgação)

 
Uma experiência imersiva, em realidade virtual, abarcando a biodiversidade, os costumes, os povos e tradições da maior floresta tropical do mundo. É o que propõe o Festival Amazônia Mapping (FAM), que será realizado nesta segunda-feira (6/3), a partir das 11h, no ambiente on-line. O evento, que integra obras audiovisuais, música, performances, projeções e vivências formativas, é um dos maiores de arte e tecnologia do Brasil.





Criado em 2013 pela artista visual Roberta Carvalho como um festival de rua em Belém, com foco em macro-projeções e videomapping, ele, com o tempo, tornou-se palco de um encontro de distintas manifestações artísticas. Com a chegada da pandemia, o FAM incorporou definitivamente a linguagem digital e a pesquisa tecnológica.

Com apresentações inéditas em uma Amazônia imaginária, o evento promove programação com expressões que se atravessam e se cruzam, com encontros entre artistas amazônicos e paulistas em ambiente virtual que apresenta a floresta e cidades da região como personagens do cenário criado para o festival.
 
 
REALIDADE VIRTUAL “Esta é uma edição especial, toda em realidade virtual, que precede a realização da edição padrão, presencial, que acontece em junho, em Belém”, explica Roberta. Ela diz que o ambiente em que a programação se desenrola ao longo do dia é resultado de uma construção de dupla via.





“Um dos ambientes é um metaverso, um mundo virtual que criamos em 2020. A gente filma as performances dos artistas e insere nesse ambiente. Ao mesmo tempo, conteúdos produzidos por artistas visuais são também inseridos em telas ou arquiteturas que compõem esse cenário. A outra via consiste em filmar, com câmera em 360 graus, localidades da floresta, e ilustrá-las com elementos digitais. É um jogo de múltiplas realidades”, explica.

Ela diz que a filmagem em 360 graus permite ao público que estiver acompanhando a programação, no site e no canal oficial do YouTube do FAM, deslocar o olhar para todos os lados – para o céu, para o chão, para os lados e para trás. “O uso de óculos de realidade virtual potencializa a experiência e permite uma imersão ainda maior”, pontua.

MÚSICA E IMAGEM Associando música e imagem em shows inéditos, entre os participantes está o artista indígena Nelson D., de Manaus, que, em dupla com a artista visual Bianca Turner, convidam o público para uma viagem audiovisual “cyber amazonense”.





Outro nome que marca presença na programação, a cantora Aíla – expoente da música pop da Amazônia, que se tornou parceira de Roberta e é codiretora do festival – vai apresentar as músicas de seu álbum “Sentimental”, em parceria com o artista Jean Petra. Ele vai fazer intervenções com elementos e objetos 3D, criando uma narrativa para o show de Aíla.

Além de ser codiretora do FAM, a cantora Aíla é uma das atrações que compõem a programação desta edição

(foto: FAM/divulgação)

DJ e produtora que se destaca como um importante nome da cena do tecnobrega do Pará, Meury vai tocar pela primeira vez suas produções na ilha virtual do Amazônia Mapping, com projeções de diversas obras do artista PV Dias, incluindo o “Altar sonoro”.

SER EM METAMORFOSE A programação traz, também, a performance “Crisálida”, da artista visual e performer Rafa Bqueer, que abarca o conceito de um ser em metamorfose, uma identidade em transição, assumindo subjetivas formas.





A própria Roberta Carvalho marca presença com a obra imersiva “Resiste!”, uma experiência de projeção sobre a floresta virtual que mescla vídeo-arte, realidades mistas e intervenção urbana. “É um manifesto que fala sobre a Amazônia em diversos aspectos, a importância de seus povos e de seu bioma. Entre frases poéticas, os rostos de pessoas das comunidades tradicionais da região são projetados nas árvores. É um sobrevoo amazônico”, aponta.

O FAM apresenta, ainda, o videomapping “Alma de selva”, uma colaboração inédita entre os artistas visuais Microdosys e Ilumina Chebel e o músico Irû Waves. A obra é composta por imagens sintetizadas a partir das redes neurais de inteligência artificial. Por meio da técnica text-to-image, “Alma da selva” introduz as forças invisíveis da natureza que se mostram em sons e nas máscaras dos espíritos dos animais.
 

DJ Meury está inserida na ilha virtual do festival que promove o encontro de artistas brasileiros

(foto: FAM/divulgação)
 
ENCONTRO DE ARTISTAS Roberta aponta que esta edição especial do Amazônia Mapping é guiada pelo tema “Floresta viva”, e que o recorte curatorial está justamente no encontro de artistas da Região Amazônica com os de São Paulo. “O projeto foi aprovado no ProAC (Programa de Ação Cultural), um edital de São Paulo, então propor essas dobradinhas foi uma maneira de nos articularmos dentro de uma lei de incentivo de outro estado”, destaca.





Ela ressalta que criar essa ponte entre Norte e Sudeste, com encontros entre artistas visuais e da música, é também uma forma de fazer com que o FAM reverbere em fronteiras cada vez mais dilatadas. A diretora artística do evento diz que os convidados trazem, além da poética, temas importantes em suas performances, como a questão de gênero, trabalhada por Rafa Bqueer.

“Com esses encontros e essas propostas artísticas, a gente tem diversas possibilidades de se pensar essa Amazônia atual, não só do ponto de vista da biodiversidade, mas também a cultura periférica, por exemplo, com as projeções de PV Dias, com dançarinos de tecnobrega, ilustrando a apresentação da DJ Meury, que vem da periferia também”, aponta.

PROJETO PREMIADO A ilha virtual onde acontecem as apresentações foi desenvolvida por meio da plataforma Unreal Engine, usada para a criação de gráficos de jogos eletrônicos. O projeto foi premiado na categoria “Inovação: Música e Tecnologia”, da Semana Internacional de Música de São Paulo (SIM-SP), e foi palco das duas últimas edições do festival.





Roberta explica que, com a chegada da pandemia, ela e Aíla começaram a pensar em como levar as pessoas para a Amazônia a partir das telas, envolvendo realidade virtual e o metaverso, que em 2020 emergia como uma nova possibilidade tecnológica.

“Construímos esse ambiente digital com um motor de jogo, uma ‘engine’ de videogame, quer dizer, essa ilha virtual tem a metodologia de construção de um game, só que com um direcionamento artístico. A partir dessa criação, a gente vem reinventando esse ambiente no metaverso a cada edição do Amazônia Mapping. Agora estamos experimentando de uma maneira mais profunda a realidade virtual”, diz.
 

Artista Rafa Bqueer realiza a performance "Crisálida", que explora as possibilidades de imersão na realidade virtual

(foto: FAM/divulgação)
 
PRODUÇÕES AUDIOVISUAIS Além de embasar o FAM, a Amazônia também é mote ou cenário para produções audiovisuais da O2 filmes, responsável por obras conhecidas internacionalmente, como “Cidade de Deus”, dirigida por Fernando Meirelles. Anunciado na Comic Com Experience 2022 (CCXP 22), já está em processo de desenvolvimento o projeto “Amazônia”, sobre cidadãos comuns que lutam pela preservação da floresta contra os invasores, criado e estrelado por Bruno Gagliasso.





Entre outros projetos em desenvolvimento, está também uma minissérie amazônica, dirigida por Quico Meirelles, produzida por Andrea Barata e Fernando Meirelles, e com roteiro de Bráulio Mantovani. E a lista de coproduções internacionais inclui, ainda, dois filmes ambientados na Amazônia.

LETRAS NA MATA Na seara da literatura, três lançamentos recentes também jogam luz sobre o “pulmão do mundo”. São eles “Mad Maria”, de Márcio Souza, “A repetição”, de Pedro Cesarino, e “Ficções amazônicas”, de Aparecida Vilaça e Francisco Vilaça Gaspar.

O primeiro é um romance que se passa durante o período de construção da ferrovia Madeira Mamoré (1907-1912), localizada no interior da floresta. A estrada, conhecida como Ferrovia do Diabo, guarda milhares de histórias de trabalhadores vitimados por um sistema caracterizado por condições de trabalho exaustivas e degradantes. O autor amazonense constrói uma narrativa sobre os episódios vividos durante o período de desbravamento do Norte do país.





POVOS INDÍGENAS “A repetição” traz duas novelas sobre a herança da escravidão de povos indígenas. Pedro Cesarino é escritor e antropólogo, vencedor do Prêmio Jabuti de Ciências Humanas com sua tese de doutorado sobre a poética do xamanismo na Amazônia. Na primeira história, “O tempo”, o leitor é apresentado a Américo, um jovem curioso, que passa os dias a observar atentamente seu tio Totanauá, o primeiro de seu povo que aprendeu a ler.
 
Já “Ficções amazônicas” reúne 11 contos que homenageiam as culturas dos povos originários através da exploração do imaginário, em que cada uma das histórias se baseia nas tradições de diferentes etnias da região. Mãe e filho, Aparecida e Francisco se apoiaram em farta bibliografia antropológica para escrever os contos, que celebram a diversidade em uma narrativa com toques de surrealismo.
 
FESTIVAL AMAZÔNIA MAPPING

Nesta segunda-feira (6/3), a partir das 11h, no site e no canal oficial do YouTube do festival
 
PROGRAMAÇÃO:
Música e imagem: Nelson D + Bianca Turner
Música e imagem: Aíla Jean Petra
Música e imagem: DJ Meury PV Dias
Performance: Rafael Bqueer
Vídeo mapping: “Resiste!”, de Roberta Carvalho
Vídeo mapping: Microdosys Ilumina Chebel, com trilha sonora de Irû Waves 

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