A atriz Raquel Penner sentada debaixo de mesa em cena do monólogo 'Cora do Rio Vermelho'

A atriz Raquel Penner estrela o monólogo "Cora do Rio Vermelho", focado em Cora Coralina

Bianca Oliveira/Divulgação

Uma vasta programação, que ocupa com distintas formas de expressão artística diferentes equipamentos culturais de BH, celebra o Dia Internacional da Mulher. No cinema, na música, nas artes cênicas e na literatura, o público poderá conferir, nesta quarta-feira (8/3) e também ao longo do mês de março, a potência da verve criativa feminina.

O Memorial Vale abriga amanhã o show do coletivo Docilaré, que reúne as cantoras Dóris, Cida Reis, Raquel Seneias e Vivi Amaral – esta última ausente da formação porque está de licença maternidade. Guiadas pela perspectiva do olhar feminino, elas vão apresentar um repertório que inclui temas autorais mesclados a composições alheias, com temáticas que falam de amor, desejos, emoções, sonhos, tristezas e alegrias.

Dóris diz tratar-se de um show concebido especialmente para a data. “O espetáculo tem o propósito de apresentar ao público canções que enaltecem a mulher, que falam da força das mulheres e do lugar que elas querem ocupar. É uma questão mesmo de conscientização.” O roteiro inclui músicas de Dona Ivone Lara, Mart’nália e Adriana Calcanhotto, entre outras.

“Também tem música da Vivi Amaral e uma minha, chamada ‘O samba de roda que eu vou’. É minha primeira composição, em parceria com João Batera, e tem a ver com o mestrado que acabei de concluir, uma pesquisa sobre o samba de roda no Recôncavo Baiano”, conta. Ela observa que, apesar das desigualdades e da violência de que são vítimas, as mulheres têm, cada vez mais, conquistado diferentes espaços – no ambiente do samba, inclusive.

“Percebo uma presença mais forte da mulher, não só como intérprete, mas também como autora, nesse universo que sempre foi muito machista. Belo Horizonte mesmo tem, atualmente, um número muito expressivo de compositoras”, diz.

Cinema

O Cine Humberto Mauro exibe, a partir de hoje e até o próximo 6 de abril, a Mostra Clássicas. Em seu terceiro ano de realização, a programação traz uma seleção abrangente de filmes dirigidos por mulheres.

Gerente do Cine Humberto Mauro, Vitor Miranda diz que o recorte, este ano, busca, em especial, lançar luz sobre trabalhos menos conhecidos de algumas realizadoras – como, por exemplo, “Quem ama não teme” (1950), de Ida Lupino, e “Um lugar qualquer” (2010), de Sofia Coppola. Ele ressalta, ainda, que a programação abarca uma grande variedade de gêneros, do terror ao drama, passando por comédias e filmes de guerra.

“A gente sempre tenta buscar um panorama amplo de filmes. Nas duas primeiras mostras, a gente quis apresentar produções mais conhecidas do grande público, títulos consagrados de diretoras. Este ano tem um foco maior em filmes menos conhecidos, e o grande norte desta edição, portanto, é a diversidade, a multiplicidade de olhares”, afirma.

A sessão de abertura é composta por curtas de Lotte Reiniger, precursora do cinema de animação, que retrabalhou contos de fadas e fábulas, como “Cinderela”, “João e Maria” e “A cigarra e a formiga”. 
 
Atriz Corinne Marchand, de chapéu, está ao lado de manequim de vitrine com vestido de noiva em cena do filme Cleo de 5 às 7

Corinne Marchand em 'Cléo de 5 às 7'

Reprodução
 

Haverá  sessões comentadas, com filmes que terão apenas uma exibição – “Cléo de 5 às 7”, de Agnès Varda, hoje, com comentários da atriz e cineasta Bianca Rolff; “India song”, de Marguerite Duras, em 23/3, com a participação da pesquisadora Cláudia Mesquita; e “Um divã em Nova York”, de Chantal Akerman, comentado pela pesquisadora Carla Maia, em 5 de abril.

“‘Um divã em Nova York’ é um filme pouquíssimo visto de Chantal Akerman, uma comédia romântica produzida em Hollywood. É uma obra sui generis, porque ela é uma cineasta muito fora do sistema, que segue uma linha bastante experimental”, diz Miranda.

Ele aponta outros destaques da Mostra Clássicas: a estreia de “Eneida”, documentário de Heloisa Passos, na próxima sexta (10/3); e a faixa Cinema Mineiro em Cartaz, com “A falta que me faz”, de Marília Rocha, em 15/3. A programação completa pode ser conferida no site da Fundação Clóvis Salgado.

Processos criativos

O Cine Santa Tereza, por sua vez, abriga até 26/3  a quarta edição da Mostra Diálogos pela Equidade, que, sob o tema “Mulheres plurais”, propõe uma discussão a respeito de como as mulheres têm ocupado espaço no cinema.

O ciclo exibe 33 filmes que traçam um panorama contemporâneo da produção de curtas e longas dirigidos por mulheres no Brasil. A curadoria enfoca as artistas mineiras, trazendo lançamentos e títulos ainda não exibidos em BH, além de várias sessões comentadas com diretoras.

O Cine Santa Tereza também recebe, hoje, às 19h, a Sessão Francofonia – Dia Internacional das Mulheres, com a exibição de “Sambizanga” (1972), da cineasta Sarah Maldoror (1929-2020), considerada a primeira mulher negra a fazer cinema na África, nos anos 1960. Os ingressos são gratuitos e podem ser retirados antecipadamente pelo site Sympla.

Do cinema para as artes cênicas, o público de BH poderá conferir, amanhã e na sexta, às 20h, no Teatro de Bolso do Sesc Palladium, o monólogo “Cora do Rio Vermelho”, idealizado e estrelado pela atriz Raquel Penner. Com dramaturgia de Leonardo Simões e direção de Isaac Bernat, a peça faz um passeio pela vida e a obra da poeta, contista e doceira Cora Coralina.

A montagem reúne textos e poemas que falam sobre a força feminina e a alma da mulher brasileira, além de propor uma relação de cumplicidade entre atriz e plateia. Ao reencontrar a obra da escritora goiana, Raquel percebeu que aqueles contos e poesias iam ao encontro de suas inquietações artísticas, e que, assim, serviriam de base para a montagem de seu primeiro monólogo.

A atriz diz que se trata de um trabalho “forte e delicado”, assim como a escrita da poeta. “Cora Coralina foi uma mulher múltipla e libertária. Removeu pedras e abriu caminhos para outras mulheres. Há 10 anos, tive meu primeiro encontro com ela, em uma exposição no CCBB-RJ. Fiquei encantada por aquela senhora do interior do Brasil que falava firme e cantado, fazia doces e escrevia poesia, celebrava a vida e a simplicidade”, afirma.

Mãe e filha

Outro espetáculo que marca o Dia Internacional da Mulher é a peça “Anjos”, do Grupo de Teatro Morro Encena, que cumpre curta temporada de hoje até sábado (11/3), no Teatro Marília. A peça narra de forma poética o reencontro de mãe e filha durante o período de férias escolares e propõe uma reflexão sobre o papel da mulher na sociedade. Serão duas apresentações diárias, às 14h30 e às 19h30.

Após cada sessão haverá uma roda de conversa com a temática “Violência doméstica e familiar contra a mulher e a banalização do feminicídio”. Os ingressos são gratuitos e podem ser retirados no site Sympla ou na bilheteria do teatro, a partir de duas horas antes das apresentações.

A peça é coordenada pelo diretor e dramaturgo Eid Ribeiro, com texto e direção de Herlen Romão e produção de Simone Silva. Para dar tom à narrativa, os poemas adaptados da obra da poeta portuguesa Florbela Espanca (1894-1930) contribuem com a atmosfera que envolve o espetáculo.

Saberes gastronômicos

A gastronomia também entra no circuito das atividades que marcam a data. O Circuito Gastronômico das Favelas presta homenagem a três cozinheiras da capital – Dona Dirce, do Alto Vera Cruz; Dona Lia, da Barragem Santa Lúcia; e Dona Marlene, do Taquaril. 

A homenagem se dá com o lançamento de vídeos em que elas compartilham suas histórias e saberes ligados à cultura alimentar tradicional. Eles estão disponíveis, a partir de hoje, no canal do YouTube da Casulo Cultura e no Instagram do Circuito Gastronômico de Favelas.

O Dia Internacional da Mulher reverbera também na seara da literatura, com o lançamento e sessão de autógrafos do romance “A ascensão de Alice”, de Sônia Gandra, hoje, às 19h, na Livraria Leitura do BH Shopping. A obra, segundo a autora, trata de sororidade e de lutas femininas, abarcando temas como a busca por reconhecimento profissional, a batalha das mulheres por espaço em uma sociedade machista e o preço da busca pela eterna juventude.