Canisso, baixista do Raimundos, toca baixo

Canisso durante apresentação do Raimundos no Rock in Rio, em 2019

Mauro Pimentel/AFP


Canisso, baixista da banda de punk rock Raimundos, morreu na segunda-feira (13/3), aos 57 anos. A informação foi divulgada pelo filho do artista, Pedro Toscano,  no Instagram. De acordo com o comunicado, o músico, cujo nome de nascimento era José Henrique Campos Pereira, sofreu uma queda em casa e foi levado ao hospital, mas não resistiu aos ferimentos.

"Luto. Sempre foi e sempre será meu herói. Eu não tenho palavras pra descrever o que estou sentindo, a sensação de que eu nunca terminei de restaurar o carro dele, mas mesmo assim ele se orgulhava muito de mim. A sensação que eu vou chegar em casa e não vou ver mais ele. Ele sempre gostou de fazer as zoeiras dele, está em um lugar muito melhor agora, tocando seu lendário baixo", disse Pedro.

Em agosto do ano passado, Canisso passou por pequena intervenção cirúrgica que o levou a cancelar dois shows dos Raimundos. Contudo, já havia se recuperado e a banda estava cumprindo agenda normalmente. 

A próxima apresentação, inclusive, estava marcada para 25 de março, em Cláudio, na Região Oeste de Minas Gerais.
 
Nina Toscano, filha de Canisso, falou sobre o pai nas redes sociais: “Obrigada por ter me guiado nesta vida, vou levar seus ensinamentos pro resto da minha vida. Sou quem sou por sua causa, não podia pedir um pai  melhor.”.

Lelo Zaneti: "Pessoa muito especial"

Músicos mineiros lamentaram a morte de Canisso. O baixista do Skank, Lelo Zaneti, lembrou a criatividade da banda.

“Muito triste essa notícia. Nossos sentimentos a toda família, aos amigos e colegas. Ele pertence à cena musical dos anos 1990, de muita criatividade e boas misturas das culturas regional brasileira e universal.  Mistura à qual o Skank também pertence. Somos bandas contemporâneas muito ativas, tanto na estrada quanto na produção musical. Uma pena. Canisso era uma pessoa muito especial, inteligente e que nos deixa muito cedo”, disse.
 

PJ: "Linhas de baixo muito fortes"

PJ, baixista da banda Jota Quest,  afirmou estar chocado, pois havia conversado há pouco tempo com Canisso.

“Essas mortes repentinas são sempre assustadoras. Acho que o Canisso e os Raimundos são os músicos mais influentes do rock nacional. Canisso era um cara carismático e tinha uma presença muito forte, além de linhas de baixo muito legais. Ffez parte de uma das maiores bandas do Brasil, os Raimundos. Muito triste”.

Ricardo Koctus: "Canisso era o rock"

Ricardo Koctus, baixista do Pato Fu,  lamentou a morte do músico. E revelou ser fã dos Raimundos. 

“Canisso fez parte de uma das bandas mais legais do rock brasileiro. Sou muito fã. Eu até tinha uma fita demo deles. De um lado era Raimundos e do outro, se  não me engano, Urso do Cabelo Duro. Muito triste com esse momento. Canisso era o rock. Ele permanecerá no rock”, disse.

O contrabaixista, arranjador e compositor Adriano Campagnani lembrou como Canisso expressava bom humor em suas linhas de baixo.

“Com linhas de baixo originais e recheadas de bom humor, ele foi a mola mestra da banda por anos e responsável por grande parte do sucesso do grupo. Uma grande perda para o rock brasileiro”, afirmou.
 
Canisso, Fred, Rodolfo e Digão, da banda Raimundos, sorriem para a câmera

Raimundos nos tempos do sucesso: Canisso, Fred, Rodolfo e Digão

Reprodução

Começo como roadie

Natural de Brasília, Canisso começou a trabalhar como roadie de bandas locais. Aprendeu a tocar guitarra e, durante a montagem de um festival de música na escola onde estudava, conheceu Rodolfo Abrantes e  Digão, com quem fundou os Raimundos em 1987. O baterista Fred seria incorporado ao trio pouco depois.

Influenciado  por Dead Kennedys, Suicidal Tendencies e Ramones, o grupo tinha como característica compor canções simples (poucas com mais de quatro acordes), rápidas e agressivas, assim como o punk exigia. Em várias músicas, os Raimundos ousaram ao experimentar a sujeira do punk rock com elementos do forró, como a sonoridade do triângulo e a levada rítmica do baião.

Em 1995, Herbert Vianna, dos Paralamas do Sucesso, descreveu os Raimundos como “a banda mais interessante do momento”, o que garantiu ao quarteto um convite para o programa "Jô Soares onze e meia". Eles Contaram lá que o nome da banda homenageava o grupo norte-americano Ramones. Uma paródia, porque, no começo, os rapazes  brasileiros faziam covers dos americanos.

Com letras irreverentes – que, certamente, seriam canceladas caso fossem lançadas nos dias de hoje –, os Raimundos fizeram sucesso estrondoso nas décadas de 1990 e 2000. 

O primeiro álbum, homônimo à banda, contava com faixas que se tornaram hits, como "Puteiro em João Pessoa", "Palhas do coqueiro", "MM's" e "Selim". O disco foi lançado em 1994 pelo selo Banguela Records, dos Titãs.

No ano seguinte, o grupo já estava sob a alçada da Warner Records . Lançou “Lavô tá novo”, que contém as faixas "O pão da minha prima", "I saw you saying (That you say that you saw)" e "Pitando no kombão". Canisso era coautor desta última.

"Lavô tá novo" vendeu mais do que o álbum de estreia dos Raimundos, o que motivou a Warner a mandar o quarteto para Los Angeles no intuito de gravar "Lapadas do povo" (1997). Porém,  esse álbum não foi tão bem recebido pelo público e pela crítica.
 
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"Mulher de fases"

Em compensação, “Só no forevis”, disco de 1999, lançado também pela Warner, vendeu 650 mil cópias. Estão lá algumas das canções mais conhecidas dos Raimundos, como “Mulher de fases”, “A mais pedida” e “Me lambe”.

O primeiro revés da banda ocorreu em 2001, quando o vocalista Rodolfo se converteu ao cristianismo e saiu do grupo. Digão, que antes era guitarrista e vocal de apoio, assumiu o vocal, deixando a voz de apoio para Canisso.

“A amizade que nós tínhamos era amizade de irmão, e ele (Rodolfo) renegou isso. Eu não guardo mágoa. Sei que, no caso dele, deve ter passado por algum problema sério para resolver exterminar a persona que ele era e renascer em Cristo", afirmou Canisso em entrevista ao canal de YouTube "Minha Brasília", em 2017.

Com a saída de Rodolfo, os Raimundos passaram por momentos de dificuldade e ostracismo. “A gente traçou uma estratégia para recolocar a banda na cena”, lembrou Canisso a Danilo Gentili, no “The noite”, programa do SBT/Alterosa, em 2014.

“A primeira turnê que a gente fez (depois da ruptura com o Rodolfo), chamamos de  turnê motel. A gente ficava nos motéis porque era mais barato. Aí imagina a gente, com 40 e poucos anos, tudo velho, cair na estrada de novo e começar do zero, só pegando pedreira, viajando os quatro músicos e um único técnico (de som)”, emendou Canisso.

A estratégia foi bem-sucedida. Ainda em 2014, a banda foi convidada a cantar com CPM 22 e Detonautas  no programa “Música boa MTV”. Também foi uma das atrações do Planeta Brasil.

Em 2016, eles gravaram show acústico no Teatro Positivo, em Curitiba, tendo como convidados Ivete Sangalo, Dinho Ouro Preto e o guitarrista do Charlie Brown Jr., Marcão. Em 2018, foram atração do Festival João Rock e, em 2019, dividiram o Palco Mundo do Rock in Rio com CPM 22.