A pequena Águas de São Jacinto, no interior de Minas Gerais, virou manchete depois da invasão de um batalhão de jornalistas, no meio da semana passada. Todos em busca de provas para livrar Marê da cadeia.





A moça, que era noiva de Gaspar (Thiago Lacerda), filho do prefeito, se apaixonou pelo jovem médico Orlando (Diogo Almeida). Foi acusada injustamente da morte do pai, o empresário Leonel Rubião (Paulo Gorgulho). Na cela, descobriu-se grávida de Orlando. Durante uma fuga frustrada, a criança nasceu e foi deixada na porta da Irmandade dos Clérigos de São Jacinto. O bebê ganhou o nome de Marcelino (Levi Asaf).

Muita coisa dessa história só será revelada a partir de segunda-feira (20/3), com a estreia de “Amor perfeito”, novela de Duca Rachid, a substituta de “Mar do sertão” na faixa das 18h da Globo.

A “invasão” dos jornalistas à cidade cenográfica foi acompanhada por Duca Rachid, Júlio Fischer e Elísio Jr., que dividem a autoria da novela, e o diretor artístico André Câmara. Chamavam a atenção detalhes da cidadezinha, como o Grande Hotel Budapeste, a redação do jornal e a casa do prefeito Anselmo Evaristo (Paulo Betti) e de Cândida (Zezé Polessa).




 

Os novelistas Elisio Lopes Jr., Duca Rachid e Júlio Fischer na recepção do hotel de Águas de São Jacinto

(foto: Paulo Belote/ Globo)
 

Entre ruelas e casarões, Duca Rachid não escondia a emoção ao ver os cenários prontos.  “Está muito mais bonito do que eu imaginava”, disse a autora, encantada com a riqueza de detalhes da loja A Brasileira Elegante, cenário de Wanda (Juliana Alves), mulher à frente de seu tempo, segundo Elísio Jr.

“A moda terá influência muito grande no pensamento das mulheres. O cenário traz um pouco do conflito de algumas personagens com o machismo”, adianta.
 

Cidade inspirada em Caxambu 

A fonte de águas termais e medicinais, inspirada em Caxambu, é dedicada a São Jacinto. Duca é devota de São Francisco, mas escolheu o santo de origem polonesa porque ele tem relação com as águas.

O projeto da novela é antigo. A sinopse foi escrita por ela e Júlio Fischer em 2003, quando trabalhavam em “O Sítio do Picapau Amarelo”.

“Claro que atualizamos, conceituamos, aprofundamos, tratamos de questões atuais, como machismo, a ausência do pai e a diversidade”, comenta.





A origem de “Amor perfeito” vem de “Marcelino pão e vinho”, longa sobre o menino órfão que teve duas versões no cinema, em 1955 e 2011. “É o primeiro filme que vi na vida, com 6, 7 anos. Fui com minha 'vó', foi muito marcante para mim”, rememora a autora.

"Amor perfeito" conta a história de Orlando (Diogo Almeida) e Marê (Camila Queiroz), que voltam a se encontrar após separação traumática no passado

(foto: João Miguel Júnior/Globo)

Apagamento da elite negra

Nas pesquisas sobre a questão racial, um dos temas do folhetim, Duca Rachid e equipe descobriram a elite negra com expertise e excelência “que sempre existiu e ainda existe”, segundo ela,  mas foi “apagada” pela narrativa hegemônica do Sul e do Sudeste.

“Tentamos recuperar esse Brasil, fazer uma novela brasileira. Assim como a primeira versão de 'Marcelino pão e vinho' falava da revolução mexicana e a segunda, da Guerra Civil espanhola, tentamos trazer essa história para o Brasil”, diz Duca.





 A novelista fala da grata surpresa de trabalhar pela primeira vez com Chico Pelúcio, que já conhecia do Grupo Galpão, em BH. Ela também conhecia outro mineiro, o ator Glicério do Rosário.
 

O mineiro Chico Pelúcio, ator do Grupo Galpão, deixou o bigode crescer para interpretar o padre Diógenes

(foto: Manoella Mello/Globo)
 

“Gosto de trabalhar com pessoas que conheço, novela é estiva tão grande... Você tem sempre as melhores intenções com os atores. Mas, às vezes, as coisas não dão certo – depende muito de como o público recebe –, aí você tem de fazer ajustes”, pondera.
 

Duca acredita no pacto entre autor e elenco. “Estamos juntos e vamos assumir o risco juntos. Isso é muito importante.”

Mas, afinal, existe amor perfeito? “Amor perfeito é aquele que acolhe todas as imperfeições e abraça a diversidade”, define a novelista.




 

Levi Asaf (à esquerda), o astro mirim da novela que interpreta Marcelino, com os jovens atores Ygor Marçal, Valentina Melleu, Davi Queiroz e Vitória Pabst

(foto: Paulo Belote/Globo)
 

Tarimbados no palco, mineiros apostam na telinha

“Amor perfeito” é nova estreia para atores mineiros. Será a primeira novela de Chico Pelúcio, do Grupo Galpão, e de Beto Militani, do Grupo Giramundo. Já Glicério do Rosário é quase veterano: este será seu quinto folhetim, desde “Cordel encantado” (2011).

Chico viverá o ranzinza padre Diógenes; Beto, o delegado Albuquerque; e Glicério, o jornalista Turíbio Fonseca. O policial e o repórter são vilões da trama.
 
Glicério Rosário considera seu personagem – “precursor das fake news” – um desafio, pois até agora interpretou homens éticos. “Turíbio é um crápula. Ele é tudo o que aprendemos hoje sobre masculinidade tóxica. Será muito detestado”, prevê.
 

Casado com Elza (Raquel Karro), Turíbio, vivido por Glicério do Rosário, é um 'crápula', avisa o ator mineiro

(foto: João Miguel Júnior/Globo)
 

Chico Pelúcio, que participou das séries “A cura” e “Sob pressão”, na Globo, não esconde certa insegurança ao construir o personagem. Mas como o núcleo da irmandade dos padres é mais leve, ele diz que está se divertindo.





“Trabalho com Tony Tornado, Tonico Pereira, Babu Santana, Allan Souza e Bernardo Berro”, cita, elogiando os colegas.

“É uma delícia. Experiência nova e superbacana, principalmente pela troca com esses atores. Tonico Pereira tem 60 anos de televisão”, comenta.

“Padre Diógenes adora cinema, ouvir radionovela. Apesar da ranzinzice, vai trazer um sonho inspirado no 'Cinema Paradiso'”, antecipa Chico, referindo-se ao filme de Giuseppe Tornatore. “Aliás este bigode aqui é homenagem ao projetista do cinema, o Alfredo”.

Os três mineiros construíram carreiras no teatro, mas TV é diferente. Só Beto Militani não teve experiência na televisão, embora faça parte do elenco do filme “Batismo de sangue” (2007), dirigido por Helvécio Ratton.





“Não é nada do que imaginei. Está sendo maravilhoso, imaginei que seria muito mais difícil, mais complexo. O universo é muito diferente daquele com o qual estamos acostumados no teatro”, diz.  

Chico Pelúcio pergunta a Beto se ele pensava esperar tanto tempo para gravar. A resposta é bem-humorada: “O que (Marcello) Mastroianni disse quando completou 50 anos de cinema? Quarenta e nove anos esperando, um ano gravando.”
 

Beto Militani, ator do Grupo Giramundo, é o delegado Albuquerque em 'Amor perfeito'

(foto: Paulo Belote/Globo)
 

Glicério tranquiliza o colega do Galpão. “O teatro oferece tudo para a gente. É uma questão de virar a chavinha, e o Chico já virou essa chavinha”, diz. “Deus te ouça”, comenta Pelúcio.

Não foi fácil para Glicério “virar a chavinha” em sua primeira novela, “Cordel encantado”. 

“Viemos com o registro do teatro, com aquela potência toda, interna e externa. Na TV, vamos aprendendo a ser mais potência interna. Os contornos são mais sutis”, ensina.





Para compor seu personagem conservador e retrógrado, Glicério buscou inspiração em sua própria experiência com o machismo. “Principalmente dentro de minha casa. Meu pai batia em minha mãe”.
 
Mocinhos ou vilões – o que os atores preferem? “Ambos são bons, mas neste momento prefiro um crápula nesse exercício de atuação e matiz que tenho feito na TV”, responde Glicério.

“Reza a lenda que fazer vilão é melhor que mocinho. Uma coisa interessante: companhias de teatro de antigamente reservavam papéis de mocinho e mocinha para filhas e filhos dos prefeitos para angariar patrocínio. Eram papéis mais fáceis de fazer”, observa Chico Pelúcio.
 
“AMOR PERFEITO”
Novela estreia na segunda-feira (20/3), na faixa das 18h, na TV Globo. Capítulos vão ao ar de segunda a sábado

*O repórter viajou a convite da Rede Globo

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