Anunciado como o maior festival de hip hop já realizado em Minas Gerais, o Rap Game debuta na Esplanada do Mineirão, neste sábado (25/3), com estrutura e números que, de fato, impressionam. Mais de 25 artistas de projeção nacional e 16 expoentes locais se apresentam ao longo de todo o dia, a partir das 10h, em três palcos montados na área que circunda o estádio na Pampulha.
A escalação conta com L7nnon, Yunk Vino, Poze do Rodo, Orochi, Chefin, Bin, BK, Hyperanhas, Djonga, Recayde Mob, Tasha e Tracie, MV Bill, Sidoka, Veigh, Raffa Moreira, Major RD, MC Marechal, Luccas Carlos, DJ Zeu, Clara Lima, Hutter e Das Quebradas com participação de Sandrão RZO, entre outros.
Um palco dedicado exclusivamente a artistas mineiros, batizado Game Trends, vai receber as apresentações de OG Capitu, Mac Richa, Weeze Cooker, Sadoff, Oliver, Vitor Akin, Sarah Sampp, Zampi 29, Lowz, Jovem Cae, LocDog, Lua Zanella, LS O Cria, Kauê Machado, 1Berto e MC B2. O Rap Game também conta com espaços interativos, como a Game Zone, o Museu do Hip Hop e uma área de grafite.
Cultura de rua mostra sua força
O DJ Zeu, um dos organizadores do evento, diz que a realização de um festival desse porte reflete a pujança do atual cenário da cultura de rua em Belo Horizonte e em Minas Gerais. Ele conta que a ideia do Rap Game vem sendo gestada desde 2016 e que saiu do papel para efetivamente começar a tomar forma em meados do ano passado.
“Eu me associei ao (produtor) Romeu Marques, um camarada que sempre entregou grandes eventos de música eletrônica para a cidade, porque eu tinha vontade de também ter em Belo Horizonte uma festa grande dedicada ao hip hop. A gente vinha trocando ideias a respeito há mais de cinco anos. Passada a pandemia, sentimos que era o momento”, diz.
Há 20 anos marcando presença na cena hip hop da cidade, ele considera que Minas Gerais é, atualmente, o grande polo nacional desse movimento. DJ Zeu afirma que, quando o assunto é rap e gêneros afins, como o funk e o trap, que o festival também abarca, o melhor “produto humano do Brasil” está concentrado no estado.
• Veja Djonga no clipe 'Conversa com uma menina branca':
“A gente tem nomes como Djonga e Sidoka, que já conquistaram o país, e daqui vai sair muita coisa grande ainda, sobretudo a partir de agora, com o Rap Game chegando para impulsionar os novos talentos”, afirma.
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Em sua opinião, BH é cidade teste do Brasil, com um público exigente, que não aceita qualquer coisa quando o assunto é a produção artística.
“Aqui a gente tem a Classics Hip Hop, que é considerada a melhor festa do gênero no país, e tem o Duelo de MCs, que é reconhecida como a melhor batalha de rima, quer dizer, é como o pão de queijo, a referência que a gente tem é muito alta”, diz, acrescentando que esse nível de excelência acaba formando novas gerações que já chegam com um status elevado.
“É um cenário que puxa os artistas. Eles têm que ser bons para conquistar seu espaço. A ‘mina’ quer fazer sucesso, vai ter que trabalhar, vai ter que estudar, quer dizer, entra aí até uma questão de educação mesmo, de leitura, porque se ela não fizer isso, não se dedicar, não vai conseguir criar um conteúdo rico”, comenta.
Mulheres no palco
Quando fala em “mina”, ele chama a atenção para a expressiva presença de artistas mulheres produzindo e se destacando dentro dos gêneros musicais que o Rap Game contempla. Com Hyperanhas, Tasha e Tracie, Clara Lima, OG Capitu e Sarah Sampp, elas também estão representadas na programação do festival – que inclui, ainda, Lua Zanella, uma artista travesti.
DJ Zeu assente que houve, já no desenho inicial do evento, essa preocupação com a representatividade. “A gente quer chegar num estágio em que o festival, em possíveis edições futuras, contemple, por si só, uma diversidade de pessoas, não só entre os artistas, mas também na plateia. O hip hop já foi, infelizmente, uma cultura de muito machismo e muita homofobia, e estamos empenhados em descontruir isso.”
Sobre a programação como um todo, ele diz que a seleção dos artistas foi orientada por um conceito. “A gente quer respeitar a história do hip hop. Óbvio que fomos atrás da galera que está batendo milhões de visualizações, mas não podemos nos esquecer de um panorama geral, por isso trazemos, por exemplo, MV Bill e Sandrão RZO. Não estamos só no mainstream, estamos no conceito, respeitando a história dessas pessoas”, aponta.
Ele explica que a escolha dos nomes que vão passar pelo palco Game Trends contou com o suporte da Fábrica Criativa, incubadora de artistas que atua há cinco anos em Belo Horizonte, cuidando do posicionamento e da venda de shows de expoentes locais.
'Isso aí (o crescimento do rap), na minha visão, é a periferia fazendo música, o que praticamente não acontecia nos anos 1980 e 1990. É a música do povo preto, do povo da periferia, que é a maior parte deste país e que, antes, não tinha acesso aos meios de produção. Hoje em dia, qualquer garoto consegue fazer tudo num computador velho de R$ 500'
DJ Zeu, organizador do festival
Rap cresce no Spotify
Estudo publicado no ano passado pela Revista Observatório, editada pelo Instituto Itaú Cultural, aponta que o rap teve um salto expressivo, de 200%, na lista das 10 músicas mais ouvidas do Spotify, na comparação entre janeiro de 2022 e janeiro de 2021.
“Isso aí, na minha visão, é a periferia fazendo música, o que praticamente não acontecia nos anos 1980 e 1990. É a música do povo preto, do povo da periferia, que é a maior parte deste país e que, antes, não tinha acesso aos meios de produção. Hoje em dia, qualquer garoto consegue fazer tudo num computador velho de R$ 500”, diz o DJ Zeu.
• Veja o clipe 'Eu fiz o jogo virar', com Poze do Rodo:
Ele observa que, durante muito tempo, o funk e o rap foram gêneros marginalizados e que, atualmente, são consumidos não só na favela, mas também pelas classes mais abastadas. “Agora é bonito, está na TV, cabe em tudo quanto é lugar, mas isso é agora. Até chegarmos aqui, muita gente tomou tapa na cara, muita gente morreu. O Rap Game chega para amplificar a voz da periferia e dar vez aos artistas emergentes”, afirma.
'Em BH, você tem a Mac Julia, tem a OG Capitu, então é legal, porque a 'mina' crescendo puxa as outras. Isso é importante, porque ainda é um terreno predominantemente masculino'
Nathalia Fischer, da dupla Hyperanhas
Hyperaranhas: representatividade feminina
Nathalia Fischer, que ao lado de Andressinha compõe a dupla Hyperanhas, formada em São Paulo em 2019, também considera o atual cenário do rap, do funk e do trap muito potente. Ela acredita que esse movimento de expansão tenha a ver com uma mudança, ocorrida ao longo dos últimos anos, na forma como as pessoas se relacionam com a música.
“Elas não querem só ouvir, elas querem se sentir representadas, e a maior parte do Brasil é periferia. A gente carrega uma mensagem, fala do poder feminino, fala em acreditar nos sonhos para conseguir vencer, e as letras de trap, de funk e de rap, no geral, também trazem esse conteúdo, trazem a experiência de vida de quem escreve, e aí você cai de novo na questão da representatividade”, diz.
Ela também enxerga uma ampliação do espaço ocupado pelas mulheres na produção de tais gêneros, mas pondera que ainda é tímido, se comparado à presença masculina.
“Em BH, você tem a Mac Julia, tem a OG Capitu, então é legal, porque a ‘mina’ crescendo puxa as outras. Isso é importante, porque ainda é um terreno predominantemente masculino”, aponta.
Nathalia diz que ficou muito feliz com o convite para participar do Rap Game justamente por poder firmar a presença feminina no universo do trap – gênero a que a Hyperanhas se dedica. “E também porque o público de Belo Horizonte sempre recepciona a gente da melhor maneira possível, é uma galera muito quente, muito calorosa, que canta junto”, sublinha.
Break, slam, grafite e rap
Talento do rap em Belo Horizonte, OG Capitu, que vai se apresentar no palco Game Trends, diz que sua relação com a cultura hip hop vem desde a infância, quando dançava break e grafitava os muros da cidade.
Ela conta que, posteriormente, começou a participar de slams e de rodas de poesia marginal, antes de começar a experimentar rimar sobre as batidas do rap.
“Achei muito gratificante o convite para participar desse festival, porque aí a gente vê que o trabalho está sendo valorizado. Isso me dá um gás para continuar realizando as coisas, persistindo”, diz. Capitu tem participado de muitos eventos na cidade e em outros estados, alguns marcantes em sua incipiente trajetória.
“No ano passado, participei, em São Paulo, do Festival Cena, o maior dedicado ao trap no Brasil. Fui pega de surpresa quando me chamaram. Foi muito marcante. Outro que considero muito importante foi o Fábrica Hits, em 2021, porque foi o primeiro grande evento de que participei, então agregou muito, me trouxe experiência”, comenta.
Ela avisa que o público que for acompanhar sua apresentação no Rap Game pode esperar muita raça e muita performance.
“Estou ensaiando muito com meus coreógrafos, e o que eu levo para o palco é trap de verdade, para bater cabeça. Vou, inclusive, aproveitar para lançar ‘Sul-americana’, que é uma música nova”, adianta.
FESTIVAL RAP GAME
• Neste sábado (25/3), a partir das 10h, na Esplanada do Mineirão (Av. Antônio Abrahão Caram, 1.001, Pampulha).
• Ingressos variando de R$ 110 (meia-entrada solidária para pista) a R$ 680 (inteira para homens no camarote open bar).
• Classificação: Pista - 12 a 14 anos (acompanhados pelos pais). Front Stage - 14 anos. Camarote - 18 anos.
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