Um acordo entre a Funarte-MG e a UFMG permitiu a restauração da obra e a pesquisa para identificação dos objetos

(foto: Pedro Nacif/Divulgação)

Depois de um longo périplo, o Miniteatro de Óperas finalmente pode ser apreciado pelo público de Belo Horizonte. Trata-se de um dedicado e minucioso trabalho realizado pelo tenor Carlos José Villar, ao longo de 15 anos, entre as décadas de 1950 e 1960, que agora está em exposição permanente na Funarte-MG.





O projeto de restauração da obra e de pesquisa para a exibição foi viabilizado por meio de uma parceria entre a Funarte-MG e a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). O Miniteatro é composto de mais de 700 peças, entre cenários, bonecos, mobiliário e objetos cênicos, além de uma maquete que reproduz o Theatro Municipal do Rio de Janeiro.

A obra, construída em homenagem ao maestro e compositor Carlos Gomes, reproduz cenários de espetáculos líricos, com oito óperas: “Tosca”, de Giacomo Puccini; “Aída”, “O trovador”, “Rigoletto” e “La Traviata”, de Giuseppe Verdi; “Fausto”, de Charles Gounod; “Carmen”, de Georges Bizet; e “Mefistofele”, de Arrigo Boïto.

Apresentações caseiras

Na plateia e nos camarotes, bonecos com figurinos de época detalhados representam os espectadores. No fosso da orquestra, eles se transformam em maestro e músicos, com seus respectivos instrumentos. Villar costumava, com a ajuda de um amigo, apresentar em seu apartamento no Rio de Janeiro, onde o Miniteatro foi construído, as “óperas” com música tocada na vitrola e manipulação dos personagens e cenários.





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Após a morte do tenor, sua família doou o Miniteatro, nos anos 1980, ao projeto Memória das Artes Cênicas, da unidade carioca da Funarte. Administradora cultural da Funarte-MG responsável pelo projeto, Daniela Meira conta que, em 2010, a obra veio para Belo Horizonte. Ela diz que a caixa cênica foi montada, mas todo o restante do material que compõe o Miniteatro permaneceu guardado.

“É um acervo bem completo, porque cada ópera tem seu cenário, seus personagens. A gente sentia, ao longo dos anos, a necessidade de fazer um restauro, que só foi possível, por uma questão de recursos, em 2020, a partir do Termo de Execução Descentralizado (firmado entre a Funarte-MG e a UFMG)”, aponta. As peças, que possuem dimensões variadas, foram restauradas entre 2020 e 2021 por uma equipe coordenada pela conservadora Maria Tereza Dantas Moura.

Curadoria da exposição

Ela é quem assina a curadoria da exposição, juntamente com a professora Rita Lages Rodrigues, da UFMG, que coordenou a equipe de pesquisa para identificação de cada item que compõe o Miniteatro. “A gente não tinha noção do tamanho dessa obra, porque ficava só uma parte exposta. Foram mais de 700 peças restauradas. Também não tínhamos ideia de qual cenário, boneco ou figurino pertencia a qual ópera”, diz Daniela.





Ela observa que apenas 50% de todo o acervo que compõe o Miniteatro está exposto atualmente na Funarte. “O principal elemento é a caixa cênica, o teatro com a cortina, onde está retratada a apresentação de uma ópera, com o público e os personagens todos. Tem também outros nichos, como um gaveteiro, que o público pode manipular. A ideia é ir periodicamente trocando esse cenário, mostrando aos poucos o que ainda está guardado”, diz.

Rita Lages Rodrigues recorda que costumava ir à Funarte, onde via a caixa cênica montada e não entendia exatamente do que se tratava. “Esse acervo caiu de paraquedas na Funarte-MG. A equipe, sem ter a formação necessária, mas ciente do valor que tinha, montou, a partir de algumas fotos do Centro de Documentação da Funarte do Rio de Janeiro, a caixa cênica. Aquilo ficou lá por alguns anos, mas sem nenhuma informação. Eu via e ficava intrigada”, conta.

Referência do conjunto

Ela observa que o trabalho da equipe coordenada por Maria Tereza Dantas Moura foi fundamental para o desenvolvimento do processo que resultou na exposição da obra. “Eles fizeram um relatório indicando que vários dos objetos estavam dispersos em caixas, correndo o risco do que a gente chama de desassociação, que é você perder a referência do conjunto. O trabalho de restauração e identificação das peças foi muito minucioso”, diz.





Paralelamente, foi desenvolvido, segundo a curadora, um trabalho de pesquisa sobre as óperas, conduzido por Cláudia Malta, diretora de produção artística da Fundação Clóvis Salgado. “Ela fez a identificação de grande parte das óperas, dos bonecos e dos cenários que pertenciam a cada uma. Mas é uma identificação parcial. Espero que outras pessoas continuem essa pesquisa sobre o Miniteatro, porque é de uma riqueza absoluta”, ressalta.

Rita salienta que é um processo de pesquisa que está em aberto. “Tem algumas informações sobre o próprio Carlos Villar, por exemplo, que a gente não teve como coletar agora, mas, a partir do momento em que a gente constrói uma narrativa curatorial, com um eixo histórico, e promove a extroversão dessa obra, esse passa a ser um trabalho que segue”, aponta.

O trabalho de pesquisa identificou que o Miniteatro reproduz a montagem de ao menos oito óperas mundialmente famosas 

(foto: Pedro Nacif/Divulgação)

Adaptações necessárias

A partir da restauração e da identificação dos elementos que compõem o Miniteatro, o trabalho de curadoria que ela desenvolveu abarcou diversos aspectos, desde o design gráfico da mostra, passando pela iluminação, até o campo da museologia, para se pensar as adaptações necessárias para que a Funarte-MG pudesse abrigar a obra.





“Essa é uma questão central, porque a Funarte não é constituída de espaços para exposição de artes visuais de longa duração. Normalmente, passam por lá exposições mais curtas, então, para receber o Miniteatro de Óperas, era necessária uma modificação do próprio espaço da Funarte, que até este momento não tinha essa vocação”, observa.

Daniela Meira considera que a equipe de Rita foi muito feliz na realização do projeto expositivo, com todo o mobiliário e a organização do espaço, de forma a mostrar no Galpão 1, onde o Miniteatro está, o máximo possível de elementos que o compõem. “A gente não podia abrir mão de outros espaços, então o que eles fizeram foi montar a exposição propriamente dita de forma a preservar as peças, porque tem a ver com conservação de patrimônio”, diz.

Universos distintos

Rita chama a atenção para o fato de que o Miniteatro aproxima dois universos aparentemente distintos, que são o da ópera e o do teatro de bonecos. Trata-se de uma ponte entre o erudito e o popular, bem como entre o artesanal e o industrial, já que Carlos Villar comprava bonecos de plástico e de outros materiais prontos e os customizava, criando adereços e indumentárias, conforme explica a curadora.





Ela aponta que o tenor não era um artista visual, seu ofício não se relacionava objetivamente com essa esfera, mas ele dedicou uma parte de sua vida a essa obra. “Isso é muito interessante. Desde o início, a gente faz uma relação entre ele e Raimundo Machado, criador do Presépio do Pipiripau. São trabalhos que passam pela dedicação do artífice a um determinado objeto – ou, no caso, a vários objetos”, afirma.

MINITEATRO DE ÓPERAS, DE CARLOS VILLAR
• Exposição permanente, em cartaz na Funarte-MG
• (Rua Januária, 68, Centro), com horários de visitação gratuita de terça a sexta-feira, das 10h às 18h, e aos sábados, das 13h às 19h

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