Que levante o primeiro crucifixo quem nunca se sentiu explorado pelo próprio chefe. No caso de R. M. Renfield, o assistente de Drácula que devora insetos, o drama vai muito além de um conflito de escritório.
O pobre Renfield é controlado psiquicamente pelo vampiro. Em troca da vida eterna, Renfield, criado por Bram Stoker no romance de 1897 – monumento do terror gótico várias vezes encarnado no cinema –, se dedica irrestritamente ao dentuço.
Em “Renfield – Dando o sangue pelo chefe”, o ator da vez é Nicholas Hoult, conhecido por filmes como “O menu”, “X-Men” e a série “The great”. Ele se junta ao grupo composto por Alexander Granach, do “Nosferatu” de 1922, Dwight Fryer, do “Drácula” de 1931, Tom Waits, do “Drácula” de 1992, e Peter MacNicol, de “Drácula – Morto, mas feliz”, de 1994.
'Quase sequência' à moda do século 21
A produção, segundo o diretor Chris McKay, é uma “quase sequência” do filme com Fryer e Bela Lugosi. Mas desta vez Renfield é o protagonista. Drácula, vivido por Nicolas Cage (que já havia interpretado uma criatura como esta em “Um estranho vampiro”, de 1988), persegue seu familiar. Esta é a lenda supersticiosa em que um animal ou pessoa viva serve de assistente a espíritos e bruxas.Após décadas, o servo consegue se libertar do chefe e luta por sua autonomia. Renfield vai parar na cidade de Nova Orleans, onde seu caminho se cruza com o de Rebecca (Awkwafina), policial que quer prender a máfia local.
A trama fica ainda mais rocambolesca quando o protagonista se vê num enrosco com as gangues criminosas da cidade. Enquanto isso, ele frequenta um grupo de apoio de pessoas que sofrem nas mãos de narcisistas.
Embora não seja um CEO de Linkedin, Drácula é uma figura da nobreza decadente que precisa subjugar o seu familiar. Após o sucesso de “Crepúsculo” e “The vampire diaries”, em que o vampiro não é um predador, em “Renfield” ele toma este papel, num movimento semelhante ao da série “Entrevista com o vampiro”, baseada no livro de Anne Rice.
“Renfield”, portanto, não é apenas um filme de terror, mas também uma comédia colorida que trata de relações hierárquicas – além, claro, de ter várias cenas de ação coreografadas como num videoclipe. O ambiente é conhecido pelo diretor McKay, que também comandou “Lego Batman” (2017), sátira animada do vigilante da DC, e episódios da série em stop-motion “Frango Robô”.
“A história sobre a codependência me pareceu original”, diz McKay. “O terror tem o potencial de trabalhar com metáforas. George Romero, em 'Madrugada dos mortos', fala sobre o consumismo ao mesmo tempo em que é hilário. É um filme de terror nojento, claro, mas também é muito engraçado. O choque e a risada não estão tão distantes entre si. O terror e a comédia se alinham no trabalho de grandes diretores.”
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Aposta da Universal
“Renfield” tem função importante para a Universal Pictures. O longa é o mais novo empenho do estúdio para manter ativo o catálogo de monstros que se tornaram peças fundamentais do cinema de terror. “Drácula”, de 1931, inaugurou a leva também integrada por Frankenstein, Lobisomem, Múmia e Homem Invisível.Para seguir os passos da Marvel, a Universal inaugurou em 2017 o universo compartilhado “Dark universe”, ou universo sombrio, no qual o remake “A múmia”, com Tom Cruise, seria o capítulo inicial. Entretanto, a produção foi um fiasco de público e crítica, tornando-se o único da carreira do astro. A iniciativa do estúdio, portanto, foi parar na cripta.
Mas em 2020, pouco antes da pandemia, o remake “O homem invisível”, com Elisabeth Moss, teve desempenho oposto ao de “A múmia”. A produção caiu no gosto do público ao falar sobre outro assunto dos dias atuais – gaslighting, a manipulação psicológica normalmente infligida a mulheres por homens.
A Universal tem agora duas refilmagens em produção, uma do Lobisomem, com Ryan Gosling, e outra de “O templo do pavor” (1956). Para McKay, são criaturas incompreendidas e por isso até hoje cativam o público.
Renfield pode não ser literalmente um monstro, mas vive uma situação bastante real, diz o diretor. “Ele tem um ambiente de trabalho tóxico e não concorda mais com a moral do chefe. Drácula quer fazer de tudo para mantê-lo sob seu controle”, afirma McKay.
“RENFIELD – DANDO O SANGUE PELO CHEFE”
EUA, 2023. Direção de Chris McKay. Com Nicholas Hoult, Nicolas Cage, Awkwafina e Ben Schwartz. Em cartaz em salas das redes Cinemark e Cineart.
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