Usando paletó e camisa pretas, de pé, em frente a porta vermelha, o escritor Afonso Cruz encara a câmera

Afonso Cruz visitará cinco cidades brasileiras no lançamento de seu livro escrito em 2013, que ganhou edição pela Dublinense no Brasil neste ano

Paulo Sousa Coelho/Divulgação

Recentemente indicado ao Prêmio Ibérico Álvaro Magalhães na categoria Literatura Infantojuvenil pelo livro “A flor e o peixe”, o escritor português Afonso Cruz vem ao Brasil nesta semana para promover outra obra. O livro “Para onde vão os guarda-chuvas”, de 2013, ganhou neste ano edição no Brasil, pela Dublinense. 

Cruz estará amanhã (3/5) em São Paulo e na quinta-feira (4/5) em Belo Horizonte, onde participa do projeto Sempre um Papo. Depois, ele segue para o Rio Grande do Sul, com paradas em Porto Alegre, Caxias do Sul e Santa Maria.  

“Para onde vão os guarda-chuvas” é um romance ambientado em um oriente ficcional e que aborda a história de diversos personagens. Entre eles, o dono de uma tapeçaria, que gostaria de ser invisível aos olhos dos outros, e sua mulher herege; uma criança que sonha em voar; uma mulher que quer se casar com um homem que fuja do padrão estético dos países do Oriente Médio; um poeta mudo; um general russo brigão; um indiano apaixonado e um rapaz que “tem o universo inteiro dentro da boca”.
O livro começa com uma espécie de “Um conto de Natal”, de Charles Dickens, no qual o narrador é o personagem Fazal Elahi, tapeceiro devoto, que será apresentado ao leitor mais adiante. Na sequência, Cruz opta por um aforisma e depois narra a história de Fazal no formato tradicional dos romances.

O que liga as histórias dos personagens, no entanto, são os sentimentos de perda, solidão e amor entre eles. Na casa de Elahi, por exemplo, vivem sua esposa, Badini; um monge muçulmano casto; o primo mudo; e Aminah, a irmã de Elahi, que espera se casar e está secretamente apaixonada por Dilaware, viciado em ópio e filho fraco do general russo brigão Ilia Vassilyevith. 

Aminah cuida da casa de Elahi e não repara no amor do indiano Nachiteka Mudaliar, que a persegue no mercado e não se cansa de pedir a todos os deuses hindus para ser feliz.

Visita ao Brasil

A narrativa não segue o ritmo cronológico convencional e, muito menos, mantém o mesmo formato textual ao longo do livro. Cruz mescla imagens, esquemas gráficos e palavras fora das regras de sintaxe para contar as histórias.

“Essa preocupação com a forma tem a ver com a minha formação em artes plásticas”, afirma o escritor. “Eu penso que há coisas que não podem ser ditas somente com palavras, imagens ou com símbolos. Por isso, escolhi juntar tudo para que uma coisa fosse complementando a outra”, emenda.

É assim que ele expressa e enreda os sentimentos de cada personagem, mas sem deixar tudo muito explícito. As emoções de cada um e as motivações para suas atitudes estão em camadas mais profundas da história e que, em muitos momentos, cabe ao leitor interpretar.

“Não lemos ‘Ilíada’ até hoje para saber da Guerra de Troia, e sim porque existem dilemas humanos que são tratados na obra de modo não tão explícito. Acho até que é isso que faz uma obra continuar viva depois de tanto tempo”, avalia.

“O mesmo ocorre com ‘Crime e castigo’, de Dostoiévski”, diz o escritor. “Se a gente parar para analisar, essa obra é mais próxima de um romance policial, um homem que mata duas pessoas e fica se remoendo pela culpa. Mas é aí que Dostoiévski se aprofunda para desenvolver toda uma filosofia e questões sensíveis ao ser humano.”

Inspirado no escritor russo, Cruz gosta de desafiar o leitor com suas obras. Por isso, opta por sugerir ao invés de constatar, o que, nas palavras dele, é uma espécie de erotismo literário, no qual a trama, com suas diferentes camadas interpretativas, seduz aos poucos o leitor.

Em “Para onde vão os guarda-chuvas”, Cruz alcança esse objetivo de sedução com maestria. Logo no início da apresentação de Fazal Elahi, quando o narrador descreve o nascimento do primeiro filho do personagem, há uma sugestão de que o filho de Fazal é, na realidade, fruto de um romance extraconjugal de Badini.

A situação, no entanto, só é esclarecida mais adiante, e, mesmo assim, deixando o leitor em uma espécie de zona cinzenta em relação às reais motivações da desconfiança, numa forma de deixar a critério de quem lê decifrar a situação.

“Para onde vão os guarda-chuvas” é o 12º livro de Cruz. Ao todo, o autor tem 40 obras publicadas, muitas delas premiadas, como "A boneca de Kokoschaka", que levou o Prêmio da União Europeia para a Literatura; "Jalan Jalan", que venceu o Grande Prêmio de Literatura de Viagens; e “Jesus Cristo bebia cerveja”, que recebeu o prêmio “Time Out” - Livro do Ano.

No caso do Prêmio Ibérico Álvaro Magalhães, estão indicados também Valter Hugo Mãe, Capicua, David Machado e Rita Sineiro. O resultado será anunciado no próximo sábado (6/5).

SEMPRE UM PAPO COM AFONSO CRUZ
• Na próxima quinta-feira (4/5), às 19h30, no Auditório da Cemig (Av. Barbacena, 1.200, Santo Agostinho).
• Entrada franca.

Capa do livro 'PARA ONDE VÃO OS GUARDA-CHUVAS'

Capa do livro "PARA ONDE VÃO OS GUARDA-CHUVAS"


“PARA ONDE VÃO OS GUARDA-CHUVAS”
• Afonso Cruz
• Dublinense (544 págs.)
• R$ 119,90