A morte da cantora Rita Lee, anunciada na manhã desta terça-feira (9/5), despertou lembranças no fotógrafo Lucas Ávila, de 37 anos. Ele decidiu compartilhar, nas redes sociais, a história de amizade que teve com a cantora. Os dois começaram a trocar mensagens e essa interação inspirou Rita Lee a fazer uma música, que faz parte do álbum Reza, lançado em 2012.
Ávila conta que a cantora sempre foi muito presente na infância dele, mesmo sem conhecê-la pessoalmente. “A música de namoro dos pais era Shangrilá. Eles sempre escutaram e gostaram muito. Era uma cantora que estava sempre tocando em casa.”
Ele lembra de ter ido a um show, no Palácio das Artes, quando ainda era criança. “Acho que foi no final dos anos 1990, foi um dos primeiros shows que fui na vida.” O fotógrafo se recorda de que os pais compraram ingressos para lugares em uma fileira próxima ao palco.
“Na época, eu tinha levado uma câmera de filme, era um pré-adolecente. Fiz várias fotos dela de perto. Depois que eu fui a esse show é que, de fato, entendi um pouco do espírito dela: debochada, usava o humor, tinha uma forma livre de se expressar.
Nesse show, segundo o fã, ela se vestiu de Gal Costa, colocou uma peruca e cantou ‘Baby’. “Também se vestiu de presidiária, tinha toda uma questão performática. Eu percebi que isso encantava todas as gerações.”
Troca de mensagens e presentes
Ávila conta que a amizade com a cantora começou quando ela fez um perfil no Twitter. Na época, Rita Lee era muito ativa na rede social e interagia com os fãs. “Eu sempre respondia nas postagens que ela fazia e, depois de um tempo, ela passou a me responder de volta.”
O fotógrafo lembra que, após algumas interações, a cantora passou a segui-lo na rede social e eles começaram a conversar frequentemente. “Isso durou mais de dois anos. Começou no Twitter, depois ela saiu de lá e começamos a conversar por e-mail. Trocamos mensagens por e-mail até o último show dela, em Aracaju.”
“Era uma coisa curiosa, não conversava com ela como um fã, que ficava admirando o trabalho e dizendo o quanto ela era maravilhosa. Ela era muito criativa escrevendo, começava a contar uma história e eu respondia pra ela, no mesmo tom, continuando a história dela. Sempre conversávamos em codinomes”, completa.
Ela chamava o fotógrafo de Ake, em referência ao faraó Akhenaton e ele a chamava de Neffy, em referência a rainha do Egito, Nefertiti, esposa do faraó. “Ela me confidenciou coisas relacionadas a sua saúde, família, coisas que ela gostava e não gostava. Mas, na maior parte do tempo, a nossa relação era dentro desse lugar fantasioso.”
Música no último álbum
Por causa dessa troca de mensagens com construção de histórias entre eles, a cantora escreveu contando que tinha feito uma música baseada nas interações.
A canção se chama ‘Rapaz’ e é uma das faixas do álbum Reza, o último lançado pela cantora, em 2012 (veja a letra abaixo). “Quando nos encontramos em um show em BH, ela cantou pra mim a música. Depois de um tempo, ela saiu no álbum. Eu me senti a ‘Garota de Ipanema’, quando ela me disse que tinha feito a música baseada nas nossas conversas”, brinca.
Ele diz que na época não quis tornar o fato público, por temer ser acusado de se beneficiar disso. “Foi uma coisa que contei para os meus amigos próximos e ficou guardado dentro de mim. Mas hoje, quando vi que ela tinha morrido, fiquei muito triste. Lembrando e vendo as mensagens que ela me mandou, as fotos, os presentes.”
Diante disso, decidiu contar essa história e fez a postagem no Instagram. “É algo que me marcou.”
Encontros e troca de presentes
O fotógrafo lembra que os dois se encontraram pessoalmente, em algumas oportunidades. “A primeira vez foi em um show dela aqui em BH, no Chevrolet Hall, em 2011. Ela me chamou para o camarim, me deu presentes. Um deles era um isqueiro da Marilyn Monroe, que ela comprou quando fez um show na Argentina.”
O fã se recorda que recebeu outros presentes da cantora: uma mecha de cabelo, uma palheta de guitarra personalizada e uma pedra pintada a mão por Rita. “Eu sempre viajei muito e, em todas as viagens, eu mandava coisas pra ela de presente.” Segundo ele, às vezes, a cantora postava os presentes no Instagram e agradecia.
Com o tempo, os dois foram parando de trocar mensagens. “Depois do show de despedida, eu fiquei sabendo que ela se afastou de muita gente com quem conversava pela internet, que era o meu caso”, explica. “Ela foi sumindo aos poucos, respondia uma vez ou outra.”
Ele diz que não ficou chateado com a atitude da cantora. “Mesmo quando a gente perdeu o contato, ela sempre foi carinhosa comigo nessas entrelinhas. Lembro de uma vez que eu viajei para a Hungria e comprei um ursinho de corda, que tocava uma guitarra. Ele era da década de 1950. Ela passou a infância nessa década.”
Ávila conta que mandou o presente para a cantora. Ela postou uma foto do brinquedo com um agradecimento. “Sempre existiu esse vínculo.”
O fotógrafo diz que Rita Lee sempre será uma fonte de inspiração. “Uma mulher no ambiente do rock, que sempre foi muito masculino e opressor. Que começa em uma banda (Os Mutantes), se torna líder dela, é expulsa e se torna a pessoa que mais vendeu discos no Brasil. Falando sobre protagonismo feminino, defesa dos animais, aceitação da homossexualidade. Ela era uma pessoa de outro planeta, que veio para nos ensinar a sermos melhores.”
Veja a letra de 'Rapaz':
“Rapaz você é o cara
Que me faz sonhar
Cenas calientes, dois delinquentes
Cometendo crimes de amor
Rapaz se você quiser fugimos pro Tibet
Seremos dois budas, dos cafundós do Judas
Iluminando o mundo de amor
Serei sua escrava, sua dominatrix
Sua namorada, sua bitch
Serei sua escrava, sua dominatrix
Sua namorada, sua bitch
Rapaz você é o cara
Que me faz sonhar
Cenas calientes, dois delinquentes
Cometendo crimes de amor
Rapaz se você quiser fugimos pro Tibet
Seremos dois budas, dos cafundós do Judas
Iluminando o mundo de amor
Serei sua escrava, sua dominatrix
Sua namorada, sua bitch
Serei sua escrava, sua dominatrix
Sua namorada, sua bitch, bitch, bitch, bitch, you bitch”