Acredito que inovo em algumas músicas. Na verdade, é muito difícil tocar standards da bossa nova sem cair naquele lugar-comum. Aliás, se fosse para cair no lugar-comum, não gravaria. Então, trouxe para a minha onda
Antonio Adolfo, pianista e compositor
Com mais de cinco décadas de carreira – no Brasil e no exterior –, o pianista, arranjador e compositor carioca Antonio Adolfo lança o álbum “Bossa 65: Celebrating Carlos Lyra e Roberto Menescal”. A homenagem aos amigos tem 10 faixas, com arranjos do próprio Adolfo.
O repertório, como não poderia deixar de ser, está repleto de clássicos. “O barquinho” (Menescal e Ronaldo Bôscoli), “Coisa mais linda” (Carlos Lyra e Vinicius de Moraes), “Bye bye Brasil” (Roberto Menescal e Chico Buarque) e “Marcha da quarta-feira de cinzas” (Carlos Lyra e Vinicius de Moraes) são alguns deles.
A homenagem não se deve apenas à amizade, mas ao desejo de ressaltar o talento de Lyra e Menescal, diz Antonio Adolfo.
“Além de ser meu padrinho musical, Lyra é um dos melhores melodistas que já vi, merece ter sua obra pesquisada por gente de todo o mundo. Foi um dos grandes parceiros de Vinicius de Moraes”, lembra.
Um dos primeiros trabalhos de Adolfo como pianista, aliás, foi o musical “Pobre menina rica”, criado por Vinicius e Carlos Lyra nos anos 1960.
Com Elis na Europa
Por outro lado, Roberto Menescal, em parceria com Bôscoli, é autor de pérolas da bossa nova, como “O barquinho”. “Também trabalhei com ele, gravamos os álbuns 'Elis in London' e 'Elis and Toots Thielemans/Aquarela do Brasil” na Europa, em 1969”, conta. Um pouco depois, quando Roberto Menescal se tornou diretor artístico da gravadora Polygram, nos anos 1970, ele e Antonio Adolfo desenvolveram vários projetos.Participaram do disco Lula Galvão (guitarra e violão), Jorge Helder (baixo), Rafael Barata (bateria e percussão) Dadá Costa (percussão), Jessé Sadoc (trompete e flugelhorn), Danilo Sinna (sax-alto), Marcelo Martins (sax-tenor e flauta) e Rafael Rocha (trombone).
Ao comentar a sonoridade de seu novo álbum, Antonio Adolfo explica que as releituras trazem a sua assinatura. “Dei um toque contemporâneo aos arranjos, principalmente nas harmonias regadas pelo jazz, porém sem perder a essência da bossa nova”, afirma.
O disco, segundo ele, ficou bem no estilo “Antonio Adolfo”, com quatro sopros e percussão em algumas faixas. “'Bye, bye, Brasil' está bem interessante. Botei uma levada de quadrilha nordestina. Gravei tudo instrumental, mexi nas harmonias e melodias, mas os autores não ficaram na bronca não”, garante.
Adolfo revela que o álbum remete à sua própria história. Estrear no musical “Pobre menina rica”, no qual Carlos Lyra era o mendigo e o poeta, foi um privilégio, relembra. “Quando eu tinha uns 13 para 14 anos, já conhecia canções do Menescal, como 'O barquinho' e 'Ah! se eu pudesse', gravadas pelo Tamba Trio, além de outras pela Maysa”, diz.
A relação dos dois se estreitou em 1966, quando Adolfo substituiu o pianista Ugo Marotta, que havia sofrido um acidente. “Fiz temporada com o Menescal, sua banda, o Miele e a cantora Tuca no Rui Bar Bossa, em Copacabana”, diz.
Em 1968, o pianista tocou com Menescal no Olympia de Paris. “Entrei no grupo no lugar do Luiz Carlos Vinhas e fizemos várias turnês com a Elis Regina pela Europa. Gravamos com ela em Londres, na Inglaterra, e com o Toots Thielemans, na Suécia”, conta.
Antonio Adolfo acredita que Lyra e Menescal são tão fundadores da bossa nova quanto Tom Jobim (1927-1994) e Johnny Alf (1929-2010). “Dizem que ele (Alf) foi o precursor de tudo”, observa.
Namoro antigo
O pianista carioca decidiu lançar o disco agora devido aos 65 anos de criação da bossa nova, pois ele considera 1958 o marco inaugural do movimento.
“Vinha namorando esse repertório há muito tempo, experimentando aqui e ali. Inclusive, cheguei a lançar o single 'Coisa mais linda'. O arranjo é muito parecido com o da nova gravação e está no streaming desde 2019. Resolvi gravar de novo, agora com quatro sopros”, diz.
“Acredito que inovo em algumas músicas. Na verdade, é muito difícil tocar standards da bossa nova sem cair naquele lugar-comum. Aliás, se fosse para cair no lugar-comum, não gravaria. Então, trouxe para a minha onda”, diz.
Segundo ele, não foi fácil selecionar cinco composições de cada homenageado. “Vamos ver, quem sabe sai o volume dois? Estou fazendo quase um disco por ano”, comenta.
Pianista de mão cheia, Antonio Adolfo não se limita à bossa nova, ao jazz e à MPB em sua carreira. Toca até mesmo o velho rock and roll.
“Eu gravei até com Mick Jagger, então, sou meio roqueiro também. Em 1976, ele estava no Rio de Janeiro com a mulher, a Bianca, e quis gravar uma música. Essa música até saiu no ano passado, mas com versão nova, chama-se 'Scarlett'. Nos reunimos em estúdio, eu, no piano, Paulinho Braga, na bateria, Dadi, na guitarra, Luisão Maia, no baixo, e gravamos.”
Ao comentar sua relação com Minas Gerais, ela faz questão de lembrar que tocou com Elis Regina em BH, em 1966, no Automóvel Clube. Adolfo fazia parte do Trio 3D. “Como a gente, ela também estava começando naquela época. Foi muito legal. Antes da pandemia, toquei duas vezes no CCBB de BH e foi muito bacana. Quem sabe volto a Belo Horizonte para lançar este disco? Vamos torcer para isso”, diz.
'Bye, bye, Brasil' está bem interessante. Botei uma levada de quadrilha nordestina. Gravei tudo instrumental, mexi nas harmonias e melodias, mas os autores não ficaram na bronca não
Antonio Adolfo, pianista e compositor
Pioneiro da produção independente
Adolfo cuidou de todas as etapas do LP “Feito em casa”, lançado em 1977 – da gravação à venda do álbum nas lojas.
Músico desde criança, ele montou o Trio 3D, em 1963, com o qual acompanhou vários artistas. Na era dos festivais, chamou a atenção do Brasil com “Sá Marina”, parceria com Tibério Gaspar e grande sucesso na voz de Wilson Simonal, e “Teletema”, música romântica da trilha da novela “Véu de noiva”, exibida pela Globo em 1969. Foi outra dobradinha com Gaspar, que morreu em 2017.
Outra famosa canção da dupla é “BR-3”, defendida por Tony Tornado no Festival Internacional da Canção (FIC), em 1970. Tony chamou a atenção com sua interpretação marcante, despontando como talento da black music brasileira.
Desde a década de 1970, Antonio Adolfo vive entre o Brasil e o exterior. Estudou música nos E
Educador, em 1985 ele criou o Centro Musical Antonio Adolfo, no Rio de Janeiro, hoje comandado pelas filhas. Publicou uma dezena de livros didáticos sobre piano, harmonia e música brasileira.
REPERTÓRIO
COISA MAIS LINDA
De Carlos Lyra e Vinicius de Moraes
SAMBA DO CARIOCA
De Carlos Lyra e Vinicius de Moraes
BYE BYE BRASIL
De Roberto Menescal e
Chico Buarque
O BARQUINHO
De Roberto Menescal e
Ronaldo Bôscoli
MARIA MOITA
De Carlos Lyra e Vinicius de Moraes
TETÊ
Roberto Menescal e Ronaldo Bôscoli
MARCHA DA QUARTA-FEIRA DE CINZAS
De Carlos Lyra e Vinicius de Moraes
RIO
De Roberto Menescal e
Ronaldo Bôscoli
NÓS E O MAR
De Roberto Menescal e
Ronaldo Bôscoli
SABE VOCÊ
De Carlos Lyra e Vinicius de Moraes
"BOSSA 65: CELEBRATING CARLOS LIRA E ROBERTO MENESCAL"
• Álbum de Antonio Adolfo
• 10 faixas
• Disponível nas plataformas digitais
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