Tony Tornado sorri para a câmera

Atualmente no elenco de "Amor perfeito", Tony Tornado deve fazer show em Ouro Preto na próxima sexta

Leo Lara/Divulgação


Dedicada a debater a preservação de filmes, a Mostra de Cinema de Ouro Preto (CineOP) abre sua 18ª edição na próxima quinta-feira (22/6). Até 26/6, o festival promove na cidade histórica mineira exibições de filmes, oficinas, workshops, masterclasses, apresentações artísticas e as tradicionais mesas redondas sobre seu tema principal, assim como sobre história e difusão do cinema brasileiro.

Ao todo, serão exibidos 125 filmes (entre longas, médias e curtas-metragens) de cinco países (Brasil, Argentina, Colômbia, Equador, EUA). Eles estão distribuídos nas mostras Contemporânea, Homenagem, Preservação, Histórica, Educação, Valores, Mostrinha e Cine-Escola.

“A Mostra de Cinema de Ouro Preto é especial, porque é o único evento que tem esse viés conceitual de ter como base a preservação, a história e a educação”, afirma a diretora da mostra, Raquel Hallak. “Esses 18 anos, portanto, são muito importantes, porque mostram que o evento chegou na sua maturidade”, diz.

Houve, de fato, amadurecimento da CineOP, de modo que a mostra não termina em si. Ou seja, as questões levantadas nos debates serão transformadas em relatório com sugestões de parâmetros, premissas, metas e necessidades do setor para serem apresentadas ao Ministério da Cultura (MinC). A titular da pasta, Margareth Menezes, confirmou presença. 

A ideia da diretora do CineOP é que seja elaborada e entregue à ministra uma proposta consistente de criação de uma rede nacional de arquivos audiovisuais, que reúna informações sobre os acervos de todo o país.

“Isso é muito importante, porque, como o Brasil é um país de proporções continentais, é muito difícil a gente saber o que está no arquivo de uma cinemateca do Nordeste ou do Sul. E isso faz com que um filme acabe caindo no esquecimento”, diz Raquel.
 
Cena de 'Brasilianas: Cantos de trabalho - Música folclórica brasileira'

O curta "Brasilianas: Cantos de trabalho - Música folclórica brasileira", de Humberto Mauro, será exibido no festival, que programou 125 títulos

CineOP/divulgação
 

O ator Jorge Ben 

Foi exatamente isso que ocorreu com o longa “Uma nega chamada Tereza” (1973), de Fernando Coni Campos e estrelado por Jorge Ben Jor. O filme, que será exibido no próximo sábado (24/6), na abertura da Mostra Histórica (principal seção paralela dentro da CineOP), estava praticamente perdido. Havia somente uma cópia em DVD, na Cinemateca Brasileira, em São Paulo.

“Esse filme foi um achado, um verdadeiro trabalho de garimpo”, afirma Cléber Eduardo, um dos curadores. “Eu sabia da existência desse longa, porque tinha lido sobre ele numa tese a respeito do Jorge Ben, estava numa nota de rodapé”, comenta.

“Mas não encontrei absolutamente nenhuma referência crítica, nenhuma análise, nenhuma reportagem. Nada. Inclusive, conversando com pessoas que têm uma experiência maior do que a minha na produção cinematográfica dos anos 1970, fiquei sabendo que elas também não conheciam esse filme”, lembra ele.
 
Jorge Ben Jor e Aurora Duarte no filme 'Uma nega chamada Tereza'

Jorge Ben Jor e Aurora Duarte em "Uma nega chamada Tereza"

Unibrasil Filmes/reprodução
 

Evocando no título os versos da canção “País tropical”, de Ben Jor, o filme de Coni Campos conta a história de um casal de africanos (Ben Jor e Marina Montini) que chega ao Brasil para participar do Festival Internacional da Canção. A moça, contudo, se apaixona pelo país e decide ficar, mudando seu nome de Makeba para Tereza.

Embora não seja um clássico do cinema nacional e tenha quase se perdido ao longo do tempo, "Uma nega chamada Tereza” dialoga bem com a proposta da Mostra Histórica de fazer uma correlação entre a música preta do Brasil com a produção cinematográfica nacional.

Nessa mostra paralela, serão exibidos, além dele, outros três longas-metragens (“Lupicínio Rodrigues: Confissões de um sofredor", de Alfredo Manevy; "Simonal – Ninguém sabe o duro que dei", de Cláudio Manoel, Micael Langer e Calvito Leal; e "Sou feia, mas tô na moda", de Denise Garcia).

A seção traz ainda os curtas “A voz e o vazio – A vez de Vassourinha", de Carlos Adriano; "Alma no olho", de Zózimo Bulbul; "Brasilianas: Cantos de trabalho – Música folclórica brasileira", de Humberto Mauro; "Elekô", do coletivo Mulheres de Pedra; e "Transgressão parte II", de Jup do Bairro, Felipa Damasco e Rodrigo de Carvalho.

Mulheres fazem maquiagem em cena do longa 'Sou feia, mas tô na moda'

Cena do longa "Sou feia, mas tô na moda", de Denise Garcia, sobre artistas do funk carioca; filme integra a Mostra Histórica

CineOP/divulgação

Bossa nova

A ideia de relacionar a música preta brasileira com a produção cinematográfica nacional surgiu depois que Cléber Eduardo leu o livro "Nara Leão: Nara – 1964", de Hugo Sukman, sobre o primeiro disco da musa da bossa nova.

“Notei que o que é muito importante na carreira da Nara, de modo geral, mas sobretudo nesse primeiro disco dela, é justamente a presença de músicos pretos sendo gravados por alguém que estava saindo da cena da bossa nova: uma pessoa branca, da Zona Sul carioca. E uma figura de proa que aparece ali como uma espécie de ponte entre o samba de morro e a bossa nova de Ipanema é o Zé Keti”, aponta o curador. 

“Ele foi a pessoa que tentou tirar o samba do morro e espalhá-lo pelo Rio de Janeiro e pelo Brasil. Assim, ainda que nós não tenhamos o Zé Keti na programação, eu diria que, na elaboração dessa temática, a figura dele foi fundamental”, comenta.

Pensando em Zé Keti e na música preta brasileira de forma geral, que tradicionalmente esteve um pouco à margem da indústria fonográfica - os sambas eram mais frequentemente gravados por compositores brancos que tinham acesso mais fácil às gravadoras e às rádios -, Cléber começou a relacioná-las com os filmes produzidos no Brasil ao longo da história do cinema nacional.

Durante a pesquisa, ficou espantado ao perceber que, mesmo estando muito presente no imaginário coletivo e na memória dos brasileiros, a música preta não estava tão presente no cinema.

Até mesmo as chanchadas, que seguiam uma tendência de abordar o samba, o carnaval e as favelas, faziam isso sob a perspectiva do branco. Grande Otelo (1915-1993), ator negro que fez muitos desses filmes, foi uma exceção, de acordo com o curador.

“Quando se vai na ficha técnica das chanchadas e nas trilhas musicais, vemos que elas são significativamente brancas", observa Cléber, acrescentando que a relação entre a música preta e o cinema nacional só começa a ganhar força a partir da década de 1990, e mesmo asssim ancorada na produção de cinebiografias de músicos negros, como Wilson Simonal, Luiz Gonzaga, Tim Maia, Jair Rodrigues, entre outros.
 

Homenagem a Tony

 A Mostra Histórica, que tradicionalmente tem um homenageado, escolheu neste ano prestar tributo à carreira do cantor e ator Tony Tornado, que segue ativo, aos 93 anos.

Ex-engraxate, ex-vendedor de balas e ex-militar do Exército, Tony é figura conhecida por seus trabalhos na TV, no cinema e na música. Em 1970, venceu o Festival Internacional da Canção, com “BR-3”, de Antônio Adolfo e Tibério Gaspar. 

A carreira de ator começou em 1972, na novela “Jerônimo, o herói do sertão”, da TV Tupi. Na sequência, seguiu para a TV Globo para trabalhar com Chico Anysio e por lá ficou até hoje, integrando o elenco de diversas novelas. Atualmente, está no ar em “Amor perfeito”.

No cinema, Tony Tornado atuou em quase 20 filmes. O mais recente foi "Juntos e enrolados" (2022) de Eduardo Vaisman e Rodrigo Van Der Put.

“Não há, contudo, um filme sobre Tony Tornado, que é o nosso homenageado”, lamenta Cléber, o curador. “Ele está como intérprete em alguns filmes, mas não existe um filme sobre ele, o que é lamentável, porque é uma vida cheia de reviravoltas e daria um excelente enredo cinematográfico”, emenda.

De acordo com a organização do CineOP, Tony Tornado estará em Ouro Preto para receber o troféu Vila Rica e fará show na cidade, na sexta-feira (23/6), ao lado do filho. 

18ª MOSTRA DE CINEMA DE OURO PRETO

• Desta quinta-feira (22/6) a 26 de junho, em Ouro Preto.
• Programação gratuita disponível no site cineop.com.br.