É atípico ver, nos dias de hoje, um festival de porte sem pista premium, área vip, camarote open bar ou qualquer prática “gourmetizante” que divida a plateia – basicamente entre quem pode pagar mais e quem não.
O Sensacional fechou a conta de sua décima edição com 25 mil pessoas no Parque Ecológico da Pampulha – 10 mil com a noite de abertura, na sexta (24/6), com Gilberto Gil e família, e 15 mil no festival propriamente dito no sábado (25/6), com 10 horas de show, a maior parte deles à tarde.
Todo o mundo no imenso gramado do parque, o que dá outra conotação para um este tipo de evento, geralmente realizado sobre o concreto ou asfalto. Sem divisões de classe – dois pequenos morros laterais ainda atuam como “arquibancadas” gramadas. Um convite para estender as cangas no sábado de sol.
Com quatro palcos, os olhares concentraram-se nos dois principais, postados lado a lado ao fundo da chamada esplanada. Desta maneira, assim que um show terminava em um palco, o outro dava início ao próximo – ao todo, foram oito atrações nos dois espaços. Ótimo, porque o público poderia assistir a todos sem precisar caminhar entre um palco e outro.
FRUSTRAÇÃO Mas era muito show concentrado e o evento tinha que terminar, pontualmente, às 22h. Com isto, um mínimo atraso aqui poderá atrapalhar acolá. E foi o que aconteceu, atrapalhando atrações que mereciam mais tempo em cena. O show “MangueFonia” foi o mais prejudicado neste sentido.
A Nação Zumbi trouxe nove músicos para Belo Horizonte: seis da banda e mais três convidados (Fábio Trummer, da banda Eddie), Fred Zero Quatro (do Mundo Livre S/A) e Canibal (da Devotos) para celebrar os 30 anos do nascimento do mangue beat.
A conta era: com a Nação como banda base, os vocalistas convidados se revezariam tocando duas músicas cada (uma da época e outra atual). Muitas menções de conteúdo político-social (do momento de Lula presidente à liberação da maconha, passando por críticos à inteligência artificial), como de praxe entre estas bandas.
O final seria uma celebração da Nação, com Jorge Du Peixe à frente. O vocalista mandou uma das canções-gênese do mangue (“Banditismo por uma questão de classe”). E veio outra, mais atual, (“Foi de amor”, de 2014, da última safra de inéditas lançada pela banda), seguida de outros hits do cancioneiro da Nação, “Meu maracatu pesa uma tonelada” e “Manguetown”). E...acabou. Houve frustração do lado de lá (da banda) e de cá (da plateia). Mesmo com pedidos insistentes, não houve bis – as reclamações nas redes sociais sobre a apresentação curtíssima chamaram a atenção.
Mas o modelo festival, com apresentações de no máximo uma hora, não costuma dar muito tempo para reler uma carreira. Mesmo assim, difícil pensar em um momento mais emocionante do que a chegada de Leci Brandão ao palco como convidada do grupo Fundo de Quintal. Chegou amparada vestindo as cores da Mangueira (incluindo o cabelo colorido de rosa).
EMOÇAO “Estou bastante emocionada. Venho de uma angioplastia na perna esquerda, não estou podendo sambar. Para mim é muito triste não poder fazer aquilo que gosto, mas a alegria de vocês me deu força”, disse Leci, de 78 anos, que aos gritos de “Leci, Leci, Leci”, mandou “O bêbado e o equilibrista”, uma das mais célebres criações da parceria Aldir Blanc/João Bosco.
Reunir veteranos a jovens nomes é uma prática corrente de festivais. E não há veterano mais jovem do Hermeto Pascoal. O bruxo de Alagoas não precisa muito para dominar o público. E aos 87 anos, completados quinta-feira (22/6), atualmente a presença de Hermeto é mais como maestro de sua banda – quinteto formado Itiberê Zwarg (baixo), André Marques (piano), Jota P. (saxofones e flautas), Ajurinã Zwarg (bateria) e Fabio Pascoal (percussão).
Ainda que nomes como estes sejam a base de uma boa escalação para um festival, não há como negar também que o público é majoritariamente muito jovem. E quer ouvir os hypes. Não deu nem para sentir a frustração com o pequeno show da Nação, pois já no palco ao lado, com fogos saindo das beiras da estrutura, surgiu a rapper Flora Matos.
FRISSON O sol que deixou a tarde de inverno quente havia ido embora, o frio se aproximava, mas o frisson na plateia havia chegado atingido níveis mais altos. Até Céu, que havia feito um baile reggae gostoso e com a cara do festival, estava no gargarejo para ver Flora e seus hits “Ser sua” e “O jeito”.
Dali para adiante o clima esquentaria com as duas atrações mais esperadas do evento: Gloria Groove e Marina Sena. Esquentaria, não fosse uma questão básica para qualquer festival de música: o som. E deixou muitíssimo a desejar entre as duas estrelas pop – quem não estava na área mais próxima ao palco, teve dificuldade de ouvir a música. Choveram críticas nas redes do festival.
OUTRAS INTERVENÇÕES Para além dos shows, o Sensacional apresentou outras intervenções – de ritual indígena a instalações da recente Festa da Luz. O clima é simpático, despretensioso, beirando o riponga. Mas estamos em 2023, então é uma profusão de gente montada e selfies em todos os lugares do parque. A música é o chamariz para o público. Mas muita gente está ali é só pela festa mesmo.
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