Atriz Lily Rose Depp deita no ombro de The Weeknd, que dirige carro, em cena da série The idol

Química entre Jocelyn (Lily-Rose Depp) e Tedros (The Weeknd) não funcionou na série da HBO

HBO/reprodução

 
No papel, a ideia era sedutora. O popstar canadense The Weeknd interpretaria uma mistura de produtor musical e líder de seita, manipulando jovens talentos em benefício próprio. Na produção executiva, Sam Levinson, que potencializaria ao máximo o coquetel de sexo e drogas que transformou a série “Euphoria”, dirigida por ele, em sucesso de crítica e audiência.
 
A HBO aprovou o projeto, e “The idol” foi anunciada como uma sátira contundente à indústria da música. Mas as mudanças começaram antes mesmo das filmagens. Tedros, o sombrio protagonista vivido por The Weeknd, que aparece nos créditos usando seu nome real, Abel Tesfaye, foi suavizado.
 
O bando de artistas desajustados reunido à sua volta se tornou mais uma comunidade hippie do que uma gangue ao estilo da família Manson, capaz de barbaridades como assassinatos rituais.

Em abril de 2022, Tesfaye, que também é um dos criadores, roteiristas e produtores da série, exigiu que a diretora Amy Seimetz abandonasse o cargo, e que Levinson a substituísse. Fonte próxima à produção disse à revista Rolling Stone que o afastamento de Seimetz garantiu que a série perdesse o ponto de vista feminista que tinha até então.
 
“The idol” foi anunciada como o grande lançamento da HBO para o verão americano, com seis episódios (depois reduzidos a cinco) repletos de cenas ousadas. Durante a pré-estreia no Festival de Cannes, em maio passado, alguns jornalistas saíram no meio da sessão.
 
Diretor Sam Levinson dá entrevista, ao fundo, em imagem desfocada, está The Weeknd

Sam Levinson assumiu a direção da série depois que The Weeknd despediu Amy Seimetz

Julie Sebadelha/AFP
 

Arremedo de Britney

A trama é centrada em Jocelyn, cantora fictícia com muitos traços em comum com Britney Spears. Joss, como é chamada na intimidade, passa por uma crise pessoal: acabou de perder a mãe, que dirigiu sua carreira com mão de ferro desde a infância. Desequilibrada emocionalmente, ela não consegue se concentrar no trabalho nem gravar o novo hit que a gravadora exige.
 
O primeiro episódio faz muita força para chocar. A foto de Jocelyn com esperma no rosto vaza nas redes sociais, e seus empresários movem mundos e fundos para minimizar o escândalo. Alheia ao circo de mídia ao seu redor, a cantora é levada por uma das bailarinas de seu show a uma boate.
 
Lá ela conhece Tedros, o dono do estabelecimento, e os dois se encantam um pelo outro. Dias depois, ele vai visitá-la, e o episódio termina com uma tórrida cena de sexo que resvala para o sadomasoquismo.

Jocelyn é vivida por Lily-Rose Depp, filha de Johnny Depp com a atriz e cantora francesa Vanessa Paradis. É atriz competente e desinibida, mas falta a ela o carisma de estrelas como Madonna e Beyoncé – ou mesmo de sua mãe, que explodiu nas paradas do mundo inteiro, ainda adolescente, cantando “Joe le taxi”, mais tarde regravada por Angélica como “Vou de táxi”.
 
 

Bem mais problemático é Abel Tesfaye, muito mais competente como o músico Weeknd do que como ator. Ele tenta dar aura de perigo e mistério a Tedros, mas consegue apenas tornar o personagem repugnante.
 
A culpa maior é do roteiro. Tedros assume o controle da vida e da carreira de Jocelyn. Transfere-se para a mansão dela e traz junto um bando de artistas, que ele tirou da sarjeta. Traz também o produtor encarregado de criar o novo som da cantora, contra todos os desígnios da gravadora. Mas nem de longe se torna um ente maligno com poderes absolutos.
 
“The idol” prometia sequências acintosas, como se fosse a versão gringa da novela “Verdades secretas”. Até entregou algumas, inclusive a cena de tortura com choques elétricos. Mas, no final, ficou muito aquém do que poderia ser.
 

Roteiro fraco

A relação entre Jocelyn e Tedros, cheia de idas e vindas, não reflete o temperamento instável dos personagens: é simplesmente mal escrita, com inconsistências que desafiam a lógica e a paciência.
 
A temporada termina da pior maneira possível, deixando portas abertas para a nova safra. Mas quem vai querer voltar a esse universo? 
 
“The idol” consegue ultrajar o espectador, só que não pelo atrevimento, e sim pela ruindade. É um triste caso de sátira que se transforma no objeto que pretendia satirizar.

“THE IDOL”

Série dirigida por Sam Levinson, com Abel Tesfaye (The Weeknd), Lily-Rose Depp e Troye Sivan. Primeira temporada, com cinco episódios disponíveis na HBO Max. Classificação: 18 anos.