Roteiristas de Hollywood estão em greve há dois meses — e, em breve, atores podem se juntar a eles, trocando os tapetes vermelhos pelos piquetes.
O contrato estabelecido pelo sindicato que representa os artistas — Screen Actors Guild-American Federation of Television and Radio Artists (SAG-AFTRA, na sigla em inglês) — expirou à meia-noite desta quarta-feira (12/7), após uma prorrogação do prazo, que atrasou a possibilidade de uma grande greve em quase duas semanas.
O grupo se juntaria ao Writers Guild of America, sindicato dos roteiristas, que entrou em greve em 2 de maio depois de não conseguir chegar a um acordo com a Alliance of Motion Picture and Television Producers (AMPTP), que representa estúdios como Disney, Netflix, Amazon e Apple.
Tanto a SAG-AFTRA quanto a AMPTP disseram que não farão comentários enquanto as negociações de contrato estiverem em andamento.
Essa seria a primeira vez que sindicatos de roteiristas e atores entrariam em greve ao mesmo tempo desde 1960. À época, Ronald Reagan — que se tornaria presidente dos Estados Unidos em 1981 — era o líder do sindicato dos atores.
Um terceiro sindicato, o Directors Guild of America, que reúne os diretores, já negociou um novo contrato e não vai aderir à greve.
Dezenas de produções já foram interrompidas desde que os roteiristas entraram em greve, incluindo Stranger Things, Billions e Blade.
Se a greve de atores virar realidade, é possível que ocorram mais atrasos — e algumas atrações podem até ser canceladas.
Para o público, isso provavelmente significa que a próxima temporada de sua série favorita será adiada.
Embora algumas produções internacionais continuem, elas ficarão limitadas, porque o SAG-AFTRA representa mais de 160 mil artistas em todo o mundo — como a atriz e dramaturga britânica Phoebe Waller-Bridge, que falou sobre a greve na estreia do último filme de Indiana Jones em Londres.
"Realmente espero que possamos resolver essa questão. Roteiristas são as pessoas mais importantes nesta indústria", afirmou ela.
Os representantes dos atores dizem que os serviços de streaming não compartilharam os lucros obtidos, mesmo com a explosão de conteúdo de entretenimento oferecido pelas plataformas.
A busca interminável por novos assinantes é um modelo de negócios insustentável, argumentam eles, e os executivos dos estúdios estão recebendo salários enormes, enquanto muitos atores e roteiristas não conseguem ganhar a vida de forma decente.
Atores e roteiristas costumavam ganhar dinheiro com reprises na TV aberta. Eles recebiam um valor a mais toda vez que um filme ou programa em que trabalhavam era retransmitido. Isso permitia que esses profissionais sobrevivessem nos hiatos entre um projeto e outro.
Mas os serviços de streaming derrubaram essa dinâmica de Hollywood. Agora, atores e roteiristas ganham pouco ou nada quando alguém assiste o trabalho deles em um serviço de streaming — que tradicionalmente já paga menos do que as redes de televisão.
As negociações são conduzidas em segredo, então ainda não está claro quais são os pontos de discórdia (ou se um acordo entre as partes é iminente). Os membros dos sindicatos votaram a favor de uma greve de forma esmagadora se um acordo não for alcançado.
“Se eles pudessem nos substituir, já teriam feito isso há muitos anos”, apontou o escritor e ator Adam Conover durante um piquete na frente da sede da Netflix.
"Eles vão nos substituir por reality shows? Ou por estrelas do YouTube? Bem, eles podem tentar", disse ele, acrescentando que as pessoas ao redor do mundo ligam a TV para assistir a programas como Stranger Things e eventos esportivos.
Em um movimento surpresa, muitas das estrelas mais disputadas de Hollywood assinaram uma carta ao sindicato apoiando uma greve caso não seja possível obter um novo contrato "transformador" com os estúdios.
A carta — amplamente divulgada em Los Angeles — foi assinada por nomes como Meryl Streep, Mark Ruffalo, Jennifer Lawrence e Quinta Brunson. Até o momento, o documento reuniu mais de mil assinaturas, de acordo com a Deadline, uma publicação do setor.
Roteiristas e atores podem convergir para uma greve não apenas por melhores salários, mas também por restrições ao uso de inteligência artificial (IA) nas produções — o que eles classificam como uma ameaça "existencial".
Os atores dizem que a IA criaria um cenário apocalíptico, onde falsificações e celebridades que já morreram podem virar as estrelas de amanhã por meio de rostos e vozes gerados pelos computadores.
Para muitos no ramo, esse é um pensamento sombrio: um filme gerado sem equipes de filmagem, atores ou roteiristas envolvidos.
A influente musicista e artista Kim Gordon, fundadora do Sonic Youth e membro do Screen Actors Guild, disse que nunca consideraria permitir uma versão de IA de si mesma.
"É importante se preocupar com isso", afirmou Gordon durante um piquete na entrada da sede da Netflix. "Mas sinto que a IA nunca substituirá a criatividade."