O diretor Steven Soderbergh gosta de desafios. Ele escolhe seus trabalhos baseado nas dificuldades, encarando-os como um complexo problema matemático. Seu desejo febril por soluções só se equipara ao ritmo veloz com que filma, sempre lançando um filme ou série no ano.
A minissérie “Círculo fechado” (HBO Max) é um bom exemplo – talvez o maior – de seu processo criativo. O programa é uma enorme rede de histórias isoladas que, aos poucos, revelam uma ligação.
Soderbergh, estimulado pela premissa, assumiu a direção, a montagem e até a fotografia dos seis episódios. Apesar da dedicação, ele diz, a trama nunca pareceu sob controle.
“Eu me sentia perseguindo seis gatos ao mesmo tempo”, afirma o diretor. “Mesmo na reta final, nunca senti que tinha a história inteira em meus braços, pois sempre havia uma preocupação diferente.”
Quem assiste à minissérie entende rápido a situação descrita por Soderbergh. O círculo do título é amplo na quantidade de personagens, que vão de um famoso chef de cozinha a uma dupla de jovens imigrantes africanos. Há ainda uma mafiosa misteriosa, uma policial rebelde e o neto do chef.
Entre eles, o cenário de Nova York é a única constante na trama escrita por Ed Solomon, mas aos poucos mais conexões são reveladas. O resultado desastroso de um sequestro, no fim do primeiro episódio, dispara a longa rede de intrigas da minissérie.
“A questão principal é: se eu disser que vou te dar US$ 1 milhão para apertar um botão, e que isso vai machucar uma pessoa desconhecida do outro lado do mundo, o que você faria?”, diz Soderbergh. “É uma questão de carma, e acho isso muito atraente.”
Elenco multifacetado
A premissa, apesar de vaga e misteriosa, é terreno conhecido para Soderbergh e Solomon. A dupla trabalhou na série “Mosaic” (2018) e no filme “Nem um passo em falso” (2021), que também mostravam um coral de personagens em uma história cabeluda.
O diretor, por sua vez, está acostumado com elencos enormes desde os tempos de “Traffic” (2000) e “Onze homens e um segredo” (2001).
Mas “Círculo fechado” vai além na escala. “O desafio era conseguir com que todas as tramas diferentes funcionassem, e o público sentisse que estava tudo ao seu alcance, mas não sob seu controle”, afirma Soderbergh.
O cineasta demorou a achar o recorte da história que contemplasse esse balanço. Mesmo após conseguirem o orçamento com a HBO Max e até mesmo de gravarem, ele e Solomon continuavam a mexer no roteiro. Na pós-produção, os dois perceberam que era possível eliminar uma trama inteira sem afetar o andamento da minissérie.
A certa altura, o volume de páginas escritas por Solomon deixou Soderbergh desesperado. “Certa vez, estávamos almoçando e disse a ele: ‘Ed, isso é fisicamente impossível’”, lembra o diretor. “Gosto de trabalhar rápido, e só dava para filmar seis episódios com 400 páginas. A gente tinha 570. Disse a ele que não dava, que tínhamos que jogar algo fora.”
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Outra dor de cabeça foram os celulares. Segundo o diretor, criar trama de conexões sutis é tarefa difícil em um mundo onde qualquer personagem pode descobrir essas informações pelos aparelhos. A minissérie, não à toa, tem uma cena de suspense em que um dos personagens lida com a bateria baixa do telefone durante uma negociação.
“Antes dos celulares, a gente tirava tensão da falta de informação de um personagem, mas agora todo mundo sabe tudo. Há 20 anos, a gente poderia ter feito essa série em 10 episódios, mas agora sofremos para chegar a seis.”
O caos da escrita de “Círculo fechado” não afetou o elenco, porém. A atriz CCH Pounder, que vive a líder da máfia, diz que Soderbergh isolou os atores entre si para que se concentrassem nos papéis. Segundo ela, os roteiros individuais eram lineares e não mostravam as intersecções.
“Nós nunca tivemos o desafio de reunir todas as peças e imaginar a trama completa”, lembra a atriz. “Tudo que eles davam era a minha história e quem era afetado por ela, e isso simplificou o processo.”
Para Soderbergh, o grande prazer da criação está nisso, apesar dos poréns. “Fiquei ansioso, mas era o que precisava. Gosto de ter medo, preciso dele e de uma lata do (refrigerante) Dr. Pepper para tocar esses projetos.”
“CÍRCULO FECHADO”
(EUA, 2023) De Ed Solomon. Direção: Steven Soderbergh. Série disponível na HBO Max, em seis episódios. Com Timothy Olyphant, Claire Danes, Zazie Beets e CCH Pounder.
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