Misture a estética musical de Stravinsky, Schöenberg, Lupicínio Rodrigues, Béla Bartók e Jovem Guarda com poemas dos irmãos Haroldo e Augusto de Campos, Carlos Drummond de Andrade, João Cabral de Melo Neto, Paulo Leminski e só um pouquinho de Ezra Pound. O resultado nada mais é que a música de Arrigo Barnabé. 





Um dos principais nomes do movimento cultural Vanguarda Paulista, ao lado de Itamar Assumpção, Grupo Rumo, Premeditando o Breque, Isca de Polícia e Língua de Trapo, Arrigo se empenhou em criar estética própria, que transita do erudito ao popularesco, com toques de humor nas letras das canções e nas performances ao vivo.

Sua arte, contudo, vai além da música. Ao longo dos 71 anos – mais de 40 deles dedicados à carreira artística  –, ele lançou diversos discos (entre eles, o icônico “Clara Crocodilo”, de 1980), compôs trilhas sonoras de filmes como “Cidade oculta” (1986), de Chico Botelho, e “Ed Mort” (1997), de Alain Fresnot; escreveu roteiros e atuou em outros longas.
 

 

'Ocupação Arrigo'

Por causa de todo esse trabalho no campo artístico, o Centro Cultural Unimed-BH Minas promove uma espécie de “ocupação Arrigo Barnabé” a partir desta semana. Nesta quinta-feira (27/7), o espaço cultural abre o ciclo de cinema “Isso é Arrigo” e, no domingo (30/7), o artista faz show no teatro.




 
Serão exibidos os títulos “Nem tudo é verdade” (1986), de Rogério Sganzerla; “Ostinato” (2021), de Paula Gaitán; “Cidade oculta” (1986), de Chico Botelho; “Estrela nua” (1985), de Ícaro C. Martins e José Antônio Garcia; e “Passagem secreta” (2021), de Rodrigo Grota. São todos filmes com a participação de Arrigo, em distintas funções – no elenco, na produção, na trilha sonora ou no roteiro. 

No próximo sábado (29/7), o artista participa de sessão comentada de “Ostinato”, documentário sobre sua vida e obra. “Costumo dizer que o trabalho dele no cinema deveria ser visto e analisado como um elemento de sua carreira musical, porque a gente não sabe em que proporção o cinema o influenciou como músico”, afirma o curador da mostra, Samuel Marotta. 

“Se você escutar ‘Clara Crocodilo’ com os olhos fechados, vai perceber que é ‘O bandido da luz vermelha’ ali”, emenda, citando o clássico de Rogerio Sganzerla (1946-2004).
 

Arrigo no documentário 'Ostinato'

(foto: Reprodução)
 

O show que Arrigo apresenta no próximo domingo se intitula “Quero que vá tudo para o inferno” e é uma espécie de tributo à dupla Roberto e Erasmo Carlos (1941-2022). Trata-se de uma experimentação que Arrigo faz, partindo do repertório já conhecido do Rei e seu irmão camarada.

No palco, o músico é acompanhado por Paulo Braga (piano) e Sérgio Espíndola (violão), irmão de Tetê Espíndola. Sérgio, inclusive, conta com um número próprio durante a apresentação, no qual interpreta “Ternura antiga”, de Dolores Duran e José Ribamar. “É uma música que o Roberto adora”, assegura Arrigo Barnabé.




 
 
 
Valendo-se de sua característica de buscar sempre experimentar coisas novas na música, Arrigo vai tocar a canção que dá título ao show na mesma levada de “Take five”, de The Dave Brubeck Quartet.

“No momento em que Roberto e Erasmo lançaram ‘Quero que vá tudo para o inferno’, o The Dave Brubeck Quartet estava surgindo, nos EUA. E, de repente, essa música deles fez um tremendo sucesso. Escutando ela, me dei conta de que parecia com ‘Quero que vá tudo para o inferno’. E aí decidi fazer essa mistura”, conta Arrigo.

Já em “Eu te darei o céu”, ele levará referências de “Samba da bênção”, de Vinicius de Moraes. E, ao longo de toda a apresentação, entre uma música e outra, vai declamar versos e frases dos mais diversos poetas e escritores – até Roland Barthes entra no repertório de Arrigo.




 
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De Lupicínio a Roberto e Erasmo

A exploração de possibilidades nos arranjos musicais de outros artistas, entretanto, já é algo que Arrigo faz há algum tempo. Entre 2010 e 2011, por exemplo, apresentou releituras de canções de Lupicínio Rodrigues.

“A obra de Lupicínio é muito propícia para mim”, comenta o cantor. “Ela tem muitas possibilidades de interpretação. Dá pra você ser muito irônico, engraçado ou amargurado.” 

As canções de Roberto e Erasmo também possibilitam múltiplas interpretações, garante ele. Contudo, a escolha do repertório da dupla se deu muito mais por memória afetiva do que por qualquer outro motivo.

“O primeiro LP que comprei na minha vida foi o ‘Jovem Guarda’, de 1965, que tinha ‘Quero que vá tudo para o inferno’”, lembra Arrigo. “Na época, acho que estava de férias do colégio. Trabalhei um mês inteiro com meu pai, que era escrivão de cartório. Com o dinheiro que ele me pagou, dava para comprar só um LP. Estava em dúvida se comprava esse da ‘Jovem Guarda’ ou ‘Dois na Bossa’, com a Elis Regina e o Jair Rodrigues. Mas o da ‘Jovem Guarda’ acabou sendo irresistível”, emenda.





Todas as canções desse disco marcaram Arrigo. Voltar a elas novamente – o show em homenagem a Roberto e Erasmo foi concebido em 2019, mas acabou sendo suspenso durante a pandemia – é uma forma que ele encontra de ser de novo aquele garoto de 14 anos que ainda estava por descobrir uma série de caminhos na música.

Recorrer ao passado, aliás, é algo que Arrigo costuma fazer com certa frequência. “Estou relendo pela não sei qual vez ‘ABC da literatura’, do Ezra Pound”, diz, lembrando que o livro foi uma de suas influências para o disco “Clara Crocodilo”.

“QUERO QUE VÁ TUDO PARA O INFERNO”

Show de Arrigo Barnabé. Neste domingo (30/7), às 19h, no Centro Cultural Unimed-BH Minas (Rua da Bahia, 2.244, Lourdes). Ingressos: R$ 40 (inteira) e R$ 20 (meia), à venda na bilheteria do teatro ou no site Eventim. Mais informações: (31) 3516-1360.




 
 

Arrigo Barnabé no filme 'Cidade oculta'

(foto: Reprodução)
 

NA TELONA

Confira a programação da mostra “Isso é Arrigo”

HOJE (27/7)
14h - “Passagem secreta” (2022), de Rodrigo Grota
18h15 -  “Nem tudo é verdade” (1986), de Rogério Sganzerla
20h10 -  “Estrela nua” (1984), de  Ícaro C. Martins e José Antônio Garcia
 
SEXTA-FEIRA (28/7)
18h30 -   “Ostinato” (2021), de Paula Gaitán   
20h10 - “Cidade oculta” (1986), de Chico Botelho. Sessão comentada pelo crítico e pesquisador João Campos

SÁBADO (29/7)
17h - “Ostinato” (2021), de Paula Gaitán. Sessão comentada por Arrigo Barnabé
20h - “Nem tudo é verdade” (1986), de Rogério Sganzerla

DOMINGO (30/7) 
14h - “Passagem secreta” (2022), de Rodrigo Grota
18h30 - “Cidade oculta” (1986), de Chico Botelho
20h10 - “Estrela nua” (1984), de  Ícaro C. Martins e José Antônio Garcia

* Todas as exibições serão realizadas na Sala 1. Ingressos à venda por R$ 2, na bilheteria do cinema, todos os dias, das 10h às 20h30.

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