A atriz Scarlett Johansson em cena de Asteroid City

Scarlett Johansson é um dos grandes nomes de Hollywood que fazem ponta de luxo na história sobre cidadezinha acuada por ameaça alienígena

Universal Pictures/Divulgação


Ame ou odeie, Wes Anderson é um dos diretores mais inconfundíveis a surgir em Hollywood nas últimas décadas. Seu humor nonsense, os cortes rápidos, as câmeras que deslizam, os elencos homéricos, a fotografia simétrica e a trilha sonora aguçada são todas marcas registradas que ajudam o cineasta a imprimir identidade à sua obra.

Mais importante do que isso talvez seja a direção de arte, que aproxima os filmes de uma casa de bonecas em tamanho real. Em "Asteroid City", em cartaz nos cinemas, ele põe a boneca da vez, Margot Robbie ("Barbie"), em uma de suas delicadas e coloridas maquetes.

Exibida no Festival de Cannes, a trama se passa numa cidadezinha perdida no meio de um deserto americano, na qual tipos diferentes ficam presos quando o governo detecta o que seria uma invasão alienígena.



No elenco, volta a empregar grandes astros de Hollywood como coadjuvantes de luxo, com Tom Hanks, Scarlett Johansson, Bryan Cranston, Steve Carell e Hong Chau disputando a tapa os 105 minutos de filme, pelos quais também brigam seus atores-fetiche, Jason Schwartzman, Edward Norton, Jeffrey Wright, Tilda Swinton, Adrien Brody, Jeff Goldblum e Willem Dafoe.

Assim, "Asteroid City" vem dividindo a crítica de forma um tanto ambígua. Quem gostou viu no longa o estilo de Anderson elevado à máxima potência, confirmando a coerência de sua obra. Quem detestou acha que ele está justamente confinado à fórmula, como se tivesse se tornado uma paródia de si mesmo.

Mas novamente: ame ou odeie, fato é que "Asteroid City" só podia mesmo ter sido enquadrado pelas lentes de Anderson.



O filme ecoa os tons terrosos de "Moonrise Kingdom", o clima apocalíptico de "Ilha dos cachorros", os pastéis de "O Grande Hotel Budapeste", a inversão de papéis entre adultos e crianças de "Os excêntricos Tenenbaums", e "Três é demais", "Viagem a Darjeeling", "O fantástico Sr. Raposo", "A Crônica Francesa" e "Pura adrenalina" de muitas formas.

Seu Jorge 

Repete, até, o uso do músico brasileiro Seu Jorge, que aqui aparece de forma mais fugaz que em "A vida marinha com Steve Zissou", quando recheou a trilha sonora com versões em português, mas não traduções, para as canções de David Bowie.

"O que eu percebo de mais especial na estética do Wes Anderson é a forma como ele provoca o espectador. Seus filmes são uma experiência estética", diz Mariana Villas-Bôas, diretora de arte de títulos como a série "Independências", de Luiz Fernando Carvalho, outro nome com uma estética marcada pelo excesso.

"É como ir ao museu e observar quadros de Magritte e Dalí, que nos colocam diante de objetos do cotidiano a partir de um novo ponto de vista. É um mergulho sensorial, que se aproxima do sonho e do teatro, nos apresentando a um universo novo e surpreendente."
Essa capacidade de encantamento, de fugir do óbvio, ajudou a estética de Anderson a viralizar nas redes sociais, em especial no TikTok, nos últimos meses. Foram vários os usuários que fizeram pequenos vídeos em que momentos banais eram transformados em cenas romantizadas e caricatas.

A "Wes Anderson Trend", como foi batizada a mania, bombou na internet, em vídeos de anônimos gravados com a ajuda de filtros hiper-saturados, rostos inexpressivos, câmeras que se aproximam e se afastam sem aviso e acompanhados de trilhas de Alexandre Desplat, o compositor favorito do cineasta.

Assim, milhares viralizaram ao copiar o delicado balé que compõe sua filmografia e renderam, só no TikTok, 2,3 bilhões de visualizações para a hashtag Wes Anderson.

Restritos a imagens imóveis, outros também geraram memes ao usar a inteligência artificial para imaginar como seriam filmes e séries populares caso seguissem a receita colorida e excêntrica de Anderson. No YouTube, compilações de imagens como essas vão de "Harry Potter" a "Homem-Aranha".

Para Villas-Bôas, isso se dá porque o texano foi capaz de criar um imaginário estético único, em que códigos e signos convergem para construir uma narrativa. Ela compara a técnica ao trabalho de um arquiteto, que precisa ornar elementos que vão do tijolo à tinta.

"O espectador é provocado a olhar para uma determinada situação ou objeto a partir de uma outra perspectiva. É como pôr uma lente de aumento sobre algo, ampliando as possibilidades de reflexão. A invenção de um universo estético é enriquecedora, para criadores e espectadores", afirma.

Assim, Anderson foi capaz de criar uma grife própria, com uma assinatura forte e que, assim sendo, tanto atrai quanto repele o público, a depender de seus gostos. Afetação, afinal, não é para todos.

Com suas sete indicações ao Oscar e as várias passagens por festivais de cinema, o cineasta se firmou como um diretor de filmes autorais e já trabalha em seu próximo projeto. "A maravilhosa história de Henry Sugar", que acaba de ter sua primeira imagem divulgada, vai repetir a fórmula, compilando diferentes histórias de um livro, a exemplo das seções de revista que separavam e costuravam "A Crônica Francesa".

Até lá, o lançamento de "Asteroid City" deve servir de combustível para videozinhos em meio a cenários artificialmente adoráveis, que têm sua estaticidade interrompida por objetos aleatórios que invadem a tela quando menos se espera.

 “ASTEROID CITY”
• (EUA, 2023, 105 min.) Direção: Wes Anderson. Com Elenco Scarlett Johansson, Tom Hanks e Jason Schwartzman.
• Em cartaz em salas dos complexos Cineart e Cinemark, no UNA Cine Belas Artes e no Centro Cultural Unimed-BH Minas.