Ana Carolina Oliveira, mãe de Isabella Nardoni, em cena do documentário Isabella: O caso Nardoni

Ana Carolina Oliveira, mãe de Isabella Nardoni, abre o documentário dirigido por Claudio Manoel e Micael Langer. Quinze anos após a tragédia, o crime ainda está cercado de dúvidas

Netflix/Divulgação

Em 20 de junho, Anna Carolina Jatobá deixou a Penitenciária Feminina Santa Maria Eufrásia Pelletier, em Tremembé, interior de São Paulo, após a Justiça conceder progressão para o regime aberto. Alexandre Nardoni continua preso, também em Tremembé, na Penitenciária Dr. José Augusto César Salgado, onde cumpre pena no regime semiaberto.

Quinze anos após a condenação pela morte de Isabella Nardoni, enteada dela e filha dele, os dois continuam sendo um casal. Mesmo com o período na cadeia (ela foi condenada a 26 anos, ele a 31) nunca mudaram uma vírgula do que afirmaram durante o julgamento, em março de 2010. Afirmam ser inocentes.

Não há, no Brasil deste milênio, um crime com tamanha repercussão do que o caso Isabella Nardoni, a menina de 5 anos que, em março de 2008, foi jogada da janela do sexto andar do prédio onde seu pai morava com a nova companheira e os dois filhos pequenos do casal. A discrição dos condenados não gerou, ao longo deste tempo, tantas notícias como a do trio responsável por outro crime célebre, do casal Richthofen (2002).
 

Ainda assim, há muito o que dizer sobre o crime. Com estreia amanhã (17/8), na Netflix, o documentário "Isabella: O caso Nardoni" revira o caso do avesso. Mesmo que não tenha conseguido nenhuma declaração de Jatobá e Nardoni e seus familiares (após várias tentativas), o longa conta com fortes depoimentos. Foi produzido sob sigilo, e só muito próximo do lançamento a plataforma começou a anunciar o projeto.

 

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Simonal e Chacrinha

Dirigido por Claudio Manoel (o ex-Casseta) e Micael Langer, dupla que lançou os documentários "Simonal – Ninguém sabe o duro que dei" (2009), "Chacrinha –  Eu vim para confundir e não para explicar" (2021) e a série "Meu amigo Bussunda" (2021), o filme traz algumas cartas na manga.

A começar pelo extenso depoimento da mãe de Isabella, Ana Carolina Oliveira. É a fala dela, acompanhada de sua mãe, Rosa, e da sobrinha Giovanna (da mesma idade que Isabella), que abre o documentário. Neste momento, ela não comenta sobre o crime, mas sim as lembranças da gravidez precoce (tinha 17 anos), de imagens do parto (com Alexandre Nardoni acompanhando cada momento) etc.
 
O efeito emocional é forte, e ele vai continuar em outros momentos do longa, que intercala personagens da família, e profissionais envolvidos na investigação e no julgamento. A equipe trabalhou com um material enorme – 5 mil fotos, 6 mil páginas de processo, 118 horas de entrevistas. Para ilustrar depoimentos de policiais e peritos, foi construída em estúdio, em tamanho real (92 m2) a planta do apartamento do casal Nardoni, em Osasco.

Dois especialistas no caso – o jornalista Rogério Pagnan, autor do livro "O pior dos crimes – A história do assassinato de Isabella Nardoni", e a criminóloga Ilana Casoy, autora de "A prova é a testemunha" e "Casos de família – Arquivos Richthofen e Arquivos Nardoni" – atuaram como consultores do projeto.
 
 

Passada uma década e meia, a tragédia é revista de uma forma diferente do sensacionalismo com que foi coberta pela imprensa. A própria é colocada em xeque várias vezes, lembrando absurdos que houve na cobertura – como um detector de mentiras colocado em um programa de TV em cima da polêmica entrevista que os Nardoni deram ao "Fantástico".
 
O documentário tenta ainda contrapor as versões da acusação e da defesa, ouvindo o promotor Francisco Cembranelli (que se tornou uma estrela na época, como mostrar as imagens das várias entrevistas que ele concedeu à TV) e o advogado Roberto Podval.

Banheiros químicos para a 'plateia'

Recupera, minuto a minuto, tudo o que ocorreu no edifício nos 15 minutos que mostram a chegada da família até a descoberta da menina, ainda viva, jogada da janela. Relembra detalhes que ninguém mais deve se dar conta, como o depoimento do casal à polícia, marcado no dia do aniversário de Isabella.
 
As imagens mostram que foram colocados até banheiros químicos em frente à delegacia para atender à massa de gente que foi ver de perto a chegada da dupla.
 
Ou então a decisão do juiz que presidiu o julgamento, de colocar caixas de som na frente do tribunal para que a multidão de populares pudesse ouvir o veredito. 

Pior ainda é ouvir Ana Carolina, a mãe, contar como ela passou os quatro dias isolada em um quartinho do tribunal durante o julgamento – ela foi colocada ali a pedido da defesa, que poderia chamá-la (e não a chamou) para um depoimento.

Mesmo com tantas armas, e fazendo o uso delas corretamente, o filme não avança sobre o que realmente aconteceu na noite de 29 de março de 2008. Só os dois condenados têm essa resposta – e eles, já está mais do que provado, não irão falar sobre isto.

“ISABELLA: O CASO NARDONI”

• (Brasil, 2023, 104min., direção de Cláudio Manoel e Micael Langer).  O documentário estreia nesta quinta (17/8), na Netflix