Cento e vinte e cinco mil tijolos produzidos em uma olaria doméstica. Em 16 de fevereiro de 1957, um município de 10 mil habitantes, com somente 34 anos de emancipação, ganhou um cinema com dois andares – e pouco mais de 600 assentos.  Um dos marcos da cidade de Coromandel, no Vale do Paranaíba, o Cine União, desativado há três décadas, mas tombado e bem conservado, é parte da memória afetiva dos habitantes da cidade mineira. 





Em especial da jornalista Maria do Rosário Caetano, que dedica o livro "Coromandel centenária – Memória e afetos" (Editora Livramento) à memória de seus pais, Mariana Caetano Cruvinel e Geraldo Caetano – este último foi um dos quatro empreendedores que ergueram o cinema.

Há mais de meio século fora de sua terra natal, Rosário, uma das mais experientes jornalistas de cinema do país, diz que estava em dívida com a sua cidade. Com lançamento neste sábado (2/9), na Casa da Cultura, a obra, organizada por ela, celebra o centenário de Coromandel, emancipado de Patrocínio em 7 de setembro de 1923. É um livro-mutirão, diz Rosário, dada a quantidade de pessoas (coromandelenses e não) envolvidas. São quase 20 pessoas que escreveram os textos – ora memórias, ora perfis. 

Música e diamantes

Além de recuperar a trajetória da cidade – em texto de Ernane Borges Diniz, o historiador local –, o livro celebra seus filhos diletos. O mais célebre é o compositor e clarinetista Abel Ferreira (1915-1980), referência no choro. Também na seara da música, outro destaque é Goiá (1935-1981), compositor e radialista ligado ao universo caipira e autor de "Saudade de Coromandel", hino afetivo local.





Vários personagens da cidade são destacados, como Joaquim Venâncio Tiago. O livro reproduz reportagem de João Eustáquio, publicada na extinta revista "Manchete" de 1969, contando a história do homem, na época com 85 anos, que havia encontrado, na juventude, o terceiro maior diamante do mundo – de nome Getúlio Vargas, tinha 726 quilates e foi vendido em 1938 por 2,1 mil contos de réis, uma fortuna naqueles anos.

"Hoje a cidade é um polo agropecuário, mas, na nossa época, era um polo de diamantes", comenta Rosário. Fato é que Coromandel também gerou muitos jornalistas que fizeram carreira em São Paulo, Rio ou Brasília. Entre eles estão Álvaro Rodrigues Pereira, Tereza Cruvinel (que escreveu texto sobre a origem da cidade, terra dos kayapó) e Valderez Caetano, além do supracitado João Eustáquio.  

Com muitas fotos antigas, o livro reuniu duas delas na capa: uma é da década de 1920, de uma professora e seus alunos – o menor é Abel Ferreira; a outra é do velório de Goiá, em janeiro de 1981, que parou a cidade. Na imagem, vemos a população em frente à Matriz de Santana, mais antiga do que o próprio município.
 

Velório do músico Goiá entrou para a história de Coromandel

(foto: Letramento/reprodução)
 

Cinema Novo

Neste retorno a Coromandel, Rosário fala das próprias lembranças. Foi no cinema fundado por seu pai – "sofisticadíssimo, com equipamento de última geração" – que ela descobriu os filmes nacionais. Assistiu do "poleiro", como foi apelidado o mezanino do Cine União, a filmes como "Vidas secas" (Nelson Pereira dos Santos, 1963)  e "A hora e a vez de Augusto Matraga" (Roberto Santos, 1965).




 
"É um espanto, mas vi o Cinema Novo lá. Era uma época em que o cinema brasileiro chegava ao interior", comenta Rosário, que sonha em ver a antiga sala dos anos 1950 como espaço multiuso na Coromandel da atualidade.

(foto: Reprodução)
“COROMANDEL CENTENÁRIA - MEMÓRIAS E AFETOS”

• Organização de Maria do Rosário Caetano
• Editora Letramento
• O lançamento será neste sábado (2/9), a partir das 16h, na Casa da Cultura, Rua Rio Branco, 1.000, Coromandel. R$ 60 (na tarde de autógrafos) e R$ 80 (no site editoraletramento.com.br) 

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