Moacyr Luz e Samba do Trabalhador

Moacyr Luz e Samba do Trabalhador trazem a famosa roda de samba do Andaraí para o palco da Serraria Souza Pinto

Marluci Martins/divulgação

O desejo de realizar um evento com “a cara o Brasil, democrático e plural” orientou a curadoria e o próprio nome da atração que estreia neste sábado (9/9), na Serraria Souza Pinto, a partir das 14h. O Festival Caramelo – alusão ao vira-latas encontrado em todas as regiões do país, sucesso nas redes sociais – debuta em grande estilo, com programação até a madrugada de domingo.

Com foco no samba e no pagode, mas com a proposta de misturar gêneros indistintamente, o festival vai contar com shows de Pagode das Mina, Orquestra Atípica de Lhamas com Felipe Cordeiro, Toninho Geraes, Jorge Aragão, Moacyr Luz e Samba do Trabalhador, Marcelo D2 e Péricles. Fechando a maratona, KL Jay, o DJ do Racionais, divide o palco com Djonga. Intercalando as apresentações, os DJs Narciso, Naroca e Sleep comandam as picapes.

Concebido pelos empreendedores culturais Felipe Aguilar, Lucas Costa, Eduardo Barbosa, Leonardo Moreira e Felipe Ramos, o Caramelo nasce para abolir segmentações, tendo como baliza o mais brasileiro dos ritmos – com atenção especial para a heterogeneidade do universo do samba e do pagode.

Marcelo D2 no palco

Marcelo D2 lança o disco 'Iború', inspirado em Clementina de Jesus e nas ideias de Luiz Antônio Simas

Caiano Midani/divulgação

Um panorama do samba

O recorte temporal orientou a curadoria, diz Lucas Costa. “A gente tem desde o samba que vem da década de 1980, com Jorge Aragão e Moacyr Luz, passando pelos anos 1990, com Péricles, e chega aos dias atuais, com o trabalho mais recente do Marcelo D2, classificado por ele como novo samba tradicional”, aponta.

Na definição dos artistas participantes, pesou também o gosto pessoal dos produtores. “Basicamente, chamamos quem gostaríamos de ouvir nesta primeira edição”, explica o curador. A estrutura montada em toda a área da Serraria Souza Pinto, com capacidade para 7,5 mil pessoas, previa inicialmente dois palcos, um deles na área externa. Devido à possibilidade de chuva, manteve-se apenas o palco na parte coberta. Haverá praça de alimentação e espaços para exposições e atividades interativas.

O foco no samba e no pagode reflete o bom momento de ambos em Belo Horizonte e no Brasil, diz Lucas Costa. “O samba tem oscilações, agoniza mas não morre, como dizia Nelson Sargento”, comenta. “Ter a cumbia da Orquestra Atípica de Lhamas, a guitarrada paraense do Felipe Cordeiro e o rap de KL Jay e Djonga dá uma cara de festival mesmo, com diversidade, o caminho natural que eventos desse tipo têm seguido.”
 

D2 chega a BH trazendo frescor ao Caramelo, pois acaba de lançar o álbum “Iború”. Sem se distanciar das batidas do hip hop predominantes em sua discografia, ele mergulha nas águas profundas do samba no show “Marcelo D2 e um punhado de bamba”.

O rapper já havia transitado por essa seara com o álbum dedicado a Bezerra da Silva, lançado em 2010, mas agora apresenta trabalho autoral, gestado com parceiros diversos. D2 destaca que é a primeira vez em que se aventura como compositor de samba, embora o gênero o acompanhe há muitos anos.

“Este trabalho foi muito natural, é algo que já estava dentro de mim”, diz, destacando as parcerias. “Contei com muita gente fazendo samba comigo: Zeca Pagodinho, Xande de Pilares, Márcio Alexandre, do grupo Fundo de Quintal. Enfim, uma galera de peso. Eu não chegaria a esse lugar sozinho, porque o samba tem a coisa comunitária de abraçar, de fazer junto”, ressalta.
 
 

De Clementina a Kendrick Lamar

Clementina de Jesus foi grande inspiração para “Iború”, mas o encontro com o escritor, pesquisador e compositor Luiz Antônio Simas (coautor de duas faixas) e o trabalho com Nave e Kiko Dinucci – dois dos produtores do álbum – também ajudaram a moldar a sonoridade que o público ouvirá no Festival Caramelo. “Também estive muito ligado nos graves com que Tyler the Creator e Kendrick Lamar trabalham”, revela.

Além do novo disco, o show de D2 terá músicas de sua discografia, além de versões de sambas de Zeca Pagodinho e Leci Brandão. Tudo embalado pela sonoridade de “Iború” – diferente de tudo o que ele havia feito, aponta o carioca.

“Na década de 1990, a gente já falava da importância de achar um som próprio. Consegui fazer isso algumas vezes na vida, e agora cheguei de novo neste lugar com um samba urbano, contemporâneo, o novo samba tradicional”, ressalta.
 
Cantor Péricles

Péricles diz que samba e pagode vivem bom momento em todo o Brasil

Caramelo/divulgação
 

Péricles mostra seu 'Calendário'

Péricles também divulga novo trabalho, o álbum “Calendário”, que estreia nas plataformas neste segundo semestre. O show no Caramelo, contudo, terá caráter mais retrospectivo. O veterano se diz entusiasmado em mostrar para novas plateias os sucessos que marcaram sua trajetória.

“É sempre bom cantar para o público que ainda não conhece nosso som, nossa maneira de fazer música, e que vai parar para nos ouvir. Vamos mostrar músicas do 'Calendário', relembrar sucessos, coisas do 'Céu lilás' (lançado em 2021), indicado ao Grammy Latino, e tudo mais que vivi na minha estrada, inclusive da época do Exaltasamba”, adianta.

Péricles considera que o samba e o pagode estão em alta em todo o Brasil, apontando a crescente profissionalização do segmento. “A gente vê os artistas chegando melhor, mais bem equipados, melhor trajados, cuidando da aparência. Todos com mais saúde, fazendo com que o público se espelhe neles. A mudança é essa: um olhar mais profissional para o trabalho”, diz o cantor e compositor, que, aliás, está de regime e já perdeu 40kg.

Moacyr Luz também comemora o aumento expressivo do público interessado em samba e pagode. E toma Minas Gerais como exemplo disso.
 
“É um estado que tinha o timbre de Milton Nascimento e da turma  fabulosa do Clube da Esquina. De repente, o samba foi crescendo, reunindo a juventude, mostrando talentos como o saudoso Mestre Jonas (1976-2011), Dé Lucas, Dudu Nicácio, moçada muito forte. Isso se repete em outras cidades brasileiras, que abraçam o samba de uma forma respeitosa”, destaca.
 
Djonga

O rapper mineiro Djonga vai mostrar que também tem samba no pé

Alexandre Guzanshe/EM/D.A Press
 

Autêntico da gema

Ao comentar o projeto carioca Samba do Trabalhador (roda que criou e comanda há 18 anos no Clube Renascença, no Andaraí, sempre às segundas), Moacir diz que a iniciativa evolui porque mantém o propósito original.

“A palavra resistência nos veste bem. A gente não abre a guarda em relação a fazer samba autêntico. É o caminho que a gente escolheu trilhar, principalmente depois que o grupo, por decisão coletiva, resolveu apostar exclusivamente no meu repertório”, explica.

Compositor prolífico, Moacyr promete apresentar uma síntese de quase duas décadas de produção autoral. “Estamos em estúdio mixando o disco novo do Samba do Trabalhador. Além dos clássicos, como 'Vida da minha vida', tem coisas novas neste show. Acho lindo demais Belo Horizonte ter um festival com esse foco, pois mostra como o estilo está vibrante na cidade”, diz.

De um ano para cá, o carioca gravou cerca de 60 músicas em projetos diversos, ao lado de Douglas Lemos, Rogério Batalha, Pierre Aderne e Paulinho Pauleira, que faz parte do MPB-4. “Sigo trabalhando. Minha vida é compor. O disco novo do Samba do Trabalhador deve estar disponível até o final de outubro, com participações especiais de Joyce Moreno, Pedro Luís, Xande de Pilares e Marina Íris, que é uma revelação”, adianta.

Moacyr gravou cinco discos com o Samba do Trabalhador – três ganharam o Prêmio da Música Brasileira. Ele e seu grupo estrelam o documentário “A cara do Brasil”, lançado em março, com roteiro da jornalista Bia Aparecida. Gravado no Clube Renascença, o filme traz entrevistas com os integrantes da famosa roda carioca sobre as mudanças na música popular brasileira ao longo dos tempos.

Previsto para outubro, o longa-metragem “Moacyr Luz – O embaixador dessa cidade” mostra a profusão de projetos do compositor, de 65 anos. “Estou com um samba classificado no Paraíso do Tuiuti para o carnaval do ano que vem. É meu sexto ano seguido com eles. Também estou disputando com outro na Mangueira. Adoro sambas-enredo”, ressalta o carioca.

PROGRAMAÇÃO

» 14h: DJ Narciso
» 15h: Pagode das Mina
» 15h30: DJ Narciso
» 16h30: Orquestra Atípica de Lhamas e Felipe Cordeiro
» 17h30: DJ Narciso
» 18h: Toninho Geraes
» 19h: DJ Narciso
» 20h: Jorge Aragão
» 21h: DJ Narciso
» 21h40: Moacyr Luz e Samba do Trabalhador
» 22h40: DJ Naroca
» 23h30: Marcelo D2 e Um Punhado de Bamba
» 0h: DJ Sleep
» 1h15: Péricles
» 2h30: KL Jay e Djonga

FESTIVAL CARAMELO

Neste sábado (9/9), a partir das 14h, na Serraria Souza Pinto (Avenida Assis Chateaubriand, 889, Centro). Pista: R$ 220 (inteira), R$ 110 (meia para estudantes) e R$ 110 (meia-entrada social). Open bar: R$ 300 (preço único). Informações: https://www.instagram.com/festivalcaramelobh/