Casebre na zona rural de Araçuaí O diretor Marco Antônio Pereira

A zona rural de Araçuaí é um dos prováveis locais em que o longa será rodado, quando obtiver seu orçamento completo

Marco Antônio Pereira/Divulgação


Vencedor do prêmio de melhor projeto no 14º Brasil CineMundi – International Coproduction Meeting, realizado durante a 17ª CineBH - Mostra Internacional de Cinema de Belo Horizonte, na última semana, “Paisagem de inverno” traz uma questão cara a quem nasceu no interior e se mudou para grandes cidades, em busca de vida melhor.
 
O filme do mineiro Marco Antônio Pereira, produzido em parceria com Marcelo Lin e Rodrigo Meireles, da Abdução Filmes, ainda está em fase embrionária, mas já conta com roteiro pronto, centrado no dilema de uma jovem moradora da zona rural de Araçuaí, no Norte de Minas, que, perto de completar 18 anos, se vê impelida a sair da cidade, em busca de melhores condições de trabalho. 

O dilema, contudo, se dá porque a jovem protagonista tem uma irmã tetraplégica, que precisa de seus cuidados.
 

"Subindo para o Norte de Minas, a vegetação é seca o ano inteiro. Só que essa vegetação não está morta. Ela fica seca, esperando a chuva para ficar verde de novo. O filme é sobre isso: mesmo numa paisagem de seca, com muitos contratempos, a esperança ainda está viva dentro das pessoas que moram ali"

Marco Antônio Pereira, diretor

 
 
Tratando-se de uma história que se passa em um local quente, árido e poeirento, por que o nome do filme é “Paisagem de inverno”? 

“Esse título sugere um ambiente gélido, com uma neve caindo, né?”, comenta Pereira. “Mas a verdade é que, subindo para o Norte de Minas, a vegetação é seca o ano inteiro. É como se fosse uma paisagem de inverno o ano todo. Só que essa vegetação não está morta. Ela fica seca, esperando a chuva para ficar verde de novo. O filme é sobre isso: mesmo numa paisagem de seca, com muitos contratempos, a esperança ainda está viva dentro das pessoas que moram ali”, afirma o diretor.

Mudança para o cinema


Ainda que se trate de uma obra de ficção, “Paisagem de inverno”, em certo ponto, se confunde com a história do próprio diretor. Natural de Cordisburgo, terra de Guimarães Rosa, Pereira se mudou para Belo Horizonte quando terminou o ensino médio, em 2005, para estudar jornalismo. No entanto, ao entrar num cinema pela primeira vez, aos 19 anos, decidiu mudar de profissão.

Ele terminou o curso de jornalismo, é verdade, mas, logo na sequência, começou a estudar cinema e voltou para Cordisburgo, onde trabalhou como videomaker de um projeto social de um dentista da região. Por causa desse trabalho, percorreu o Norte e o Nordeste do estado.

“Nessas regiões, há comunidades que não têm muitas oportunidades para os jovens. A única chance que um jovem que chega aos 18 anos tem é sair dali”, diz. “Ou esse jovem vai para uma cidade maior estudar ou fica para trabalhar em alguma fazenda da região.”
 
Entre 2017 e 2018, Pereira começou a trabalhar em produções autorais. Com os amigos Marcelo Lin e Rodrigo Meireles, fundou a Abdução Filmes e gravou uma série de curtas-metragens em Cordisburgo contando histórias locais e tendo como atores pessoas da própria cidade.
 
“Paisagem de inverno” é uma espécie de continuação dessa série iniciada há aproximadamente cinco anos. A diferença é que, em vez de fazer mais um curta, Pereira resolveu dar um passo mais ousado e se lançar na produção de um longa-metragem, afinal, “os longas é que estão na indústria de verdade”, diz ele.


Corrida do Lítio 

Para além do impasse vivido pela protagonista, o cineasta inseriu no roteiro questões que preocupam moradores locais, como a chamada Corrida do Lítio, projeto de exploração do mineral patrocinado pelo governo do estado, que promete fazer do Jequitinhonha uma espécie de “vale da prosperidade”. O receio dos moradores é com a possível - e provável - desapropriação.
 
“A gente incorpora isso no filme. Na história, chega uma empresa para explorar ouro e lítio naquela região. Com a chegada dessa empresa, talvez muitas pessoas, inclusive a própria família da protagonista, sejam desapropriadas, porque como é a realidade de muitas comunidades, as pessoas não têm o registro de sua própria casa.”
 
Com a vitória de melhor projeto no Brasil CineMundi, Pereira arrecadou R$ 15 mil em serviços de finalização, R$ 15 mil em serviços de pós-produção, 800 euros em tradução do roteiro do português para o francês e R$ 15 mil em serviços de locação de equipamentos de iluminação, acessórios e maquinaria.

O próximo passo, diz ele, é entrar em algum edital para tentar viabilizar o filme.
“Faço todos os meus filmes com a comunidade e com meus amigos. Então, tento continuar nesse método de trabalhar com atores não profissionais, convidando pessoas para atuarem ali, tentando criar um universo original”, diz Pereira. “O cinema já está atrelado à minha vida. Quero continuar fazendo isso.”