banhistas na praia de Copacabana

Vista aérea da praia de Copacabana; escritor aborda em seu livro a "ênfase final do mar como fator tão legítimo e necessário na explicação do Brasil" e a coteja com a visão "terrestre", até hoje predominante nas interpretações

Mauro Pimentel 10.9.2023/ AFP

Analisar a formação do pensamento brasileiro por meio do espaço, com ênfase na terra e no mar, é o que o ensaísta e diplomata mineiro Luiz Feldman propõe no livro “Mar e sertão – Ensaio sobre o espaço no pensamento brasileiro”, da Topbooks Editora, cujo lançamento em Belo Horizonte será neste sábado (7/10), na Quixote Livraria.

Feldman se debruça sobre o pensamento de Joaquim Nabuco (1849-1910), Manoel de Oliveira Lima (1987-1928), Gilberto Freyre (1900-1987) e Sérgio Buarque de Holanda (1902-1982).

“Esse livro é uma espécie de releitura do conjunto do pensamento brasileiro”, resume o autor. “Claro que é baseado em apenas quatro autores. Portanto, não é um tratado, não é um livro que quer exaurir o assunto, e sim um ensaio que quer se aproximar do pensamento brasileiro de 1870 a 1970”, explica.

O que inicialmente pode parecer uma proposta complexa e de difícil assimilação mostra-se clara à medida em que Feldman discorre suas ideias ao longo do projeto. Para ele, Nabuco e Freyre são os representantes da vertente marítima, que entende a formação brasileira a partir do tráfico de negros escravizados.

Conforme destaca o autor, para Freyre, “os senhores e os escravizados à beira-mar é que teriam criado, mais que os bandeirantes, um Brasil autêntico em profundidade”.

“Essa ênfase final do mar como fator tão legítimo e necessário na explicação do Brasil evidencia o intuito de Gilberto Freyre de questionar a fórmula taxativa da primazia do planalto sobre a costa”, ressalta Feldman.
 

Sertanejos e bandeirantes 

A referência aos bandeirantes, no entanto, se dá porque Manoel de Oliveira Lima e Sérgio Buarque de Holanda – que, para Feldman, são os representantes da vertente terrestre da formação do pensamento brasileiro – defendiam a ideia de que a chave para a compreensão da formação do Brasil contemporâneo é o estudo dos sertanejos e dos bandeirantes.

“O Sérgio Buarque, por exemplo, em outras obras dele para além de ‘Raízes do Brasil’, diz que a chave para interpretar o país é a formação sertaneja, ou seja como os bandeirantes entraram e escravizaram, e como o território foi moldado por uma dinâmica de terra”, conta. “Ou seja, para ele, a sociedade foi moldada a partir de uma dinâmica terrestre, de conquista de espaço que o Brasil ocupa na América do Sul”, emenda.

Assim, ao invés de apresentar os pensamentos de Nabuco, Oliveira Lima, Freyre e Sérgio Buarque de Holanda de modo cronológico, o livro é dividido em duas partes: “Mar” e “Sertão”. Na primeira, estão os pontos de vista de Nabuco e Freyre; na segunda, os de Oliveira e Lima e Buarque de Holanda.
 

Outros países têm seu grande livro do mar. Os Estados Unidos, por exemplo, têm 'Moby Dick', de Herman Melville; Portugal tem 'Os lusíadas', de Camões. Enfim, países abertos para o mar têm seus grandes autores marítimos. No Brasil, isso não é muito evidente, ao passo que os autores de terra são mais patentes

Luiz Feldman, escritor e diplomata

 

“Mar e sertão – Ensaio sobre o espaço no pensamento brasileiro”, conta Feldman, nasceu de sua insatisfação diante da maneira como o território marítimo era pouco levado em consideração nas análises sociais da formação do Brasil.

“Quando você começa a refletir sobre o pensamento brasileiro, percebe que ele conta e aborda a nossa história em terra”, destaca Feldman. “Repare que um dos grandes livros de pensamento brasileiro do século 20 – no campo da literatura, que acaba sendo indissociável à sociologia – se chama ‘Os sertões’, do Euclides da Cunha. Mas qual o grande livro do mar?”.

“Outros países têm seu grande livro do mar. Os Estados Unidos, por exemplo, têm ‘Moby Dick’, de Herman Melville; Portugal tem ‘Os lusíadas’, de Camões. Enfim, países abertos para o mar têm seus grandes autores marítimos. No Brasil, isso não é muito evidente, ao passo que os autores de terra são mais patentes”, afirma Feldman.

“Agora, tem uma série de autores que procuram contar essa história fora da terra, ou seja, no mar. Então, ler esses autores me ajudou a tentar reparar que existe um pouco uma dualidade e não uma unidade. Isto é, o pensamento brasileiro não explica tudo só por terra”, afirma, citando Freyre e Nabuco.

Feldman, no entanto, entende que essa percepção – de desconsideração do território marítimo na formação do Brasil – tende a mudar, sobretudo agora que artistas e filósofos têm abordado com mais ênfase questões como ancestralidade e diáspora africana.

“Acho que, sem dúvida, há uma importância cada vez maior em temas como esse. Uma importância maior, que parcialmente tem a ver com a noção da raiz africana, mas que também tem a ver com maior importância dos estudos de história atlântica. E essas duas coisas no fundo são uma. Portanto, são estudos que apontam na direção de que isso é uma chave que é preciso valorizar”, conclui. 

Tarde de autógrafos

O ensaísta Luiz Feldman, que atualmente vive em Brasília, lança seu livro na capital mineira neste sábado (7/10), a partir das 13h, na Livraria Quixote (Rua Fernandes Tourinho, 274, Savassi). Informações: (31) 3227-3077 ou pelo @quixotelivraria, no Instagram.

“MAR E SERTÃO - ENSAIO SOBRE O ESPAÇO NO PENSAMENTO BRASILEIRO”

•  Luiz Feldman
•  Topbooks Editora (311 págs.)
•  R$ 76,90