Eles moraram na mesma rua e fazem aniversário no mesmo dia, 10 de outubro. Quem fez o primeiro movimento foi ela, a artista visual Julia Baumfeld, que, 15 anos atrás, deixou na porta da casa dele, o compositor, arranjador e violoncelista Marco Antônio Guimarães, um quadro de presente.
Foi um amigo que tinham em comum, o fotógrafo e pintor Fernando Fiúza (1953-2009), quem fez as devidas apresentações. Os dois se encontraram no Retiro das Pedras, condomínio onde viviam na época, e iniciaram uma profunda amizade. Um dos frutos deste encontro é o livro “Pêndulo”, de Julia, que traz o processo criativo do fundador do Uakti. A obra será lançada na próxima terça-feira (10/10), na Fundação de Educação Artística (FEA).
A escolha do dia refere-se, obviamente, ao aniversário dos dois. O de Marco Antônio é, inclusive, uma data cheia. Ele completa 75 anos nesta semana. Recluso há alguns anos, não irá ao lançamento. Mas estará presente de outras maneiras durante o evento.
Além do livro em si, a noite também terá exibição do curta documental “Marco” (2021), dirigido pela própria Julia. Filho do compositor, Pedro Zajden vai fazer uma apresentação do Nastaré, o único dos vários instrumentos criados por Marco Antônio (cerca de 60) que ainda está sob a posse dele. Uma conversa com artistas envolvidos no processo do livro está prevista na parte final.
Encontros
A partir daquele primeiro encontro, conta Julia, os dois ficaram muito próximos. Ela acompanhou o processo de composição de Marco Antônio para “Dança sinfônica” (2015), criada para celebrar os 40 anos do Grupo Corpo, e também assinou a capa do álbum “Uakti Beatles” (2012).
Além deste, o último disco do Uakti, Marco Antônio lançou outros 26 álbuns (11 deles com o grupo de música instrumental). Fez parceria com Milton Nascimento, Ney Matogrosso, Maria Bethânia e Paul Simon. Além de cinco trilhas para o Corpo, compôs para cinema – é autor das trilhas das adaptações “Lavoura Arcaica” (2001), de Luiz Fernando Carvalho (da obra de Raduan Nassar); “Batismo de sangue” (2007), de Helvécio Ratton (do livro de Frei Betto), e “Ensaio sobre a cegueira” (2008), de Fernando Meirelles (do romance de José Saramago).
Como assistente dele, Julia também organizou as últimas levas da Oficina Uakti, que Marco Antônio ministrou até 2016. “Fui colecionando materiais neste período, alguns presentes que ele me entregava. O livro traz muita coisa afetiva”, conta ela. Em 2018, Julia realizou o protótipo de “Pêndulo”, com somente duas cópias – uma ficou para ela, com a outra presenteou Marco Antônio.
Agora com 500 exemplares, “Pêndulo” é apresentado como um livro de imagens. “Elas se referem ao modo dele compor, que sempre foi sonoro e visual. Poucas pessoas conhecem a base do pensamento dele, o que se passava nas oficinas que começaram justamente na Fundação de Educação Artística, na década de 1970”, diz ela.
Não é obra só para iniciados, o leigo terá acesso ao livro, ela garante. “As imagens trazem legendas que explicam, de forma simples, do que se trata.” A composição de “21” (1992), que deu origem ao espetáculo homônimo do Corpo (um divisor de águas para a companhia), foi toda baseada em figuras geométricas. “É muito acessível”, diz Julia.
Textos de especialistas
“Pêndulo” ainda traz textos dela, do músico Kristoff Silva e de Marco Scarassatti, pesquisador de Walter Smetak (1913-1984) - professor de Marco Antônio na década de 1960, quando ele era graduando na Universidade Federal da Bahia (UFBA), foi sua grande influência na construção de instrumentos - e poesia de Olívia Viana.
Uma cartilha pedagógica acompanha o volume. Desenvolvida por Felipe José e Emília Chamone, a cartilha apresenta alguns métodos criados por Marco Antônio. Kristoff Silva vai realizar dois encontros criados a partir deste material, abordando propostas de ensino musical a partir das ideias dele. Um será na própria FEA e outro, on-line. As datas serão disponibilizadas no site do projeto (livropendulo.com), que será lançado na mesma data do livro.
Artista formada na Escola Guignard e mestranda na Escola de Belas Artes da UFMG, Julia trabalha com múltiplas linguagens. Influência direta, ela diz, do próprio Marco Antônio. “Este atravessamento de linguagens eu também levo para a diagramação. O texto complementa a imagem, e o livro pode ser acessado por várias camadas. Tanto pelo viés poético, como também para compreendê-lo visualmente. É um pouco como um oráculo”, comenta.
Documentário sobre o Uakti
O Uakti existiu por 28 anos. Em atividade até 2015, o grupo criado por Marco Antônio Guimarães e formado por Artur Andrés, Paulo Santos e Décio Ramos vai ganhar um documentário no Canal Curta! Dirigido por Eder Santos, “Uakti” está em fase de finalização. Todos os ex-integrantes do grupo deram depoimentos para o longa, que também traz imagens de arquivo cedidas por Milton Nascimento, com quem o grupo realizou gravações e shows. A previsão é de que “Uakti” seja lançado no primeiro semestre de 2024.
“PÊNDULO”
Lançamento do livro de Julia Baumfeld. Nesta terça (10/10), às 19h, na Fundação de Educação Artística, Rua Gonçalves Dias, 320, Funcionários. Entrada franca. O livro será distribuído para o público no local.
Sign in with Google
Os comentários são de responsabilidade de seus autores e não representam a opinião do Estado de Minas.
Leia 0 comentários
*Para comentar, faça seu login ou assine