Flaviana Lasan responde pela curadoria da mostra, que ficará em cartaz até janeiro do ano que vem

Flaviana Lasan responde pela curadoria da mostra, que ficará em cartaz até janeiro do ano que vem

Fernanda Lider/Divulgação

 
O título da exposição “Quero amar quem acenda uma fogueira comigo às 7 da manhã”, em cartaz na galeria Arlinda Corrêa Lima, do Palácio das Artes, carrega uma sugestão afetiva. Mas não é só disso que se trata. O nome com que a mostra foi batizada se ancora na solidão, não apenas afetiva ou sexual, mas também social e política, segundo a curadora, Flaviana Lasan.
 
Ela reuniu 11 artistas mulheres, negras, de diferentes regiões de Minas Gerais, que trabalham com técnicas e suportes variados. São quase 50 obras que expressam dramas vividos coletivamente pelas pessoas que esse grupo representa, mas, sobretudo, que apontam para individualidades. “Trata-se de tentar definir o tema solidão da mulher negra, o que está ligado a vários processos pessoais. Basta pensar nos índices de estupros e assassinatos relativos a esse grupo, entendendo que cada caso é um caso”, diz.
 
Esse intento levou a um recorte que privilegia a diversidade, com artistas que não fossem só de Belo Horizonte. “Fui buscando nos interiores, porque, territorialmente, existem diferenças no que diz respeito a essa questão da solidão”, afirma. As artistas reunidas na mostra vêm de cidades como Lavras, Ouro Preto, Ribeirão das Neves e do Quilombo do Torra, em Sabinópolis, entre outras localidades, além da capital.
 
“Quero amar quem acenda uma fogueira comigo às 7 da manhã” reúne obras de Ana Elisa Gonçalves, Ana Paula Sirino, Danielle dos Anjos, Daiely Gonçalves, Desirée dos Santos, Elizabeth Ramos, Josiane Souza, Maria Auxiliadora, Mônica Maria, Rebeca Amaral e Andréa Rodrigues – esta última, presente com um texto que baliza a temática da mostra.
 
“Institucionalmente, temos um legado de imagens escravocratas; não temos imagens contemporâneas da mulher negra que traduzam a visão da mulher negra. Pensamos os territórios relacionados à singularidade dessa produção”, explica a curadora. Ela salienta que a diversidade se dá também nas técnicas e recursos empregados nas obras.

Diversos materiais


São pinturas, gravuras (algumas se valendo de materiais como água de feijão, nódoa de banana, terra e papelão), peças de cerâmica, registros audiovisuais e outros recursos. Flaviana diz que foi observada, também, a questão geracional. Ela destaca que a exposição abarca a produção de um período que parte dos anos 1960 e chega até os dias atuais, com prevalência de nomes que despontaram nas décadas de 1980 e 1990.
 
Esse grupo inclui algumas mulheres que já alcançaram reconhecimento no circuito das artes visuais e outras que estão completamente à margem do mercado. “Dentro desse processo, que chamo de curadoria ativista, tento mesclar aquelas figuras consolidadas com outras que estão despontando ou que nem sequer se consideram artistas, a despeito de trabalharem ativamente”, diz a curadora.
 
Ela se inspirou na bibliografia de Lélia Gonzáles e em “Irmãs do inhame: mulheres negras e autorrecuperação”, de Bell Hooks. Em seguida, vieram como motes inspiradores o álbum “Bom mesmo é estar debaixo d’água”, da baiana Luedji Luna, o conjunto da obra de Conceição Evaristo e o livro “Cartas para minha avó”, da filósofa Djamila Ribeiro.
 
“Quem acende a fogueira somos nós, mas estamos exaustas. Queremos que mais gente venha acender essa fogueira. Tanto Lélia Gonzáles quanto Bell Hooks observam o quanto a mulher negra trabalha, em termos de carga horária mesmo, a fim de tentar disfarçar para si mesma esse processo de solidão. Enquanto nos Estados Unidos se discute o que as mulheres negras querem, no Brasil ainda se discute quem as quer”, afirma. 
 
“QUERO AMAR QUEM ACENDA UMA FOGUEIRA COMIGO ÀS 7 DA MANHÔ

Coletiva. Em cartaz na Galeria Arlinda Corrêa Lima, do Palácio das Artes (Av. Afonso Pena, 1.537, Centro, 31.3236.7400), com horário de visitação de terça a sábado, das 9h30 às 21h, e domingos, das 17h às 21h. Entrada gratuita. Até 14 de janeiro de 2024.