Quando começaram a produzir a cinebiografia “Meu nome é Gal”, que estreia nesta quinta-feira (12/10) nas salas brasileiras, as diretoras Lô Politi e Dandara Ferreira enfrentaram o seguinte dilema: como construir um filme sobre a estrela da MPB sem cair no óbvio?
“A gente pensou num recorte mais específico para poder aprofundar as questões internas da personagem”, explica Dandara. “O que vemos ali é justamente a transformação da menina tímida que participou de um movimento estético, cultural e político – a Tropicália –, enfrentou a ditadura, a moralidade, a misoginia e se transformou em voz política”, emenda.
Caetano, Gil e Solar da Fossa
Para esse desabrochar, dois personagens foram essenciais: Caetano Veloso e Gilberto Gil, interpretados por Rodrigo Lélis e Dan Ferreira. A dupla já estava no Rio quando Maria da Graça chegou, aos 19 anos. Foi por intermédio deles que a amiga foi morar no Solar da Fossa, casarão que servia de refúgio para jovens idealistas e talentosos que resistiam ao governo militar. Ali se abrigava “a loucura que a ditadura não consegue ver”, nas palavras de Caetano.
Não foi fácil convencer Maria da Graça a se tornar voz política naquele contexto de repressão política – e isso o filme mostra com clareza. A jovem baiana parecia vir de um mundo completamente diferente. Sua timidez e acanhamento se mostravam mais evidentes diante do comportamento solto e desinibido de Caetano e Gil.
Caetano Veloso foi uma espécie de padrinho. Apresentou a amiga ao empresário Guilherme Araújo (Luis Lobianco), ajudou na escolha do nome artístico Gal – até então, ela era apenas Gracinha – e participou do disco de seu LP de estreia, “Domingo” (1967), no qual os dois cantam Bossa Nova.
Embora generoso, Caetano era intransigente em política. Nas conversas com Gal sobre a ditadura militar, posicionava-se de maneira firme, pedindo a ela que tomasse partido.
“Fizemos um trabalho de muita pesquisa”, ressalta Dandara. “Várias informações vieram do meu documentário (“O nome dela é Gal”, de 2017), mas outras surgiram em conversas com amigos da Gal, com a própria Gal e com pessoas que vivenciaram aquela época”, acrescenta.
Uma das maiores dificuldades das diretoras foi descobrir como a tímida Gracinha, recém-chegada ao Rio de Janeiro, falava e se comportava.
“Não há muitos registros em audiovisual dela no início de carreira. O que a gente tem da Gal falando já é de um período mais avançado, depois do show 'Fa-Tal – Gal a todo vapor'. Então, houve uma espécie de lacuna para a criação da própria personagem”, afirma Sophie Charlotte. “Fa-Tal” estreou em 1971.
A lacuna deu à atriz liberdade de investigação e criação, o que ela fez com maestria. “Pensei: como seria a voz de uma pessoa nas relações mais íntimas, nos momentos de fragilidade e incerteza? Não queria me limitar à voz dela apenas no palco, e, sim, partir disso para criar o universo interno”, explica Sophie.
A mudança de comportamento de Gal ocorre em 1968, quando ela participa do 4º Festival da Canção da TV Record e canta “Divino maravilhoso”, de Caetano e Gil. Inicialmente com receio de interpretar a música pelo viés político, ela decide se posicionar, fazendo a performance considerada a “virada de chave” de sua carreira.
“Todas as transferências externas e internas motivaram essa mudança de personalidade, que se dá na apresentação de ‘Divino maravilhoso’. Nos anos seguintes, Gal já se estabeleceu no lugar de voz política. Ela já tem postura firme no palco como mulher, como artista”, destaca Dandara.
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O filme, no entanto, termina subitamente. Depois de apresentar “Divino maravilhoso” no festival, a cantora dá início à turnê “Fa-tal”. O espectador, então, se vê confuso. Quebra-se o clima diante do mosaico de imagens de diferentes shows de Gal nos últimos anos. Não se sabe se as cenas indicam o final do longa ou se representam um recurso da direção para dar sequência à história da estrela da música brasileira.
“MEU NOME É GAL”
(Brasil, 2023, 120min, de Lô Politi e Dandara Ferreira, com Sophie Charlotte, Rodrigo Lélis e Dan Ferreira) – Estreia nesta quinta (12/10) no Cine Una Belas Artes, Centro Cultural Unimed-BH Minas e salas nos shoppings BH, Boulevard, Cidade, Contagem, DelRey, Diamond, Partage, Pátio Savassi e Ponteio.