Em junho de 1973, começaram as obras de construção da Barragem de Sobradinho, no interior baiano, a 748km da foz do Rio São Francisco. Patrocinado pelo regime militar, o projeto foi propagandeado como um marco do desenvolvimento social do país, prometendo postos médicos, escolas, áreas de lazer, luz elétrica e água de boa qualidade para a população que morava no entorno.





O resultado, contudo, como mostrou a história, não foi bem assim. A construção do reservatório ocupou área de 4.214 km² e desalojou cerca de 60 mil pessoas. Cidades como Remanso, Casa Nova, Santo Sé e Pilão Arcado – todas na Bahia – foram inundadas, fazendo valer a profecia de Antônio Conselheiro, que dizia: “O sertão vai virar mar”.

A crítica ao projeto ganhou mais força depois que a dupla Sá e Guarabyra lançou a canção “Sobradinho”, em 1977, condenando a maneira que o "homem chega e já desfaz a natureza, tira gente, põe represa, diz que tudo vai mudar".

Os antigos moradores dessas cidades, portanto, não tiveram outra alternativa senão se mudar.

Esse foi o destino de familiares do artista plástico davi de jesus do nascimento  (ele escreve o nome com iniciais minúsculas). Vindos dessas cidades baianas, eles levantaram tenda em Pirapora, onde davi nasceu em 1997.





A dispersão forçada da família serviu como gênese criativa para davi em seu trabalho na arte. Depois de ter participado de mostras coletivas no MAM e Masp de São Paulo, participado do Prêmio Pipa em 2022 e de individuais na Galeria de Arte Sesiminas e no Memorial Minas Gerais Vale, ele inaugura, nesta terça-feira (17/10), a individual inédita “Madeira doce água áspera”, na Galeria Genesco Murta do Palácio das Artes.

Ao todo, serão expostas 19 obras, entre desenhos, fotografias, aquarelas e uma carranca, que simboliza Pirapora e o Norte mineiro.

Todas as obras que integram “Madeira doce água áspera” tem como origem a relação de davi com o Rio São Francisco, considerado por ele como o curso d’água de sua própria vida e de seus ancestrais barranqueiros que chegaram à força em Pirapora. São trabalhos que partem do rio para falar sobre a memória de famílias que, assim como a do artista, foram vítimas de um apagamento histórico.

Misturando diferentes linguagens – desenho, pintura, fotografia e escultura –, davi procura criar um “porto infinito na borda dos rios”, conforme ele escreve nas apresentações de seus trabalhos, “partindo sempre do Rio São Francisco para desaguar em outras pessoas, outras mães, outros rios, e outros territórios”. 

“Madeira doce água áspera”
Exposição individual de davi de jesus do nascimento, na Galeria Genesco Murta do Palácio das Artes (Av. Afonso Pena, 1.537, Centro). Abertura nesta terça-feira (17/10), às 19h. Mostra fica em cartaz até 28 de janeiro, de terça a sábado, das 9h30 às 21h; e domingo, das 17h às 21h. Entrada franca. Informações no (31) 3236-7400 ou pelo site fcs.mg.gov.br.

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