O amor por Belo Horizonte não poderia ser mais explícito. “A minha cidade é BH, com certeza. Nunca tive dúvida de que estava no lugar certo”, diz o chef veneziano Massimo Battaglini, que há exatos 20 anos escolheu viver entre as montanhas. Nesse tempo, ele ajudou a transformar a cena gastronômica daqui – ao apostar em lugares até então inimagináveis para um restaurante, como a Rua Sapucaí, atrás da Praça da Estação. Além disso, trouxe para a cidade uma comida italiana moderna e simplificada.
Massimo comprou uma passagem de Veneza para a Cidade do México e depois decidiu esticar a viagem continente abaixo. Assim, chegou até o amigo Julio Mattiazzi, que tinha uma distribuidora de vinhos em Belo Horizonte. “O Julio viajou para a Itália e me deixou a chave do barracão. No meio das caixas de vinho, surgiu a ideia de servir bruschetta e espaguetone”, conta o chef, que deu início à Osteria Mattiazzi, em 1999, numa garagem no Bairro Santa Efigênia, onde não havia nada parecido.
O italiano ainda sente o sabor de um prato da casa: taglioni com vieiras, manteiga de sálvia e pimenta-do-reino. A proposta era trabalhar com bons ingredientes para fazer uma comida descomplicada. Logo, a Osteria Mattiazzi virou referência por outro motivo. “Além de proporcionar experiências modernas para a época, o restaurante deu a possibilidade de pensar que bairros periféricos poderiam hospedar lugares mais diferentes”, aponta.
Sem planejar, o chef acabou investindo em outro ponto renegado da cidade. Depois de uma noite na extinta casa de shows Nelson Bordello, ao lado da Praça da Estação, Massimo passou pela Rua Sapucaí e viu uma placa de “aluga-se”. Na época, ele buscava um lugar para abrir um botequim e, mais uma vez, fincou o pé em uma região inexplorada pela gastronomia.
A Salumeria Central abriu as portas em 2012 com uma cozinha que seguia o conceito zero-quilômetro. “A nossa busca era pelo pequeno produtor. Começamos com o queijo da Canastra de leite cru, quando nem existia no Mercado Central de BH, e também tivemos mel, linguiça sem nitrito, leite da fazenda”, explica Massimo, que não está mais na sociedade. Para ele, o mais marcante do cardápio era o stinco (ou jarret) de porco servido com batatas. A carne ainda estava longe do popular e era encontrada apenas em casas como Vecchio Sogno e Dona Derna.
PEIXARIA Cheio de ideias e com disposição para ampliar os negócios, o italiano, que sempre teve vontade de montar uma peixaria, abriu o Pecatore ao lado do Salumeria Central, restaurante onde um balcão de sete metros de comprimento exibia frutos do mar frescos. “A ideia era servir apenas pescados, tanto que o cardápio mudava dependendo do que o mar oferecia. Tirando vôngole, salmão, mexilhão e ostra, o restante era da semana.” A casa funcionou de 2013 até maio do ano passado.
Hoje, vendo a Rua Sapucaí como um polo de cultura e gastronomia, Massimo se sente realizado por ter reaberto a “vista urbana mais bonita da cidade”. “Para mim, o que mais valeu foi reacender um lugar maravilhoso, que tem um urbanismo com respiro, um pôr do sol incrível e onde não existe um outdoor num raio de 180 graus”, comenta. O chef não pensa em explorar novas áreas da cidade, mas dá a dica para os interessados: seria demais reviver a Lagoinha.
Projetos diversos
Na hora de responder como contribui para a gastronomia de Belo Horizonte, Massimo Battaglini para, pensa e responde com modéstia. “Com um pouco de curiosidade, simpatia, sem muita frescura e uma vontade de simplificar as coisas.” O chef reassumiu recentemente a Osteria Mattiazzi depois de um período afastado, continua à frente do bufê Club do Chef e se prepara para abrir o seu quinto empreendimento na cidade. O Restaurante Eva, no Belvedere, servirá uma comida italiana mais clássica.
No Club do Chef, o italiano se esforça para traduzir no cardápio todos os desejos dos clientes. “Fazer sempre a mesma coisa é muito mais fácil, mas a nossa ideia é estimular a pessoa a decidir o que quer. Gostamos muito de brincar com as características de cada um. Isso não é clichê, é a verdade.” Hoje, o bufê é chamado para fazer festas fora de BH, como em Brasília e Trancoso, e segue inovando. Algumas das novidades são cevicheria, burrateria ao vivo e mesa de milho (com várias receitas à base dos grãos e uma panela estourando pipoca no meio do salão).
O trabalho de mapear pequenos produtores vem se intensificando desde que Massimo se tornou, há três anos, consultor da Fazenda Alegria, produtora de gado wagyu e alimentos orgânicos no interior de Minas. “Eu, veneziano, entendia de wagyu igual japonês entende de queijo canastra: nada. Corri atrás e gostei do desafio. Estou adorando viajar pelo Brasil e cada hora esbarro em gente com propósito”, destaca. O italiano vê com bons olhos o retorno de muitas pessoas à terra. “No dia em que sossegar, gostaria de ter alguma coisa produzida por mim, mas isso ainda está longe.”
Além de buscar produtores artesanais para ocupar as prateleiras da loja da Fazenda Alegria, no Vila da Serra, o chef tem a missão de apresentar a carne da raça japonesa. Ele mesmo a usa em várias receitas do bufê, incluindo tartar, carpaccio e recheios de pastel.
Quando chegou a Belo Horizonte, Massimo só queria que a Osteria Mattiazzi desse certo, nada mais. E agora, o que ele espera para os próximos 20 anos? “O meu projeto é simplificar a comida. Que seja mais prazerosa e acessível. Que seja mais ingrediente e menos cozinha. Acredito muito no ingrediente, é o que me move”, define. De preferência, que esses produtos estejam por perto para fazer girar a economia local. É isso que faz sentido para ele.
Filé com pimenta verde
fresca e musseline de baroa
Ingredientes
250g de filé-mignon; 15g de pimenta-do-reino verde fresca; 20g de manteiga; 30g de queijo parmesão ralado; 200g de batata-baroa; 60ml de molho roti; ½ dose de conhaque; 1 colher de sobremesa de óleo; 50g de queijo Taleggio; sal e pimenta a gosto
Modo de fazer
Doure o filé em uma frigideira usando um pouco da manteiga e uma colher de sobremesa de óleo. Reserve. Em seguida, na mesma panela, acrescente a pimenta-do-reino verde fresca amassada, flambada com o conhaque. Coloque o molho roti. Misture até encorpar e reserve. Para a musseline, cozinhe a batata-baroa. Faça um purê bem liso colocando o restante da manteiga, o queijo parmesão, o sal e a pimenta. Finalize acrescentando o queijo Taleggio.