Servir croquete, costelinha com canjiquinha ou frango com catupiri em restaurante seria um absurdo em outros tempos. Agora, não mais. Tem gente na cidade que tenta simplificar a gastronomia e oferecer uma experiência mais relaxada (e acessível) ao público. Da cozinha, saem receitas que levam poucos ingredientes, prezam pelo sabor e lembram comida de casa.
Caetano Sobrinho conhece bem o outro lado. Trabalhou por anos como chef do A Favorita e decidiu abrir o Caê justamente para seguir o caminho contrário: oferecer algo mais simples e acessível. “Parece que desaprendi a cozinha mais refinada. Coloco, no máximo, quatro elementos no prato, sempre com produto local. Busco uma comida mais fácil”, comenta.
A proposta do Caê é servir comida de casa com cara de restaurante. “Sou de uma geração que comia muito em casa e, com a correria, isso foi se perdendo. Aqui tento fazer a comida do dia a dia, mas com técnicas e serviço de restaurante”, explica. Um dos clássicos do cardápio é uma receita da mãe do chef: frango com catupiri. Na mesma linha, bife a milanesa com salada de batata, ovos e rúcula, bobó de camarão com arroz de coco e panturrilha de porco com arroz e hortaliças do quintal.
A vontade de desgourmetizar surgiu até por uma questão de custo. Tanto que no restaurante não tem toalha de mesa, taça de cristal ou porcelana. Segundo o chef, esta é uma tendência que vem se consolidando há muito tempo. “Não é invenção minha e nem de agora. Temos visto grandes chefs no mundo abrindo restaurante mais comercial, com preço mais justo.”
Mariana Gontijo já começou o seu negócio certa de que não se renderia a invencionices. Para quem cresceu no interior, e quase não teve contato com a cozinha internacional, buscar a simplicidade significava se conectar com as suas raízes e encontrar a sua identidade. “Quando escolho trabalhar com prato feito, ingredientes nativos e técnicas caipiras, escolho dizer que o que nós temos é valioso e pode ser acessível a todo mundo”, justifica a idealizadora do Roça Grande.
Nos pratos do restaurante, reinam os ingredientes mais comuns, todos trazidos da sua cidade, Moema. Com os miúdos, Mariana faz recheio de coxinha e farofa. Já o galo pode fazer parte do galopé ou do salpicão. A cozinha também recebe cagaita e outras frutas do cerrado e alguns “matos”, como o mata compadre (que pode ser chamado de beldroega-grande ou major gomes).
A simplicidade também está nas técnicas utilizadas, todas aprendidas com as mulheres da roça e que devem ser documentadas por Mariana a partir do ano que vem. Uma delas é a de carne de lata. “Segundo a minha avó, para saber o ponto certo, tem que jogar banha na brasa. Se chiar, não está bom”, relata. Isso porque ainda tem água e a carne pode estragar. Outra sabedoria popular: se o polvilho seco entrar depois do escaldo, o pão de queijo fica cascudo e ressecado.
PERTENCIMENTO Pensando pelo outro lado, a chef do Roça Grande observa que quem come uma comida simples se reconhece nos sabores e isso desperta algo imprescindível, que é a sensação de pertencimento. “Acham que a comida mineira é a melhor do mundo em casa, mas saem para comer francesa, italiana ou árabe. Se a pessoa gosta de galopé e vê um chef fazendo, passa a ter mais segurança em valorizar aquilo”, defende.
Por muito tempo, croquete ficou bem distante dos restaurantes. Mas Pablo Teixeira ousou inclui-lo no cardápio do Cabernet Butiquim, que fica na Savassi. E para acompanhar vinhos. A proposta da casa, aberta há quatro anos, continua a ser descomplicar as experiências com a bebida e a comida. “Achavam petisco simples demais para acompanhar vinho, mas nunca concordei com isso. Através do Cabernet consegui mostrar que esse casamento funciona bem.”
Pablo sempre se preocupou em servir pratos que sejam identificados com facilidade, então prefere investir em ingredientes mais comuns. Janaina Barrozo contribui muito na cozinha com a construção da identidade do Cabernet, já que ela leva muitas referências do interior. No fim das contas, o esforço é para o cliente se sentir em casa. “Para mim, não existe elogio melhor do que o cliente dizer que lembrou da avó ou da mãe. Não adianta nada ter bons ingredientes se a comida não tem alma”, defende a chef.
Fora o croquete de carne de panela com maionese de rúcula, o idealizador do Cabernet destaca, entre os petiscos, o dadinho de queijo mineiro (no lugar do provolone) como molho de goiabada e a linguiça artesanal com mandioca e vinagrete de jiló. De pratos, tem carne de lata com tutu de feijão e couve e filé a parmegiana com purê de batata. “Um prato de almoço que sai muito é o estrogonofe de frango com arroz e batata palha. Já temos um público cativo”, conta.
Foco é a carne
O hambúrguer também sofreu influência da onda gourmet, mas agora está mais fácil de fugir dos excessos e optar pelo básico pão, carne, queijo e molho. A sócia da Bullguer no Centro de Belo Horizonte Laura Luciano lembra que as receitas com produtos caros e especiais, feitas para comer com garfo e faca, surgiram como alternativa ao fast food. “Depois começou a sugerir outra demanda, de um público que quer comer um hambúrguer gostoso e pagar um preço justo”, pontua.
A Bullguer trabalha com poucos e bons ingredientes. “A nossa preocupação é com o principal elemento do hambúrguer, que é a carne. Os outros são para complementar”, avisa. Para alcançar sabor, frescor e suculência desejados, a rede fundada em São Paulo desenvolveu um blend de cortes da raça angus e não utiliza nada congelado. Os cortes chegam inteiros à loja e são moídos todos os dias. Se o hambúrguer passa de um dia para o outro, perde umidade.
Já que o foco é a carne, nada de confundir o paladar com sabores muito diferentes. Os hambúrgueres contam com pão brioche, macio e bem amanteigado, que vai ser dourado na chapa. Queijo pode ser prato ou cheddar. De molho, duas maioneses da casa, uma temperada apenas com sal, azeite e alho, e a outra, mais alaranjada, ganha sabor com páprica, picles e mostarda. Fora isso, a hamburgueria acrescenta, no máximo, bacon, picles, ovo ou salada.
O hambúrguer que leva o nome da casa resume a proposta de descomplicar a experiência. No Bullguer, misturam-se apenas pão, carne, queijo prato, picles e maionese de páprica.
Croquete de carne de panela
(Cabernet Butiquim)
Ingredientes
1kg de músculo limpo picado em cubos; 3 dentes de alho em cubos; sal a gosto; 1 colher de molho de pimenta tailandês sriracha; 1 cebola picada em cubos; 1l de caldo de legumes; 1 xícara de molho de tomate; 700g de farinha de trigo; óleo, farinha de trigo, farinha panko e ovos para empanar e fritar
Modo de fazer
Doure a carne na panela de pressão. Adicione alho, cebola e refogue. Quando o alho e a cebola estiverem dourados e translúcidos, coloque o molho de tomate. Tempere com pimenta e sal. Cubra com o caldo de legumes. Cozinhe até a carne amaciar a ponto de desfiar com facilidade. Quando estiver toda desfiada, envolva com farinha até dar o ponto (não muito duro e nem muito mole). Em seguida, resfrie. Quando estiver em temperatura mais amena, modele os bolinhos e empane seguindo a sequência: farinha de trigo, ovo batido e panko. Frite em óleo quente por aproximadamente 5 minutos.