Jornal Estado de Minas

Coquetéis podem surpreender, mesmo sem bebida alcoólica

Maletta (Quina) (foto: Lara Dias/Divulgação)

A despedida do ano se aproxima. Já pensou em brindar com um coquetel sem álcool? Os mocktails (como se fala em inglês) são tendência na coquetelaria mundial e ganham espaço na cena noturna belo-horizontina diante da proibição da venda e consumo de bebida alcoólica nos bares da cidade. Deixando a polêmica de lado, o convite é para experimentar uma bebida que de sem graça não tem nada. Surpreende pela mistura de sabores e faz você nem sentir falta de gim, vodca, rum ou uísque.





Para o especialista em coquetéis Tony Harion, fundador da Mixing Originals, fabricante de ingredientes de coquetelaria, oferecer misturas não alcoólicas é uma questão de hospitalidade. Por isso, ele defende que todo bar deve ter. “Gosto muito de ver a coquetelaria como uma disciplina da gastronomia. Da mesma forma que uma pessoa não come determinado ingrediente, podemos receber clientes que não bebem álcool e temos sempre que adequar a experiência ao que ele quer consumir.”
 
Mesmo sem álcool, a coquetelaria tem condição de surpreender o consumidor e proporcionar uma experiência única. “Cada vez mais vemos coquetéis não alcoólicos bem-elaborados e tão bem executados como os outros, com a mesma complexidade e elegância. Não são simplesmente pensados para ter uma opção, mas realmente querem agradar, encantar e atrair as pessoas”, pontua. Isso significa caprichar, inclusive, na apresentação.
 
Na hora de criar um mocktail, o bartender precisa ter em mente que, quando o álcool está fora do jogo, a textura e o corpo da bebida mudam, assim como a velocidade de consumo. Daí entram truques para tentar igualar as experiências. “Uma opção é buscar ingredientes que possam preencher características que estariam no álcool, como a soda de gengibre, que ajuda a dar certo corpo, picância e amargor e entra reduzindo a velocidade com que a pessoa vai beber.” Agua tônica e suco de grapefruit também entregam um leve amargor. Já a soda de hibisco dá aquela sensação do álcool de secar a boca.




 
Tony se esforça para que todos se sintam incluídos na diversão e nas descobertas do paladar, independentemente se bebem álcool ou não. “Fora a legislação, muitos não bebem por motivos religiosos, de saúde (como uma mulher grávida), porque estão dirigindo ou simplesmente porque têm uma reunião no dia seguinte cedo”, enumera.
 
Strawberry tonic (Outland) (foto: Barbara Dutra/Divulgação)
Criador da carta de coquetéis do recém-aberto Outland, ele apresenta algumas sugestões que criou, como o Strawberry tonic, com morango, água tônica e soda de hibisco, e o No filter, que combina tangerina, maçã, soda e espuma de gengibre. O especialista também utiliza o café cold brew (extraído a frio), que vem ganhando espaço na gastronomia, em uma de suas receitas. Além dele, fazem parte da mistura gengibre, suco de maçã e limão siciliano.
 

Receitas mais elaboradas

 
As cartas de Conrado Salazar sempre tiveram uma ou duas opções sem álcool, mas agora ele observa que os mocktails têm virado tendência na coquetelaria mundial. Há espaço para receitas mais elaboradas usando xaropes, reduções diferentes, refrigerantes artesanais e espumas. “Acho que a indústria tem se preocupado mais em passar a mesma experiência sensorial para quem não bebe álcool, e nós acompanhamos isso. As grandes cervejarias estão fazendo cerveja sem álcool e sei que na França já fizeram gim sem álcool”, aponta.




 
Quina colada (Quina) (foto: Lara Dias/Divulgação)
 
Em janeiro, vão entrar no cardápio do bar Piratas, onde Conrado trabalha atualmente, cinco novos coquetéis sem álcool, somando-se a outros três já existentes. O de nome Calico Jack seabreeze é uma mistura de morango, limão siciliano, laranja-baía, xarope levemente amargo, soda e espuma de gengibre. Já o The ship is ours une suco de frutas tropicais, xarope de amêndoa, aroma de hortelã e casca de laranja, enquanto o Mary read punch dead combina sucos cítricos, xarope de manga ligeiramente apimentado e aroma de alecrim.
 
Conrado quer continuar investindo em novas misturas não alcoólicas e espera aproximar do balcão quem dispensa gim, rum e vodca. Em vez de pedir refrigerante ou suco, por que essas pessoas não podem tomar um coquetel? “Nós trabalhamos com hospitalidade e considero nossa obrigação nos colocarmos no lugar do cliente. Quem não bebe tem o direito de ter a mesma experiência sensorial dos outros.”
 

Mais, não do mesmo

 
Fazer mocktail não é apenas tirar o álcool da mistura. Em muitos casos, as combinações são elaboradas do zero, já com esse propósito. Bartender do Garagem do Cab, Alexandre Loureiro enxerga nesta onda dos coquetéis não alcoólicos uma oportunidade de mostrar mais do seu trabalho. “É o momento de apresentar receitas diferentes, mostrar que não existem só as misturas de sempre, surpreender o público. Assim, ajudamos a difundir a coquetelaria”, aponta.




 
Na opinião dele, criar mocktails tende a ser mais desafiador. “Como não tem o spirit (as bebidas alcoólicas são chamadas assim na coquetelaria), precisamos fazer um preparo melhor, uma redução para extrair mais o sabor do ingrediente. Coquetel sem álcool exige mais trabalho no fogão.” O que não pode mudar é a complexidade dos sabores e a apresentação; afinal, bebe-se primeiro com os olhos.
 
I follow rivers (Garagem do Cab) (foto: Studio Tertulia/Divulgação)
 
O Boca de groselha, com morango, limão, soda de frutas vermelhas e espuma de baunilha, é um dos campeões de venda. Quem busca um sabor mais cítrico prefere o Fake love. Inspirado no moscow mule, ele leva soda de gengibre, mel, limão e espuma de gengibre. Outra opção é o I follow rivers, composto por limão siciliano, limão taiti, suco de laranja e perfume de grapefruit. “Fazemos a maceração da casca no álcool de cereais e borrifamos em cima do coquetel para trazer o aroma da fruta”, explica.
 
No Quina, quem está atrás do balcão aposta em coquetéis que funcionam bem com ou sem álcool. Veja, por exemplo, o Casa do Baile, com xarope de mel, suco de uva branca, suco de limão siciliano e clara do ovo (para dar o efeito da espuma), decorado com flor de sálvia. Se colocar gim, ele continua com o mesmo sabor. Da mesma forma o Abílio Barreto, com cidra de casca de abacaxi, limão e cereja com o caldo no fundo da taça. “Depois, posso trocar a cidra por espumante”, avisa Alan Rogério.




 
Outros dois que já estavam no cardápio quase não mudam sem álcool. O bartender comenta primeiro sobre o Maletta, à base de gim, suco de cranberry, limão siciliano, dois xaropes (flor de sabugueira e rosas) e espuma de caipirinha. “Como ele tem sido o carro-chefe do bar, queremos dar a oportunidade de quem não bebe experimentar. Só tiramos o gim e fazemos a espuma de limão siciliano, então o sabor fica idêntico”, explica. No caso do Quina colada, a água de coco entra no lugar do rum com sabor de coco. Suco de abacaxi, suco de limão e xarope de amêndoas permanecem na receita. 
 

Calico Jack seabreeze (Conrado Salazar)


Ingredientes
50ml de creme de morango; 20ml de xarope levemente amargo; 20ml de sumo de limão siciliano;30ml de sumo de laranja-baía; 50ml de refrigerante de gengibre; espuma de gengibre a gosto

Modo de fazer
Na coqueteleira, bata o creme, o xarope e os sumos. Depois passe para um copo thumbler de 520ml sem coagem. Adicione um pouco de gelo quebrado até próximo da borda. Adicione o refrigerante de gengibre e finalize com a espuma. Decore com 1 rodela de limão siciliano desidratada, 1 casca de laranja e um ramo de hortelã.

Maletta (Alan Rogério)

 
Ingredientes
80ml de suco de cranberry; 30ml de suco de limão siciliano; 20ml de xarope de flor de sabugueiro; 10ml de xarope de rosas; 150ml de suco de limão siciliano; 100ml de xarope simples; 100ml de água; 10g de emulsificante

Modo de fazer
Para a espuma de limão siciliano, bata no liquidificador ou batedeira 150ml de suco, xarope simples, água e emulsificante. Coloque todos os outros ingredientes na coqueteleira com gelo. Bata por 10 segundos e verta no copo de sua escolha. Finalize com a espuma de limão siciliano.