Difícil passar pelo corredor G do segundo andar do Mercado Novo e não parar na Moscata. Seja pelo cheiro das empadas saindo do forno ou pela simpatia de quem está no balcão. Quando não está produzindo massas e recheios, Betânia Salerno Lara assume o posto de vendedora. Boa de cozinha e de papo, não deixa ninguém sair de mãos ou estômago vazios. “Aqui a venda é garantida”, avisa a dona da loja, que ostenta um cardápio com 68 sabores e quer chegar aos 100 até o fim do ano.
A criadora das empadas tem formação em bioquímica de alimentos e trabalhou por muitos anos no setor de controle de qualidade de uma indústria. Quando decidiu mudar de vida, lembrou-se de bons momentos de infância na cozinha. “Venho de uma família italiana e, quando nos juntávamos, cada criança ficava com uma tia. Eu era quem ajudava a tia da empada”, conta.
O nome Moscata tem a ver com a sua origem. Deriva de “noce moscata” (noz-moscada em italiano), ingrediente que Betânia gosta de colocar em toda receita. No início da marca, ela fazia de tudo, empada, empadão, sanduíche e bolo, e vendia principalmente em feiras. Até que, em 2018, ficou sabendo do projeto de reocupação do Mercado Novo. “Pelo estatuto da época, só poderia trabalhar com um produto, então escolhi a empada, porque tinha mais a ver com o lugar.”
O modo de fazer da empada da tia Nely Salerno, que ficou viúva cedo e sustentou os dois filhos vendendo salgados, estava registrado no caderno de receitas da família. A partir dessa base, Betânia chegou à sua mistura de farinha de trigo, ovo vermelho e banha de porco. Ela também puxou da memória ensinamentos práticos, como a massa da tampa tem que ser diferente da do fundo, uma pitada de café na gema deixa a empada com uma cor mais atraente e o recheio deve ser bem molhadinho.
Betânia aprendeu outro truque que faz as empadas ficarem ainda mais apetitosas. As tampas são altas, arredondadas e saltam aos olhos. “A minha tia me ensinava: imagina que você está cobrindo um neném com uma cobertinha. Assim a massa incorpora ar e fica mais bonita.” As empadas da Moscata não só aparentam ser grandes. São, de fato, maiores que o padrão. As forminhas de alumínio, de 100 gramas, foram fabricadas sob medida em Itaúna. Tudo para sentirmos mais o recheio do que a massa.
Nada mais justo em se tratando de sabores um tanto quanto inusitados. Frango, só se for com quiabo, angu e couve ou ora-pro-nóbis. “Começamos a brincar com os recheios até o dia em que falei: vou fazer uma empada muito ousada, de língua de boi. Esse foi um marco na minha história”, relembra Betânia, que está na loja todos os dias. “Gosto de trabalhar no mercado, me divirto aqui dentro.”
Revezamento na vitrine
Depois da de língua, surgiram muitas outras invenções. Dependendo do dia, você vai encontrar alho-poró com manga, brócolis com figo e moqueca de peixe com pirão. São tantas opções que é preciso fazer um revezamento na vitrine. Mas jiló com requeijão não pode faltar, tem gente que vai de longe desejando esse sabor. Rabada, moela, fígado com jiló e costelinha com canjiquinha são receitas muito conhecidas por aqui, mas, em recheio de empada, tornam-se “exóticas”.
Para os turistas, a loja de empadas é um “prato cheio”. Não só porque dá para passear por Minas Gerais através dos recheios, mas também porque a dona é uma ótima anfitriã. “Gosto duma prosa e todo mundo se interessa por histórias. Sinto que tenho que suprir a falta de organização do turismo.” Betânia chegou ao segundo andar do Mercado Novo na primeira leva e já conheceu gente do Brasil e do mundo inteiros vendendo empada. Segundo ela, ali virou ponto turístico de referência em BH.
Os sabores doces não deixam a desejar. A empada de doce de leite com requeijão e canela, batizada de “churros mineiro”, faz o maior sucesso, mas a lista não para por aí. Tem queijo com goiabada, chocolate com laranja, palha italiana, abacaxi com coco, paçoca, panetone... Enquanto enumera o que já criou, Betânia tem mais uma ideia: “Doce de coco com manga, Mário. É uma delícia”, comenta, voltando-se para Mário Baêta, que a ajuda na criação dos recheios e na montagem das empadas.
Os veganos também são muito bem-recebidos. Para atendê-los, Betânia desenvolveu uma massa com linhaça e óleo vegetal. Entre as opções de recheio, estão jiló com creme de inhame, berinjela e palmito com castanha. Seu próximo desafio é fazer empadas sem glúten, que têm sido muito procuradas. Já de olho nesse público, ela incluiu no plano de expansão da marca uma cozinha de produção (para atender clientes de revenda) e uma filial com produtos para quem não pode ou não quer comer trigo.