Onildo Rocha está cada vez mais perto de Belo Horizonte. O chef paraibano estreou ontem a segunda temporada do restaurante O Chef e O Cabra, atração da mostra de arquitetura CASACOR Minas, que neste ano é realizada na Casa Ferolla, no Bairro Santo Antônio. Já mais ambientado e entendendo melhor os mineiros, ele revela planos de fincar o pé na cidade.
“Foi amor à primeira vista”, confessa Onildo, ao falar de Minas Gerais. “Vi no mineiro a mesma atmosfera do nordestino de receptividade, amor pela cultura e defesa da cozinha.”
O chef começou a vir para as bandas de cá como convidado de festivais de gastronomia e logo sentiu vontade de se aprofundar nos nossos sabores. Para isso, viajou bastante pelo estado. Nessas andanças, ele percebeu como a cozinha mineira é representativa do Brasil e passou a admirar as panelas de ferro, o arroz crocante, o “susto” que se dá na couve, os doces nos tachos. O feijão-tropeiro, em especial, mexe com as suas emoções. Virou um vício.
Onildo fechou em 2021 o Cozinha Roccia, seu restaurante em João Pessoa, na Paraíba. No mesmo ano, instalou-se em São Paulo para comandar o complexo gastronômico Priceless e já ficou mais próximo de BH. Em 2022, surgiu a oportunidade de ter um restaurante temporário na CASACOR Minas. Era a chance de entender como a sua cozinha seria recebida pelos mineiros.
“Queria sentir se era recíproco o que sentia por Minas, e realmente é, porque o restaurante foi um grande sucesso, as pessoas curtiram muito. Já é um caminho para pensar em algo fixo”, revela.
Ao lado do paraibano neste projeto, está o designer mineiro Gustavo Greco. Foi dele a ideia do nome do restaurante, que une o chef e o “cabra”, aqui no sentido da expressão nordestina “cabra da peste”, usada para se referir a um homem com quem se pode contar. Cabe outra interpretação para a palavra cabra, já que ela também se relaciona ao animal muito comum no Nordeste e que representa a cozinha de Onildo.
“A cabra pode ser um caminho para a revitalização política, literária e econômica do sertão do Nordeste”, dizia o também paraibano Ariano Suassuna, criador do movimento armorial. Tudo começou com pesquisas de Suassuna e seu primo Manelito Dantas para cruzar raças de cabras na Fazenda Carnaúba, em Taperoá. Daí veio a produção de leite “absurdamente gordo”, que encantou os italianos que fazem gelato, e de queijo.
“Um amigo levou para eles um vidrinho com finas ervas da Provence (França) para temperar os queijos, mas ninguém gostou. Aí Ariano disse: sabe de uma coisa, não é patriotada, não, mas a gente vai usar as nossas essências nordestinas”, conta Onildo.
Quando soube dessa parte da história, ele se deu conta de que fazia o mesmo, enaltecia produtos locais considerados sem valor. Foi aí que pediu permissão da família de Suassuna para incluir a gastronomia no movimento armorial. Desde então, diz que a sua cozinha é armorial.
No ano passado, sem saber como seria a aceitação dos mineiros, Onildo apostou em um cardápio comedido. Agora, com a experiência bem-sucedida e inúmeros pedidos para voltar à cidade, resolveu se soltar um pouco mais e até se arrisca a servir carne de cabrito (filhote de cabra com bode).
Para quem estranha a ideia, aí vai o recado: “Prove, porque a carne foi evoluindo com o tempo e hoje é muito fina e saborosa. Conseguimos chegar a uma nuance de sabor e textura que adoro. Ela absorve os temperos com personalidade, sem perder suas características, e fica muito versátil.”
O chef utiliza pimenta-do-reino, semente de coentro, um pouco de cravo, gengibre, alho, cebola e vinho para temperar os medalhões de cabrito, que se juntam a demi-glace e mil-folhas de batata.
O chef utiliza pimenta-do-reino, semente de coentro, um pouco de cravo, gengibre, alho, cebola e vinho para temperar os medalhões de cabrito, que se juntam a demi-glace e mil-folhas de batata.
Suas raízes nordestinas são levadas à mesa em mais pratos, como o short rib de sol, em que aplica a técnica de salgar a carne, acompanhado de molho roti de rapadura e mousseline de macaxeira (para nós mandioca).
Temos mais dois exemplos: o ravióli de queijo das cabras de Taperoá, as mesmas da história de Suassuna, ao molho beurre blanc de manteiga de garrafa e tomates concassé e o peixe com mousseline de castanha de caju. Ambos são servidos desde o ano passado.
Temos mais dois exemplos: o ravióli de queijo das cabras de Taperoá, as mesmas da história de Suassuna, ao molho beurre blanc de manteiga de garrafa e tomates concassé e o peixe com mousseline de castanha de caju. Ambos são servidos desde o ano passado.
As fronteiras se ampliam em outras receitas. O arroz de pato une várias regiões do Brasil. Isso porque o chef utiliza a versão mini do arroz vermelho da Paraíba, que é cultivado no Vale do Paraíba, em São Paulo. O arroz ganha ainda mais sabor com a espuma de tucupi, em referência ao paraense pato no tucupi. Para completar, o molho tem um toque de rapadura.
Onildo não pôde (nem quis) mudar completamente o cardápio. Nesse quase um ano de intervalo entre uma temporada e outra, eles receberam muitas mensagens nas redes sociais de pessoas clamando pela volta do restaurante, queriam comer vários pratos de novo. Agora, então, o público tem a chance de sentir mais uma vez os sabores pelos quais se apaixonaram.
A tortilha de porco picante está de volta. Por dentro da massa crocante, feita com farinha de mandioca, tem barriga suína desfiada ao molho de pimenta tailandesa sriracha.
Também vale a pena comer de novo o crudo de carne de sol com tapioca suflada, maionese de coentro e picles de maxixe. A torta de limão-capeta foi um dos pratos que mais deixaram saudades e garantiu o seu lugar no novo cardápio. Por ter o formato de limão, encantou e ficou marcada na memória dos clientes.
Também vale a pena comer de novo o crudo de carne de sol com tapioca suflada, maionese de coentro e picles de maxixe. A torta de limão-capeta foi um dos pratos que mais deixaram saudades e garantiu o seu lugar no novo cardápio. Por ter o formato de limão, encantou e ficou marcada na memória dos clientes.
O restaurante ocupa um ambiente da CASACOR Minas projetado pela arquiteta Betânia Nascimento, todo em tons terrosos, que nos levam ao sertão do Nordeste. Já o Ateliê de Cerâmica assina toda a louça, que se volta para as cumbucas e a cor verde, remetendo às folhagens.
A combinação de ambiente, serviço e comida foi pensada para entregar felicidade. “O serviço muito rígido está saindo de moda para a chegada de algo mais descontraído, que deixa a pessoa à vontade. Falei com os garçons: atendam como se estivessem recebendo alguém muito querido em casa”, comenta o chef, que se programou para ficar praticamente a temporada inteira em BH.
Autoral com tradição
Neste novo menu do restaurante O Chef e O Cabra, Onildo Rocha avança um pouco mais na cozinha autoral, mesclando referências do que vivencia e aprende pelo Brasil e pelo mundo. Como está em BH, não deixa de respeitar as tradições mineiras. “A minha preocupação na montagem de um menu é sempre trazer a minha essência, mas respeitando o lugar onde estou”, resume o chef, que tenta sempre se adequar ao que o público quer comer.
Já que o mineiro ama camarão, tem camarão de entrada (com blini de banana) e prato principal (com limão capeta e risoto de mini arroz branco com queijo canastra).
Falando em queijos, eles dão o ar da graça em outros pratos, como o crocante de mandioca com espuma de queijo e o pastel de queijo com chutney de cebola, que fez sucesso no ano passado. Onildo alterna entre quatro tipos que selecionou no Centro de Referência do Queijo Artesanal-MG, no Bairro Olhos D’Água.
Falando em queijos, eles dão o ar da graça em outros pratos, como o crocante de mandioca com espuma de queijo e o pastel de queijo com chutney de cebola, que fez sucesso no ano passado. Onildo alterna entre quatro tipos que selecionou no Centro de Referência do Queijo Artesanal-MG, no Bairro Olhos D’Água.
Mantendo esse olhar para Minas, o chef resgata a técnica de fritar batata na banha de porco. Ele aprendeu observando a cozinheira da sua fazenda, em Itabirito, na Região Central do estado. A batata frita é servida com aioli de pimenta-de-cheiro.
Onildo também se encantou com o jeito mineiro de fazer arroz, a partir do refogado, que reproduz no restaurante. “O arroz de Minas é uma das coisas mais simples e gostosas que conheço. O sabor da fritura faz muita diferença e ele fica mais soltinho.” Na Paraíba, eles usam água fria para começar a cocção e temperam com cebola e louro.
A parceria com Gustavo Greco reforça o tempero mineiro na comida do paraibano. O designer gosta de cozinhar e tem uma queda pelos doces, tanto que as sobremesas ficam por sua conta. A amada torta de limão-capeta é uma invenção dele, assim como o chocolate branco quente, igualmente inesquecível.
As novidades deste ano são o pudim e o bolo chocolatudo, com chocolates brasileiros, que tem massa molhadinha, base de castanha de caju e calda de chocolate.
As novidades deste ano são o pudim e o bolo chocolatudo, com chocolates brasileiros, que tem massa molhadinha, base de castanha de caju e calda de chocolate.
Enquanto se aproxima dos belo-horizontinos, o chef se prepara para lançar, em 5 de agosto, a nova temporada do Priceless, em São Paulo, “Matas e mares”. O menu foi criado a partir de uma expedição pela Mata Atlântica, de Santa Catarina à Bahia, que reúne a maior biodiversidade do planeta. Pelo menos uma vez por mês, ele vai a João Pessoa acompanhar os trabalhos no bufê Casa Roccia, que está sob o comando da sua filha, Ana Luiza, de 20 anos.
Tortilha de macaxeira com porco picante
Ingredientes
350g de farinha de mandioca fina; 300ml de água morna; quanto baste de sal; 1kg de barriga de porco desfiada; 300g de cebola roxa em julienne; 500ml de caldo de carne; 600g de tomate pelati; 25g de pimenta sriracha; coentro a gosto
Modo de fazer
Esquente uma panela pequena de água. Em um bowl grande, coloque toda a farinha de
mandioca. Vá despejando a água morna e mexendo até dar liga. Dependendo da farinha, pode levar mais ou menos água. Você tem que sentir na mão se a massa está homogênea. Deixe a massa descansar por uma hora enrolada em plástico para depois abrir com o rolo ou cilindro. Refogue a barriga de porco até dourar. Adicione a cebola roxa até murchar. Adicione o tomate e o caldo de carne. No fim, adicione a pimenta e o coentro. Desfie a carne e envolva no molho. Coloque a carne no centro da tortilha. Acrescente cebolas em julienne por cima e finalize com folhas de coentro. Sirva com uma fatia de limão para regar a carne na hora de comer.
Serviço
O chef e o cabra (@ochefeocabra)
Até 3 de setembro
Rua São Domingos do Prata, 631, Santo Antônio
(31) 3286-4587