Ofélia é uma mulher mística. Aprendeu sobre tarô e joga cartas nas horas livres. Acredita no amor e gosta de se divertir na noite belo-horizontina. Não revela a idade para ninguém e nunca mostra seu rosto. Essa personagem misteriosa dá nome ao bar que oferece uma experiência imersiva única e divertida inspirada no universo do tarô. O programa fica ainda mais interessante com o novo cardápio assinado pelo chef Kiki Ferreira, que mistura referências de comida de rua pelo mundo com sabores inusitados.
A história do Ofélia envolve acontecimentos místicos (para quem não acredita em coincidências). No fim de 2019, quando recebeu o convite para montar um bar, Bruce consultou sua astróloga. Ouviu dela que surgiria “uma oportunidade incrível”, que “sua mente criativa teria sucesso”, mas “ainda não era a hora”. O administrador era infeliz como diretor de loja de parafusos e sonhava em migrar para a área de entretenimento.
Poucos meses depois, veio a pandemia e ele entendeu o recado. Enquanto esperava a reabertura do comércio, a equipe criativa ficou trabalhando em cima da ideia do bar e chegou a quatro opções de nomes. Uma delas era Ofélia (a da história de Hamlet). Mas Bruce não estava convencido, porque não queria retratar uma mulher que tinha enlouquecido e se matado por causa de um homem.
Em agosto de 2020, os números da pandemia arrefeceram e eles começaram a procurar um lugar para abrir o bar. Acharam o casarão da Rua Rio Grande do Norte, onde tinha funcionado o Floresça Café. “Quando fomos assinar o contrato de aluguel do imóvel, descobrimos que a dona da casa se chamava Ofélia. Ali entendi que esse tinha que ser o nome do bar, mas, como não gostava da história de Hamlet, a nossa Ofélia seria diferente”, comenta.
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Cada cômodo do casarão conta uma parte da história de Ofélia. No salão principal, todo pintado de azul-escuro, reluz no teto um enorme lustre de pérolas. A “dona da casa” ganhou um colar de pérolas de um espanhol com quem teve um romance e acredita que ele lhe traz sorte. Na parede de um dos quartos, estão dependurados cabides da época em que ela teve um bazar. “Ofélia acha que o mundo está invertido com o desamor e a falta de gentileza”, diz Bruce, ao apontar para a cama de cabeça para baixo no teto de outro quarto.
Cada figura, um drinque
O baralho de tarô fica em cima das mesas para divertir os clientes. Quem quiser pode brincar de jogar cartas para escolher qual drinque beber. Os primeiros a entrar no cardápio (e que não podem mais sair) são criação da mixologista Jocássia Coelho, que se inspirou nas figuras do jogo (os desenhos foram reinterpretados por Thereza Nardelli).
No Ofélia, a carta “A imperatriz”, que indica “prosperidade, boas novas, beleza e harmonia” se transforma em uma bebida com cachaça, vermute bianco, espumante, limão siciliano, cereja amarena e pó de hibisco. Já “A morte”, que carrega o significado de “recomeço e transformação”, tem a cor preta pela presença do xarope de carvão vegetal, mas surpreende pelo sabor doce do xarope de morango, misturado a uma dose de vodca com limão.
A criatividade não se limita às cartas. Hoje em dia, já são quase 60 drinques (os que não estão diretamente relacionados ao tarô entram na seção “além das cartas”).
A mixologista Jéssica Garcêz, atual chef do bar, assina criações como o “Corte Devassa”, com gim, suco de tangerina, limão, xarope de flor de sabugueiro, água tônica e espuma de tangerina e o “Frisson d'Amour”, com tequila, frutas vermelhas, espumante e toque levemente picante de pimenta tabasco. Clássicos como caipirinha, moscow mule e negroni também estão no cardápio.
Sobre a comida, como Ofélia é uma mulher viajada e livre, eles pensaram em um cardápio cosmopolita e sem fronteiras, que reunisse referências de várias partes do mundo. “Queríamos um cardápio diferente, que trouxesse algo mais disruptivo. Que saísse do lugar de comida afetiva, mas que trouxesse lembranças da infância com uma explosão de sabores”, destaca Bruce.
Misturas improváveis
Entrou em cena Kiki Ferrari, que mergulhou nessa missão para criar algo realmente novo. É dele a ideia de trabalhar com sabores pop, relacionados a refrigerantes, balas e outros doces, que não costumam aparecer em pratos de restaurante. “Pegamos insumos que não são nada convencionais, que muitas pessoas achariam um absurdo e transformamos em algo bem moderno e disruptivo. A ideia é romper barreiras mesmo, de lugar, porque tem comida de rua do mundo inteiro, e de dogmas da gastronomia, do que se considera chique”, detalha o chef, que atua no Ofélia como consultor.
Olha que curiosos o zaatar de paçoquinha e o azeite de bala de maçã verde que temperam os bolinhos de feijão fritos no “Falafel de João”, com clara inspiração árabe. Completam o prato coalhada seca defumada, pimenta-de-cheiro tostada e cebola roxa.
O chef também ousa ao fazer uma versão do tempero indiano masala com suco de pozinho sabor tangerina, que aparece nas trouxinhas de frango do “Rei Momo”, com mel de missô, requeijão de copo, gengibre e cebolete. O prato tem um acento oriental, mas, ao mesmo tempo, remete ao nosso frango com catupiri. Uma das mais divertidas invencionices é salpicar a bala que explode na boca, na cor azul, por cima da pururuca de mandiopan com fatias de salmão curado, ceviche de banana, maionese de moqueca e camarão seco, do “Salmão e axé”.
Outra mistura improvável está no “BBQ do amor”. O prato combina bacon braseado ao molho barbecue de pimenta biquinho e cachaça, picles de maçã do amor, rolinhos de canela e farofa de biscoito de polvilho. Para fechar a experiência, a sugestão é pedir de sobremesa o pudim de flocos de milho com calda de bala de gelatina sabor banana com spiced rum, espuma de gengibre e canela.
Serviço
Ofélia (@ofelia.bh)
Rua Rio Grande do Norte, 311, Santa Efigênia
(31) 98373-4990