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Estado de Minas VACINAÇÃO

COVID-19: moradores do Quilombo do Açude recebem segunda dose da vacina

Comunidade em Jaboticatubas, reconhecida pela tradição do candombe, estava apreensiva com o avanço da doença e teve de se mobilizar para garantir imunização


01/07/2021 14:10 - atualizado 02/07/2021 18:19

Comunidade do Açude se reuniu cedo para receber a segunda dose do imunizante
Comunidade do Açude se reuniu cedo para receber a segunda dose do imunizante (foto: Leandro Couri/EM/D.A Press)

Quem chega à comunidade do Açude , em Jaboticatubas, na Região Metropolitana de Belo Horizonte, sente a energia do lugar onde se celebra uma das mais bonitas festas de Minas Gerais, o candombe. No entanto, desde março de 2020, o lugar que acolhe quem chega, com café coado e boa prosa, estava em apreensão com o avanço do novo coronavírus.

A energia se mantinha entre eles, mas tiveram que parar de receber visitantes, momento em que compartilhavam a tradição. Julho trouxe esperança de que dias melhores venham e o terreiro de Dona Mercês possa receber centenas de pessoas que se aglomeravam para acompanhar as três festas da comunidade em maio, agosto e setembro. Na manhã desta quinta-feira (1/7), parte da comunidade recebeu a segunda dose da vacina contra a COVID-19

Ver galeria . 9 Fotos Moradores do Quilombo do Açude tomam a segunda dose da vacina contra a COVID-19Leandro Couri/EM/D.A Press
Moradores do Quilombo do Açude tomam a segunda dose da vacina contra a COVID-19 (foto: Leandro Couri/EM/D.A Press )


Com as determinações de isolamento social, muita gente não se encontrava para fazer festa há muito tempo, então, a vacinação se tornou momento de celebração. Por volta das 7h, todos aguardavam na fila para receber a segunda dose. Em 29 de março, entregaram documento com nomes de 131 moradores para que pudessem receber a primeira dose.

Maria do Bom Conselho Viana, de 60 anos, foi a primeira a completar a vacinação e se emocionou
Maria do Bom Conselho Viana, de 60 anos, foi a primeira a completar a vacinação e se emocionou (foto: Leandro Couri/EM/D.A Press)


Três meses depois - tempo necessário no caso da AstraZeneca, imunizante aplicado - cada um que recebia a vacina saia com os olhos marejados e era recebido com palmas e muita comemoração pelo ato que não é apenas de proteção individual, mas de proteção de uma comunidade, que guarda as tradições e conhecimentos da população negra em Minas. 

Cobertura ainda pequena

O momento foi de muita alegria, mas não foi completo, porque menos da metade da comunidade recebeu as duas doses. Da linhagem de Dona Mercês, a comunidade tem 250 pessoas, mas apenas 94 entraram na listagem do município de Jaboticatubas.

Esse número demonstra a situação de cobertura insuficiente em todo o estado. De acordo com a Secretaria de Estado da Saúde, o público “povos e comunidades tradicionais quilombolas”, o número de pessoas acima de 18 anos a ser vacina é 130.812. Até o momento, foram aplicadas 67.075 primeiras doses (51,28%) e 12.428 segundas doses (9,50%).

"Espero que todo mundo tome a vacina e essa doença suma. Dias melhores virão"

Maria do Bom Conselho Viana, 60 anos



Dona Mercês, que já havia se vacinado com as duas doses devido à idade - ela está com 82 anos - comemorou e abençoava cada filho e neto que chegava do posto de saúde segurando o braço.

Maria do Bom Conselho Viana, de 60 anos, foi a primeira a completar o esquema de vacinação e não acreditou que estava sendo vacinada. “Espero que todo mundo tome a vacina e essa doença suma. Dias melhores virão”, afirma. Nesse um ano e meio de pandemia, ela ficou em casa, apesar de morar em uma região afastada. “Moro no mato, mas não saí de casa. Evitando os contatos com muitas pessoas. Tem um tio meu que a há um ano eu não vejo.Ele mora aqui na região, mas estava evitando ir lá, ele teve derrame. Tomei vacina e agora posso ir lá ver ele”, diz.

Mobilização pela vacina

Flávio José dos Santos, presidente da Associação Quilombola do Açude, conta que, embora os quilombolas sejam do grupo prioritário determinado pelo Plano Nacional de Vacinação contra a COVID-19, foi necessário muita mobilização para que os moradores do Quilombo do Açude conseguisse se vacinar. Ainda assim, menos da metade da comunidade foi vacinada.”Não foi fácil não. A prefeitura não passou informações. Tivemos que correr atrás”, afirma.

Shirlene Sabino dos Santos agradeceu o trabalho dos cientistas que desenvolveram a vacina
Shirlene Sabino dos Santos agradeceu o trabalho dos cientistas que desenvolveram a vacina (foto: Leandro Couri/EM/D.A Press)


Para conseguir, eles tiveram apoio da Coordenação Nacional de Articulação de Quilombos (Conaq) e  do Ministério Público. “Pressionamos bastante para conseguir essa vacinação. Queria um número bem abaixo do que a comunidade. Não aceitamos, mas ainda está faltando muito ainda”, disse. O quilombo tem 250 pessoas, mas 94 receberam a primeira dose. “Falta um número grande para ser vacinado”. A alegação é que estavam seguindo o Censo do IBGE de 2010.  “Para receber a segunda dose, tivemos que pressionar demais o secretário de saúde do município.Faltam muito para vacinar”, diz.

Shirlene Sabino dos Santos, de 46, agradeceu o trabalho dos cientistas que desenvolveram a vacina. "'É uma gratidão enorme. Estou muito grata”, afirmou. “Pedi a Deus que iluminasse a cabeça dos cientistas para que tivesse um remédio para a cura, oração e fazer o que estava sendo pedido, sair da aglomeração. Acredito  na ciência. A fé e a ciência têm que caminhar juntas. Pede a Deus e Deus envia a luz onde é necessário para quem tiver mais preparado para trazer  a solução de cura através dos remédios”, diz. A filha Maria Helena, que tem mais de 18 anos, tomou a vacina, mas o filho Tomás, de 14 anos, não faz parte do público-alvo da vacinação.

"É emocionante demais"

“A segunda dose é a sensação ainda mais feliz da minha vida”, afirma Aldenina Maria Viana, de 50 anos. Ela agradece de ninguém da comunidade ter se contaminado. “Eu me isolei. De modo a chegar alguém na comunidade e eu dizer volta depois. Não quero receber ninguém não. Não fui em festa nenhuma", disse.

Pedro Eduardo da Silva Santos, de 22 anos, também se vacinou. “É emocionante demais. Mais de um ano de pandemia, tomar essa vacina agora, eu e minha família, não tem preço”, disse. Nesse tempo, a diversão era ir para o rio. “Sou quilombola. Ver minha família toda vacinando é a melhor coisa que tem.”



Em nota a Secretaria de Estado da Saúde (SES-MG), as estratégias para vacinação deste público foram divulgadas orientações específicas aos municípios buscando estratégias de vacinação a serem desenvolvidas nessas comunidades pelos municípios.

A SES-MG informa que todas as solicitações de imunizantes, para o atendimento da população quilombola e indígena aldeados, que foram sinalizadas pelos municípios foram atendidas. Já foram distribuídas 100% das doses solicitadas para atender estes públicos.
 

Tradição do candombe

Durante a pandemia, as três grandes festas realizadas na comunidade foram feitas de uma maneira diferente dos anos anteriores. O terreiro de Dona Mercês que recebe centena de pessoas nas celebrações recebeu apenas as pessoas da família. As festas de Nossa Senhora do Rosário, realizada em maio, a outra em agosto e o Candombe em setembro voltaram ao que era antes em anos em que o quilombo sofria mais preconceito. 

O quilombo reúne 250 pessoas, mas somente 94 receberam a primeira dose
O quilombo reúne 250 pessoas, mas somente 94 receberam a primeira dose (foto: Leandro Couri/EM/D.A Press)


“Todo mundo aqui é devoto de Nossa Senhora do Rosário. O candombe é em louvor a ela”, afirma. Eles seguiram as medidas de isolamento social, mas não deixaram de pedir a proteção da santa. 

Todo o tempo estiveram sob as orientações de Dona Mercês. “Mamãe é tudo  pra gente. Para nós ela é tudo para nós”, disse. A rotina mudou muito. “Na pandemia a gente só fica dentro de casa. A gente tomou a segunda dose é a maior alegria nossa” afirma Geralda Antônia dos Santos, uma das filhas de Dona Mercês.

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